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Governo Federal

- Publicada em 24 de Janeiro de 2019 às 01:00

Assessores poderão impor sigilo a dados do governo

Um decreto assinado pelo presidente interino, Hamilton Mourão (PRTB), altera regras de aplicação da Lei de Acesso à Informação (LAI) e permite que ocupantes de cargos comissionados da gestão possam classificar dados do governo federal como informações ultrassecretas, aquelas com grau máximo de sigilo, de 25 anos.
Um decreto assinado pelo presidente interino, Hamilton Mourão (PRTB), altera regras de aplicação da Lei de Acesso à Informação (LAI) e permite que ocupantes de cargos comissionados da gestão possam classificar dados do governo federal como informações ultrassecretas, aquelas com grau máximo de sigilo, de 25 anos.
O texto da gestão de Jair Bolsonaro (PSL), publicado na edição do Diário Oficial da União desta quinta-feira, amplia o número de autoridades que podem tornar essas informações protegidas por 25 anos. Pelo texto anterior, essa classificação só poderia ser feita por presidente, vice-presidente, ministros de Estado, comandantes das Forças Armadas e chefes de missões diplomáticas ou consulares permanentes no exterior.
Já o decreto que entrou em vigor nesta quinta-feira autoriza também os assessores comissionados do Grupo-DAS de nível 101.6 ou superior, entre os mais elevados do Executivo. Podem ocupar esse cargo servidores públicos ou não, e eles exercem funções de direção ou assessoramento superior, com remuneração mensal de
R$ 16.944,90.
Além desses, as autoridades podem delegar a dirigentes máximos de autarquias, de fundações, de empresas públicas e de sociedades de economia mista também a fazerem essa classificação dos documentos públicos da esfera federal.
O novo texto permite ainda que tais autoridades deleguem a competência para que comissionados façam a classificação de informações consideradas de grau secreto, cujo prazo de sigilo é de 15 anos. Para este caso, ocupantes de cargos comissionados de nível DAS 101.5, com remuneração de R$ 13.623,39, podem ser delegados a fazer a classificação, mas ficam proibidos a subdelegar a função a outras pessoas.
De acordo com a assessoria de imprensa da Presidência da República, o decreto já estava previsto nas ações que deveriam ser assinadas por Bolsonaro, que está em viagem a Davos (Suíça), para participar do Fórum Econômico Mundial.
Segundo assessores, o texto só foi assinado por Mourão por ele estar atualmente na interinidade, mas o ato poderia ter sido feito por qualquer outra autoridade que estivesse no exercício da presidência.
A LAI entrou em vigor em maio de 2012 com o objetivo de criar mecanismos que possibilitem que qualquer cidadão ou empresa recebam informações públicas de órgãos e entidades. A legislação tem como premissa o fato de que a pessoa física ou jurídica não precisa justificar os motivos pelos quais quer ter acesso à informação.
Seu teor vale para os três Poderes da União, Estados, Distrito Federal e Municípios, inclusive aos Tribunais de Contas e Ministério Público. As entidades privadas sem fins lucrativos também são obrigadas a dar publicidade a informações referentes ao recebimento e à destinação dos recursos públicos.
O decreto assinado por Mourão altera um decreto presidencial de 2012, assinado no governo da então presidente Dilma Rousseff (PT) e que regulamentou a LAI.
Na página que trata do acesso à informação do governo federal, a legislação é descrita com seis princípios básicos, sendo o primeiro deles o fato de que o "acesso é a regra, o sigilo, a exceção". Nessa lista, as hipóteses de sigilo são apontadas como "limitadas e legalmente estabelecidas".
 

Motivos para o sigilo

Risco à vida, à segurança ou à saúde da população
Risco a projetos de pesquisa e desenvolvimento científico ou tecnológico, assim como a sistemas, bens, instalações ou áreas de interesse estratégico
Risco à segurança de instituições ou de altas autoridades nacionais ou estrangeiras e seus familiares
Exemplos ultrassecretos (governo federal)
Relatórios das Forças Armadas
Comunicados produzidos pelas embaixadas no exterior
Análises do Itamaraty
Dados sobre a comercialização de material bélico

Para entidades, mudança na LAI é 'deplorável' e um retrocesso

Representantes de entidades que militam pela transparência na administração pública criticaram nesta quinta-feira as mudanças feitas pelo governo de Jair Bolsonaro no decreto que regulamenta a Lei de Acesso à Informação (LAI).
Diretor-executivo da Transparência Brasil, entidade que monitora ações do poder público, o economista Manoel Galdino diz que as alterações podem representar um retrocesso na publicidade dos atos do governo. "Há hoje, no Brasil, um certo grau de subjetividade para definir algo que coloca risco à sociedade e ao Estado. (A mudança) sugere que a gente vai ter mais variação de critérios para classificar como ultrassecreto, o que pode representar um risco à transparência", comenta.
Galdino integra o Conselho de Transparência Pública e Combate à Corrupção da Controladoria-Geral da União (CGU). O colegiado, formado por membros da sociedade civil e do Executivo, é o responsável por discutir esse tipo de mudança. A própria minuta da Lei de Acesso, aprovada em 2011, foi rascunhada pelo grupo.
Segundo Galdino, o conselho não foi consultado pelo governo. "A gente teve uma reunião no dia 12 de dezembro, que foi, inclusive, a posse dos novos membros. O ministro (da CGU, Wagner Rosário) foi bem claro ao dizer que as eventuais alterações na LAI seriam discutidas junto aos membros do conselho, seriam apresentadas lá, e não houve isso. Foi uma mudança que nos pegou de surpresa. A gente não sabe por que o governo fez", declarou.
Para a Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji), o novo decreto é "esquisito" e "bastante prejudicial". A gerente-executiva da entidade, Marina Atoji, avalia que, ao limitar o número de autoridades capazes de classificar informações como ultrassecretas, a versão anterior do decreto assegurava, de alguma forma, de que o sigilo seria usado de forma mais pontual.
Quando se expande essa prerrogativa a um grupo muito maior de servidores, segundo ela, há a possibilidade de esse tipo de restrição ser aplicada com muito mais frequência.
Outra questão levantada pelas entidades é que ministros são figuras públicas e, nessa condição, estão sujeitos a maior constrangimento ao, eventualmente, classificar uma informação como ultrassecreta sem justificativa adequada. Isso não ocorreria com funcionários públicos de menor escalão.
O ex-presidente da Comissão de Ética da Presidência da República Mauro Menezes, que ocupou o cargo de 2016 a 2018, classificou a mudança como "deplorável". "O sistema de transparência pública sofre um golpe duro com essa ampliação indiscriminada dos agentes capazes de impor sigilo a dados públicos", criticou.
O PSOL afirmou que entrará no Supremo Tribunal Federal (STF) com uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (Adin) pedindo a nulidade do decreto. Além disso, o partido apresentará um projeto de Decreto Legislativo na Câmara para sustar o conteúdo do decreto. "O decreto presidencial, na prática, esvazia a LAI, violando princípios básicos da Constituição Federal", afirmam em nota.

Para Hamilton Mourão, alteração de normas não afeta transparência

Funcionários não vão 'colocar nada de ultrassecreto', afirma interino

Funcionários não vão 'colocar nada de ultrassecreto', afirma interino


/ROMERIO CUNHA/VPR/JC
O presidente interino, Hamilton Mourão (PRTB), defendeu nesta quinta-feira que a alteração nas regras de aplicação da Lei de Acesso à Informação (LAI) não afeta a transparência na divulgação de dados do governo.
Para ele, que assinou na quarta-feira decreto com as alterações, há raros documentos que são classificados como ultrassecretos no país, dando como exemplo planos militares e acordos internacionais. "A transparência está mantida e as coisas aqui no Brasil são raríssimas as que são ultrassecretas. Normalmente, são planos militares, alguns documentos e acordos do Palácio do Itamaraty, são pouca coisa", disse.
Na opinião dele, a medida não atenta contra a liberdade de informação e tem como objetivo diminuir a burocracia na hora de desclassificar documentos sigilosos. "Não atenta. São servidores escolhidos, já foi muito mais gente que podia classificar documento. Hoje, é muito reduzido, o que até dificulta, porque você tem de ter um balanceamento entre segurança e transparência", disse.
O presidente em exercício disse que apenas ministros poderão classificar as informações como ultrassecretas. "O ultrassecreto não é o funcionário de nível mais baixo, só o ministro é que pode dar essa classificação", disse. Ele foi, contudo, lembrado que a iniciativa, contudo, abre justamente a possibilidade de funcionários comissionados do Grupo-DAS de nível 101.6 o qualificarem dessa forma. "O funcionário de nível mais baixo não vai colocar nada de ultrassecreto", respondeu.
Segundo ele, as mudanças nas regras já eram discutidas desde o governo do ex-presidente Michel Temer (MDB), mas acabaram não sendo implementadas.
"Esse já vinha do governo anterior. O presidente (Michel) Temer é que não assinou. O presidente (Jair) Bolsonaro deu luz verde e vai melhorar o acesso e ter menos burocracia para acessar documentos", disse.
A medida permite que ocupantes de cargos comissionados possam classificar dados do governo como informações ultrassecretas, grau máximo de sigilo.