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Entrevista especial

- Publicada em 04 de Novembro de 2018 às 20:54

Leite fará articulação política do governo, projeta Bonatto

'Grandes partidos mostraram que estão fraquejando', diz coordenador da campanha de Leite

'Grandes partidos mostraram que estão fraquejando', diz coordenador da campanha de Leite


Fotos: LUIZA PRADO/JC
A gestão do tucano Eduardo Leite à frente do Palácio Piratini deve melhorar a capacidade de articulação política do governo, em comparação à correligionária Yeda Crusius (2007-2010), avalia Valdir Bonatto, presidente em exercício do PSDB no Rio Grande do Sul e coordenador político da campanha de Leite ao governo do Estado. Ele entende que a ex-governadora exerceu uma "gestão eficiente da receita e da despesa", mas não conseguiu transmitir à sociedade "o quanto era importante o ajuste fiscal para a vida longa do Estado".
A gestão do tucano Eduardo Leite à frente do Palácio Piratini deve melhorar a capacidade de articulação política do governo, em comparação à correligionária Yeda Crusius (2007-2010), avalia Valdir Bonatto, presidente em exercício do PSDB no Rio Grande do Sul e coordenador político da campanha de Leite ao governo do Estado. Ele entende que a ex-governadora exerceu uma "gestão eficiente da receita e da despesa", mas não conseguiu transmitir à sociedade "o quanto era importante o ajuste fiscal para a vida longa do Estado".
Assim, projeta que o próprio Leite será articulador no futuro governo, em especial no relacionamento com a Assembleia Legislativa, parceria que o Executivo precisa para a aprovação das medidas prometidas na campanha, como a prorrogação da majoração das alíquotas do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) por mais dois anos, por exemplo.
Nesta entrevista ao Jornal do Comércio, Bonatto também projeta que a renegociação da dívida que o Estado tem com a União será facilitada com o futuro presidente da República, Jair Bolsonaro (PSL). Para o tucano, o discurso do presidente eleito sinaliza a intenção de proporcionar maior autonomia a estados e municípios, condição para a qual é necessária a garantia da viabilidade financeira dos entes.
Jornal do Comércio - Qual a avaliação da campanha e o que contribuiu para o resultado vitorioso nas urnas?
Vladir Bonatto - Foi uma campanha muito difícil, em que a forma de se relacionar e de dialogar com o eleitor foi diferente das campanhas anteriores. Foi preciso fazer leituras permanentes sobre a ação, o comportamento, a reação do eleitor e entendê-lo para que o Eduardo pudesse dialogar e ter o resultado que se teve. Então a campanha, além das práticas históricas, tinha um elemento novo e isso é tão verdade que o resultado no Rio Grande do Sul surpreendeu. E também a nível nacional se quebrou paradigmas desse processo. É necessário entendermos esse momento.
JC - Nesta eleição se percebeu, dentro do próprio PSDB e em partidos grandes, que houve uma expressiva diminuição das bancadas, em nível nacional, no Legislativo. Por outro lado, no Rio Grande do Sul o PSDB ganha força nos executivos, com grandes prefeituras como a de Porto Alegre, Pelotas, Santa Maria, Novo Hamburgo, Viamão, além de agora com o governo do Estado. Como vocês avaliam esse momento?
Bonatto - São duas coisas que precisamos avaliar. Primeiro, os eleitores estão escolhendo muito mais pessoas que representam um sonho, as mudanças, as necessidades, a perspectiva de que possam dar respostas a essas demandas, independentemente do partido. As pesquisas mostravam que 90% dos eleitores não queriam saber nem de partido político, nem dos políticos que estavam aí, então buscavam algo novo nessa relação. E, é claro, dissociaram a questão partidária das pessoas que estão integradas e que representam o partido. Se olharmos para o Rio Grande do Sul e para as prefeituras, é muito mais da representação pessoal, da sua capacidade e da sua condição, que da estrutura partidária. Grandes partidos nessas eleições mostraram que estão fraquejando e não estão mais em conexão com a população. Há uma necessidade de reorganização dos partidos, especialmente uma releitura da histórica do PSDB. O nosso candidato à presidência (Geraldo Alckmin), com um latifúndio de tempo (de propaganda em rádio e televisão), não conseguiu se comunicar com o eleitor. No Estado tínhamos sete candidaturas e foram para o segundo turno dois candidatos, como foi em Porto Alegre, do mesmo campo eleitoral. O que levou à vitória do Eduardo Leite é o que ele se propôs a entregar à população de forma mais eficiente e rápida, com maior autonomia, com melhor receptividade e eficiência do que o governo que está aí.
JC - Como pretendem trabalhar para conseguir formar uma base com as bancadas de diferentes partidos na Assembleia?
Bonatto - Primeiro teremos reuniões para definir as ações e os grandes projetos do governo a partir do resultado que colhemos na eleição. A eleição não é apenas se eleger. O voto é uma uma delegação de poder que o eleitor dá para que o candidato possa se organizar e dar a resposta efetiva. A composição da Assembleia estará muito mais sobre projetos e pautas que devemos avaliar a médio e longo prazo. É isso que vai unir as diferentes siglas.
JC - Acredita que conseguirão formar uma base ampla nesse sentido?
Bonatto - Talvez estejamos em um momento, tanto a nível estadual quanto a nacional, de formatar a coalizão de um projeto de superação das dificuldades. Não só da pauta do ajuste fiscal, que é um problema que o governo Sartori trabalhou todo esse tempo, mas tem outras pautas que são fundamentais também para o desenvolvimento do Estado.
JC - O Eduardo Leite tem esse perfil de diálogo. Ele vai fazer a articulação mais direta com os deputados ou terá alguém para intermediar esse diálogo?
Bonatto - Quem vai liderar os grandes projetos do governo e as grandes ações de movimentação e de articulação política é o comandante desse processo, que é o Eduardo. Ele tem perfil, tem capacidade, é inteligente, tem responsabilidade. Não vejo como um governo de coalizão, que tem que buscar não para o governo, mas o desenvolvimento do Estado, quem tem que liderar isso é o próprio Eduardo, o próprio governador.
JC - Crê que há ambiente na Assembleia para isso?
Bonatto - Acredito que sim. A eleição terminou no último domingo e as urnas mandaram muito o recado. Todos os que foram eleitos trazem uma bagagem de informações que conseguiram colher junto ao eleitor, que eles percebem que não é a unidade específica ou a representação de cada um, mas que isso faz parte de um coletivo e a unidade é que vai dar sustentação a um projeto e que vai resolver a vida das pessoas individualmente, mas de forma coletiva.
JC - Pode se dizer que o PSDB quebra paradigmas no Rio Grande do Sul. Teve Yeda Crusius como a primeira governadora mulher, eleita em 2006. Durante a campanha de Eduardo Leite, falou-se muito que sua juventude poderia ser confundida com inexperiência.
Bonatto - Quanto mais avançamos e crescemos, mais experiência acumulamos. E quando temos que tomar decisões, sempre buscamos no fundo das nossas experiências que deram certo. O governo da Yeda, uma mulher, trazia uma proposta muito arrojada no que diz respeito ao ajuste fiscal e teve capacidade de fazer o déficit zero. Se esse trabalho tivesse continuado, o Estado não estaria como está. Mas não foi. A forma de comunicação não permitiu ao povo gaúcho fazer a leitura de que esse era o caminho a continuar para manter as contas equilibradas. Agora, antes de começar o processo eleitoral, discutimos o Estado e estabelecemos os rumos para o futuro. Foi em cima dessa construção que começou a campanha e a discussão com a sociedade. Por isso, entendo que vamos encontrar respaldo e entendimento pela capacidade que o Eduardo tem, na Assembleia Legislativa, com as forças sociais, os movimentos, as corporações, de perceber que precisamos estar juntos para vencer os problemas do Estado.
JC - O que acreditam que pode ser aproveitado daquela experiência, do PSDB governar com a Yeda e o que identificam que não foi adequado e não se deve repetir nesse momento?
Bonatto - Dá para separar em dois movimentos. Primeiro no que se tem para aproveitar da gestão eficiente da receita e da despesa, que o governo Sartori vem buscando também e vamos equilibrar. Esse é um aspecto positivo. Do ponto de vista político e das relações é que precisamos melhorar. Isso é o que o governo da Yeda não conseguiu transmitir para a sociedade, o quanto era importante o ajuste fiscal para a vida longa do Estado. Ou seja, fazer o dever de casa, como a Yeda fez, mas também poder fazer com que a sociedade civil e os meios de comunicação estejam informados e possam acompanhar esse processo, para que juntos possamos superar as dificuldades que se tem.
JC - Tem previsão de fazer reforma administrativa? Quando aconteceria e como seria?
Bonatto - Não tenho o que seria, mas tem previsão de isso acontecer. Tem secretarias que são muito próximas, com departamentos, fundações que têm uma proximidade de ação e que se confundem, muitas vezes, nas suas políticas públicas. É uma das questões que devem ser integradas. Outra é a governança. Há um entendimento, dentro de uma organização sistêmica, que dentro das regiões onde o governo tem estrutura administrativa, que essas estejam sob o mesmo teto. Não podemos, numa região, ter alguém com um posicionamento político diferenciado, mesmo que integre a base do governo, para fazer a gestão da coordenadoria da Educação, outro da Saúde, outro da Segurança, que seja a Brigada Militar ou a Polícia Civil, da Secretaria da Agricultura... É um dos pontos que deve ser discutido logo nos primeiros dias de governo, da sustentabilidade desse conceito. Esses órgãos do governo não se comunicam, não interagem, e, às vezes, fazem políticas antagônicas pelos seus interesses partidários. Essa unidade vai facilitar e entregar, de forma mais eficiente e efetiva, com o mesmo dinheiro, um melhor serviço para a população.
JC - Teria algum exemplo de mudança que poderia haver com essa reforma?
Bonatto - Não. São questões que percebemos, que há problemas de gestão nessas áreas, nas regiões, que o Eduardo tem muito claro que precisa realizar isso.
JC - Como imaginam que será a relação com o governo federal, especialmente em relação ao Regime de Recuperação Fiscal (RRF)? Temos, até então, o alinhamento de partidos no Rio Grande do Sul com a União desde 2016. Acredita que terão o mesmo acesso com Bolsonaro?
Bonatto - Do que tenho ouvido a partir do segundo turno, dos posicionamentos do Bolsonaro, ele sinaliza dois caminhos que, para mim, são importantes. Primeiro de que é "menos Brasília e mais Brasil" - uma das pautas municipalistas, do retorno (dos impostos) aos municípios, que é onde acontece a vida. A outra questão, ele diz com muita clareza que a articulação com o governo federal vai estar muito mais baseada na Segurança, na Educação, na geração de emprego e renda, na Saúde junto aos estados e aos municípios do que na dependência direta do governo federal. Há um indicativo de diminuir o tamanho da máquina, que é centralizadora, em que grande parte dos recursos ficam em Brasília sem uma política de desenvolvimento articulado e com muito mais decisão político-partidária. Tenho convicção de que a probabilidade de acertarmos a questão do ajuste fiscal e equilibrarmos o pagamento da dívida vai se dar efetivamente nesse (futuro) governo, porque no que está passando não conseguiram vencer isso, por mais relação que se tivesse, por mais dezenas de visitas feitas a Brasília para fazer essa articulação.
JC - De qualquer maneira, tanto no governo atual quanto no futuro há uma relação com o Rio Grande do Sul, a partir dos seus articuladores políticos: agora é o Eliseu Padilha (MDB), vinculado a Michel Temer (MDB); o próximo é Onyx Lorenzoni (DEM), vinculado a Bolsonaro...
Bonatto - E temos o senador Luiz Carlos Heinze (PP), que tem identidade com o novo presidente.
JC - Isso pode facilitar o diálogo mais direto?
Bonatto - Tenho convicção. O Heinze, quando na função de deputado (federal), viabilizou muitos investimentos e melhorias na relação socioeconômica do Rio Grande do Sul e dos diferentes municípios. E ele, de forma clara na sua propaganda (eleitoral), tratava dessa questão da dívida do Estado e, em conversa informal, isso já tem acontecido juntamente com o Eduardo. Vejo um cenário positivo. Precisa fazer leitura do que saiu das urnas para poder se posicionar. É um governo que veio para fazer o contraponto de tudo que está aí, e é isso que a população elegeu. Tínhamos dois caminhos, direita e esquerda, mais radical e menos radical, e a população escolheu esse, e é esse governo que vai ter que fazer a consolidação. E nada mais eficiente do que fazer esse alinhamento com os estados e com os municípios.
JC - Acredita que vai ter ambiente em Brasília para se fazer uma reforma tributária, por exemplo, que levaria à melhor redistribuição dos recursos?
Bonatto - Tenho convicção de que as representações políticas fizeram a leitura clara do que o eleitor pensa e espera dos seus representantes. Ou consegue fazer isso, ou as reações vão ser muito contundentes com relação à falta de responsabilidade ou compromisso dos representantes para com o projeto de desenvolvimento.
> Confira alguns trechos da entrevista de Bonattto

Perfil

Valdir Bonatto tem 58 anos e é natural do município catarinense de Xanxerê. É formado em Pedagogia, tem pós-graduação em Orientação Educacional e é especialista em Administração Escolar. É administrador da rede de escolas Centro Educacional Santa Isabel (Cesi) e da faculdade do mesmo grupo, a Facesi. Atuou na militância estudantil e participou da fundação do PT em Viamão, nos anos 1980. Em 1988, foi eleito vereador e, durante a sua gestão, foi secretário da Câmara de Vereadores e relator da Lei Orgânica do Município. Em 1992, deixou o partido e se filiou ao PSDB. Disputou a prefeitura de Viamão em 1996 para o cargo de prefeito e, em 2000, para o cargo de vice, não sendo eleito em nenhuma das ocasiões. Elegeu-se prefeito de Viamão em 2012 e cumpriu um mandato, não concorrendo à reeleição. É vice-presidente estadual do PSDB e atualmente exerce interinamente a presidência da sigla, no lugar de Eduardo Leite, que se licenciou da função para disputar o governo do Estado.