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Opinião

- Publicada em 09 de Julho de 2021 às 00:32

A ausência do sobrenome materno

Existem muitas formas de a sociedade fazer uma mulher ser apagada, de a sociedade a fazer desaparecer. Uma dessas formas, em relações heteroafetivas, é através do sobrenome, quando a criança é registrada apenas com o sobrenome do pai ou quando a mulher se casa e tem a supressão de seu sobrenome. Em um passado não tão distante era comum que o pai e a mãe dessem ao seu filho somente o sobrenome paterno. Uma tradição patriarcal que perpetuou por muitos anos e em muitas famílias. Uma dessas famílias foi a minha.
Existem muitas formas de a sociedade fazer uma mulher ser apagada, de a sociedade a fazer desaparecer. Uma dessas formas, em relações heteroafetivas, é através do sobrenome, quando a criança é registrada apenas com o sobrenome do pai ou quando a mulher se casa e tem a supressão de seu sobrenome. Em um passado não tão distante era comum que o pai e a mãe dessem ao seu filho somente o sobrenome paterno. Uma tradição patriarcal que perpetuou por muitos anos e em muitas famílias. Uma dessas famílias foi a minha.
Sendo o sobrenome o elemento identificador de origem e da família ao qual o indivíduo pertence, passei a questionar a ausência de meu sobrenome materno e a me perguntar se minha origem e de meus familiares seria identificada apenas pela linhagem paterna. Encontrei na fotografia uma excelente forma de falar sobre isso. Através de uma narrativa ficcional, que mistura relatos de meus familiares com meu inconsciente imagético, busquei ressignificar meu sobrenome materno.
Voltei ao passado em busca de meu lugar de origem. Regressei à memória que me contavam desde a infância do acidente de minha bisavó materna. Ela fraturou as cadeiras (termo dado para a cintura pélvica por algumas pessoas antigamente) e logo faleceu. A partir disso, dei existência à imaginação, estabelecendo a queda e fratura de minha bisavó materna como elementos responsáveis por um desalinhamento em minha descendência maternal, que culminou na perda do registro do nome de três gerações.
Busquei imageticamente o que eu ainda carrego dessas mulheres que vieram antes de mim e não vivem mais, e das que ainda se fazem presentes em minha vida. Por meio de imagens minhas, de minha irmã e de minha mãe, da apropriação de fotografias de minha avó e bisavó maternas e de uma videoperformance, criei o meu inventário afetivo dessas mulheres, como ritual simbólico de cura dessa ausência do sobrenome materno.
Essa narrativa integra a exposição Afeto Presente, que pode ser vista até 11 de julho na Fundação Ecarta, juntamente com obras de bordado e costura de temática semelhante da artista Mitti Mendonça.
Relembro meu sobrenome materno, nos dias de hoje, como forma de homenagem às minhas ancestrais, para reconhecer esse parentesco. A arte é um desses possíveis caminhos de retomada e reafirmação de minha identidade.
Fotógrafa e artista visual, Fundação Ecarta
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