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Opinião

- Publicada em 31 de Agosto de 2018 às 01:00

Ensinamentos e paixões do gaúcho Paixão Côrtes

Nosso querido e justamente venerado herói foi muito mais que folclorista

Nosso querido e justamente venerado herói foi muito mais que folclorista


ANA PAULA APRATO/ARQUIVO/JC
De 15 em 15 anos o Brasil esquece os últimos 15 anos, disse certa vez o jornalista Ivan Lessa, e a frase permanece atual. O pensamento vem à tona quando lembramos o multifacetado João Carlos D'Ávila Paixão Côrtes, recentemente falecido aos 91 anos.
De 15 em 15 anos o Brasil esquece os últimos 15 anos, disse certa vez o jornalista Ivan Lessa, e a frase permanece atual. O pensamento vem à tona quando lembramos o multifacetado João Carlos D'Ávila Paixão Côrtes, recentemente falecido aos 91 anos.
A lembrança de sua carreira também remexe em uma das nossas maiores ineficiências, o pouco caso que os sucessivos governos deram à pesquisa, seja ela pura e aplicada. Não existe um país grande que não tenha focado esta atividade. Lamentavelmente, engatinhamos e não por falta de pesquisadores. É dinheiro curto. Recentemente, o governo federal cortou bolsas de estudo de pós-graduações.
O ponto é que nosso querido e justamente venerado herói foi muito mais que folclorista. Foi um pesquisador nato dotado de uma das qualidades que movem as pás dos moinhos da história, a curiosidade e o prazer de fazer bem feito. Quando mergulhou na nossa história descobriu ouro puro, como o resgate do Terno de Reis e suas danças e cantorias. Gravador em punho e depois com uma filmadora rudimentar de 8mm, Paixão matava a cobra e mostrava o pau. Nada de ouvir dizer. Ia à fonte e ia à fonte com muita sede.
Mas não saiu barato. Em 1972, Paixão foi ator de comerciais de uma indústria de café solúvel concorrente direto do Nescafé, a Dínamo. Em uma das peças publicitárias, ele atuava solito na frente da câmera apregoando o produto e, antes teve a audácia de dizer "Chega de café de chaleira!", o que irritou o fundamentalismo guasca.
E em 1973, em uma entrevista ao que hoje chamamos de talk show, o programa A Grande Noite da então TV Difusora, comandado por Ernani Behs, o pesquisador provou com fartura de imagens de tapeçarias árabes e turcas expostas em museus de Paris, que a bombacha não era de origem gaúcha, que era turca, e que o café de chaleira na realidade era uma forma do café árabe.
O próprio Paixão contava de forma divertida que um grupo de radicais foi ao Palácio Piratini pedir ao governador Euclides Triches que o expulsassem do Rio Grande do Sul por ter cometido esses e outros sacrilégios. Parece hilário hoje, mas na época causou-lhe uma série de aborrecimentos e caras feias quase que em formato de rebenque punitivo.
Mas não foi só no folclore e no resgate dos usos e costumes que o falecido se destacou. Como engenheiro agrônomo e funcionário da Secretaria da Agricultura desde os 17 anos, o ilustre santanense foi responsável pela abertura de mercado da ovinocultura no Rio Grande do Sul. Foi ele quem trouxe da Europa e outros países novos métodos e tecnologias de tosquia, em especial a tosquia australiana, desossa e gastronomia, além de incentivar o consumo de carne ovina.
Quando o amável leitor estiver saboreando uma bela paleta de cordeiro, lembre-se que essa cultura gastronômica antes era circunscrita ao campo. Quer dizer, o homem ultrapassou, e muito, a imagem que o grosso da população tem dele, um cantador das coisas gaúchas e pioneiro no resgate dos usos e costumes da Província de São Pedro do Rio Grande do Sul, e demolidor de conceitos tão autênticos quanto uma cédula de 30 cruzeiros novos de então.
Então ele não foi um mero assistente, foi um ator, criou sua história solidamente amarrada no passado sem se esquecer das urgências do presente do seu tempo como mencionamos acima. Dá uma certa tristeza ver que só vemos a ponta do iceberg Paixão Côrtes, o folclorista e modelo para a Estátua do Laçador criação de Antônio Caringi. 
Aliás, o monumento não é mais a Estátua do Laçador, é a Estátua de Paixão Côrtes.
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