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Internacional

- Publicada em 07 de Dezembro de 2020 às 21:33

Berlim obriga donos a baixar aluguéis caros

Interferência nos valores não afeta imóveis construídos a partir de 2014

Interferência nos valores não afeta imóveis construídos a partir de 2014


/TOBIAS SCHWARZ/afp/jc
No final de novembro, Berlim deu mais um passo na política para baixar os aluguéis: depois de congelar os valores, em fevereiro, a prefeitura da capital alemã determinou que os donos reduzam o preço de contratos caros. A medida, válida desde 23 de novembro, determinou limites para a cobrança, definidos de acordo com localização, ano de construção e condição de cada imóvel. Os proprietários que cobram além desses limites foram obrigados a baixar o preço.
No final de novembro, Berlim deu mais um passo na política para baixar os aluguéis: depois de congelar os valores, em fevereiro, a prefeitura da capital alemã determinou que os donos reduzam o preço de contratos caros. A medida, válida desde 23 de novembro, determinou limites para a cobrança, definidos de acordo com localização, ano de construção e condição de cada imóvel. Os proprietários que cobram além desses limites foram obrigados a baixar o preço.
A decisão, no entanto, tem gerado problemas: de um lado, inquilinos estão inseguros sobre a aplicação da redução, pois o tema foi parar na Justiça. De outro, o número de imóveis no mercado caiu antes mesmo de a regra entrar em vigor, fruto do congelamento dos preços e das discussões sobre a medida mais recente.
Segundo dados da consultoria Gutmann, o total de locais ofertados para alugar caiu 77% na comparação entre outubro de 2020 com o mesmo mês de 2019. A consultoria fez o levantamento a partir de anúncios nos principais sites e jornais.
No mesmo período, o valor médio dos aluguéis para contratos novos subiu de 11,10 euros para 12 euros por m2 (alta de 8,1%), uma vez que o congelamento não afeta imóveis construídos a partir de 2014.
Além das mudanças de regras, o mercado foi afetado pela pandemia. Com as restrições de viagem, muitos estudantes e trabalhadores estrangeiros que se mudariam para Berlim neste ano tiveram de adiar ou cancelar os planos, o que tirou parte da pressão sobre os preços. Quando a situação normalizar, porém, uma grande crise de falta de imóveis para locação poderá emergir na cidade.
A chegada de estrangeiros foi justamente uma das principais razões para a alta de preços das moradias na capital alemã. Segundo a BMV (Associação dos Inquilinos de Berlim), o valor médio dos aluguéis subiu 30% de 2014 a 2019. Viver em um apartamento de 60 m2 custa cerca de 850 euros mensais (R$ 5.400,00). As estimavas apontam que 85% dos habitantes de Berlim vivam em imóveis alugados.
Para a consultoria F B, os proprietários poderão perder 250 milhões de euros por ano com a medida. Em média, serão 40 euros (R$ 253,00) a menos por mês por imóvel alugado. A redução dos valores, por outro lado, deve afetar cerca de 365 mil contratos de aluguel, segundo a BMV.
Os donos buscam driblar a regra. "Muitos estrangeiros aqui não falam alemão fluente e não estão a par da lei, então há locatários fingindo que nada aconteceu", diz Bruno Santiago, de 31 anos, estudante brasileiro que vive em Berlim.
Como o governo terá dificuldade para fiscalizar a aplicação do desconto em milhares de contratos, há a orientação para que moradores confiram em um site se têm direito ao abatimento. E, caso o dono recuse o desconto, eles devem entrar com ações judiciais para reaver o valor pago de forma indevida.
Entidades de proprietários também foram à Justiça para questionar a mudança, e o caso chegou à Corte Constitucional alemã, que decidirá se a prefeitura de Berlim tem direito de intervir dessa maneira no mercado. A ação, no entanto, só deverá ser julgada em 2021.
Assim, muitos inquilinos chegam ao período de Natal com um dinheiro inesperado, mas têm receio de gastá-lo, conta Santiago. "Muitos donos diminuíram o aluguel, mas pediram para as pessoas guardarem o dinheiro, porque a situação ainda pode mudar", comenta. "E, se mudar, terão de devolver o desconto." Há também anúncios de imóveis com dois valores: um do aluguel com a redução, e outro "cheio", que valerá caso o abatimento seja suspenso.
Com as limitações, há o risco de que menos empresas queiram erguer moradias novas, e a falta de casas se agrave. "Quando o governo intervém nos aluguéis, afeta também os mercados de venda de imóveis e da construção civil, que têm papel importante ao gerar empregos na recuperação pós-pandemia", avalia Agostinho Pascalicchio, professor de economia da Universidade Mackenzie, de São Paulo.
O prefeito de Berlim, Michael Muller, argumentou durante os debates para a aprovação da medida no Legislativo municipal, no fim de 2019, que "um apartamento não é um investimento como ações ou ouro". "A diferença é que as pessoas vivem em apartamentos. Eles são um bem social, que precisa ser regulado."
Muller, do partido SPD (social-democrata), está no cargo desde 2014. Suas medidas para reduzir os alugueis geram debate. Membros da oposição, que inclui a CDU, partido da chanceler Angela Merkel, acusaram o prefeito de prejudicar a cidade, pois as propostas afastam investidores.
Claudia Acosta, pesquisadora de direito urbanístico no Cepesp-FGV, lembra que intervenções estatais no mercado de moradia são feitas desde o Império Romano. Ela avalia que Berlim dá um passo mais radical, por forçar a redução em contratos vigentes.
"Com a medida, o governo tirou dos proprietários um valor real concreto, recebido mensalmente, e não uma expectativa de aumento futuro, um dinheiro que ainda não existe. Isso gera um debate mais intenso, sobre quanto o Estado pode intervir em relações que envolvem propriedades privadas", diz Claudia.
"Em uma situação como essa, quem já era inquilino se deu bem. Mas quem for buscar uma casa de agora em diante pode ter mais problemas." A pesquisadora aponta que, após uma intervenção como essa, a tendência é que os donos passem a preferir a venda dos imóveis em vez do aluguel, o que reduz a oferta.
Outra implicação da nova medida é que proprietários passem a investir menos em reforma e manutenção, deteriorando a condição de casas e apartamentos com o passar dos anos, caso as restrições sejam mantidas por muito tempo. O congelamento de preços em Berlim valerá até 2025.
"A Europa está numa discussão séria sobre crise habitacional. Vivemos isso na América Latina há décadas, e o fato de muita gente não ter condição de pagar por moradia acabou se tornando comum. Mas, para os europeus, isso é algo novo", compara Claudia.
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