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100 anos do fim da Primeira Guerra Mundial

- Publicada em 12 de Novembro de 2018 às 17:03

O mundo em chamas pela primeira vez

Sérvio Gavrilo Princip (2º da direita para a esquerda) é preso após o assassinato do arquiduque Francisco Ferdinando e sua esposa

Sérvio Gavrilo Princip (2º da direita para a esquerda) é preso após o assassinato do arquiduque Francisco Ferdinando e sua esposa


AFP/JC
As primeiras dé­cadas do século XX foram de grande efervescência em todo o mundo. Da Revolução Mexicana contra o regime do ditador Porfírio Díaz à Revolução Russa que derrubou o czarismo, a fotografia geopolítica mudava no ritmo das transformações econômicas que a modernidade trazia. Foi nesse ambiente de permanente eletricidade, que, em 1914, eclodiu na Europa a primeira guerra total que redefiniu não só os limites territoriais do Velho Continente, mas também traçou as linhas que iriam resultar em um novo modelo de relações internacionais, e instituiu os alicerces do conflito maior que teria início 25 anos depois.
As primeiras dé­cadas do século XX foram de grande efervescência em todo o mundo. Da Revolução Mexicana contra o regime do ditador Porfírio Díaz à Revolução Russa que derrubou o czarismo, a fotografia geopolítica mudava no ritmo das transformações econômicas que a modernidade trazia. Foi nesse ambiente de permanente eletricidade, que, em 1914, eclodiu na Europa a primeira guerra total que redefiniu não só os limites territoriais do Velho Continente, mas também traçou as linhas que iriam resultar em um novo modelo de relações internacionais, e instituiu os alicerces do conflito maior que teria início 25 anos depois.
Ao completar 100 anos de seu fim, no dia 11 de novembro, a Primeira Guerra Mundial volta aos holofotes como um marco nas transformações ocorridas no século passado. A historiografia aponta o assassinato do arquiduque Francisco Ferdinando, herdeiro do trono austríaco, como o estopim da guerra. O nobre foi morto em 28 de junho de 1914, alvejado pelo estudante bósnio Gavrilo Princip, militante da organização secreta sérvia Unidade ou Morte, conhecida como Mão Negra.
O ataque, porém, foi apenas a faísca a acender um rastilho que fez explodir o barril de pólvora que era a Europa pré-guerra. Antes disso, um cenário de relativa paz reinou no continente. Realizado entre setembro de 1814 e junho de 1815, o Congresso de Viena repesou as forças políticas após a era napoleônica.
Assim, o período anterior à guerra de 1914, após o fim da Guerra Franco-Prussiana (1870-1871), foi de tranquilidade no continente acostumado a ter sua terra manchada de sangue pelo fio da espada. Os conflitos se deslocaram para os continentes vizinhos, em uma disputa por áreas de influência e controle sobre riquezas.
Em meio a isso, uma potência emergente surgia, desfazendo o equilíbrio estabelecido pelo Concerto Europeu. A formação do estado alemão, em 1870, foi fundamental para as ocorrências que viriam a seguir. O professor do programa de Pós-graduação em História da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul Antonio de Ruggiero aponta que, em um primeiro momento, até meados de 1880, o chanceler Otto von Bismarck conseguiu manter um equilíbrio diplomático. Crescendo economicamente, passando por um processo de desenvolvimento industrial, a Alemanha - alheia ao colonialismo/imperialismo nas regiões da Ásia e a da África - se torna uma nova grande potência, quebrando os equilíbrios criados até então.
No final da década de 1880, no entanto, duas mudanças no comando alemão alteram o posicionamento político da nação. Em 1888, Guilherme II sobe ao trono como novo Kaiser e, dois anos depois, Leo von Caprivi assume como novo chanceler. "Caprivi tem uma política muito mais agressiva, com uma ideia de superpotência. Isso gera uma mudança estrutural do clima", diz De Ruggiero.

Da Paz Armada à guerra total

O imperialismo das potências europeias na África e na Ásia gerava, conforme o historiador e professor de Relações Internacionais da Universidade Federal do Rio Grande do Sul Paulo Visentini, uma "competição pacífica" entre as nações mais poderosas, fazendo com que as tensões se voltassem para fora do Velho Continente. A corrida econômica, aos poucos, se tornou uma corrida armamentista.
A Paz Armada, como ficou conhecido o período, foi, na prática, uma preparação para a guerra. Nesse contexto, outro ingrediente colocava mais pimenta nesse caldo de interesses. "Havia um nacionalismo ferrenho que provocou essa situação. Com a Paz Armada, acreditava-se que os países bem armados garantiriam a paz, pois, se você está bem armado, ninguém irá lhe atacar", destaca o professor do Programa de Pós-Graduação em História da Universidade de Passo Fundo Adelar Heinsfeld.
Visentini aponta dois fatos como representativos a respeito da decadência do imperialismo: a Guerra Russo-Japonesa (entre 1904 e 1905 pela disputa dos territórios da Coreia e da Manchúria) e a Primeira Crise do Marrocos (investida do Kaiser Guilherme II, da Alemanha, no Marrocos, buscando minar os interesses franceses e britânicos na região). "A expansão rumo ao mundo colonial atingira seus limites, pois a quase totalidade das regiões 'vazias', isto é, não pertencentes a nenhuma das potências, já havia sido conquistada. Quanto às demais, já se encontravam destinadas a alguma potência (...) ou haviam tido sua exploração coletiva decidida pelos grandes protagonistas das relações internacionais", pontua, no livro Primeira Guerra Mundial: relações internacionais do século 20 (Editora da Universidade, 94 páginas). Assim, a não existência de mais áreas a serem ocupadas e a intensificação das desigualdades pressionavam por uma nova divisão dos impérios coloniais.
O historiador britânico David Stevenson, autor do livro 1914-1918: a história da Primeira Guerra Mundial (Editora Novo Século, 752 páginas), aponta que a era pré-1914 foi de globalização apoiada na revolução das comunicações - ferrovia, telégrafo e navios a vapor - e no aumento da produtividade agroindustrial. Com a interdependência econômica, veio a intensificação das relações culturais e políticas. "O imperialismo projetou as rivalidades locais por todo o mundo", afirma. De 1800 a 1914, a proporção de territórios ocupados por europeus cresceu de 35% para 84,4%.
Para Stevenson, houve uma união da fricção entre os dois blocos regionais (as alianças austro-alemã, assinada em 1879, e franco-russa, alinhada entre 1891 e 1894) com as tensões em geral no continente. "Da interação entre eles, nasceu a guerra", diz. Visentini, por sua vez, aponta que o ano de 1904 marcou o início de uma fase na qual ocorreria uma série de crises e movimentos que conduziriam à guerra (ver box ao lado). Em um clima de tensão, disputas por zonas de influência e corrida armamentista, bastava um empurrão para que a Europa se lançasse às armas. Gavrilo Princip tratou de dar esse empurrão. 

Crises e movimentos pré-guerra

  • A criação da Entente Cordiale franco-britânica, em 1904
  • A Primeira Crise do Marrocos, em 1905
  • A derrota russa para o Japão, entre 1904 e 1905
  • A aproximação gradativa entre Grã-Bretanha, França e Rússia (Tríplice Entente)
  • A crise balcânica, em 1908 (anexação da província turca da Bósnia-Herzegovina pelo Império Austro-Húngaro)
  • A Segunda Crise do Marrocos, em 1911 (envio de tropas francesas ao país africano seguido por envio de um navio de guerra alemão ao porto de Agadir, o que quase resultou em conflito armado)
  • A Primeira Guerra Balcânica, entre 1912 e 1913 (formação da Liga Balcânica, uma coalizão antiturca entre Sérvia, Bulgária, Grécia e Montenegro, com o aval da Rússia, resultando na conquista de territórios do Império Otomano)
  • A Segunda Guerra Balcânica, em 1913 (Bulgária ataca a Grécia e a Sérvia, que recebem o apoio de Romênia, Montenegro e Turquia para derrotar o antigo aliado)