A partir desta sexta-feira (8) a Universidade Federal de Pelotas (UFPel) será administrada por dois reitores. Essa foi a solução encontrada pela atual gestão e pela chapa vencedora da eleição interna para repudiar a
decisão de Jair Bolsonaro de não nomear o primeiro colocado da lista tríplice, o professor Paulo Ferreira Júnior, como novo comandante da instituição. Dessa forma, ele e a professora Isabela Andrade, segunda colocada e nomeada na quarta-feira (6) pelo presidente, passam a dividir o gabinete da reitoria, desenvolvendo uma gestão compartilhada e colaborativa.
A decisão foi anunciada pelo atual reitor, Pedro Hallal, que se despede do comando da UFPel nesta quinta-feira (7). A medida, inédita no meio acadêmico, será mantida ao longo da gestão, que se estende até 2024. Na prática, Isabela será a reitora legal, assinando como tal e recebendo remuneração condizente, enquanto Ferreira estará ao seu lado na administração e tomada de decisões, como reitor eleito.
"Pela primeira vez na história da UFPel, teremos uma dupla de reitores. Ambos trabalharão, lado a lado, num modelo de gestão participativa, que servirá como um contra-ataque à decisão autoritária do presidente da República de não nomear o primeiro colocado da lista", enfatizou Hallal.
A gestão, que já havia manifestado a intenção de reverter judicialmente a decisão de Bolsonaro, integra ação coletiva, ao lado das demais universidades federais, que busca junto ao Supremo Tribunal Federal garantir a nomeação dos primeiros colocados das listas tríplices. No entanto, Hallal reconhece que será difícil ganhar a causa.
A estratégia de manter os dois reitores foi construída ao longo da madrugada e demandou muita articulação entre os membros do grupo que constitui o movimento Uma UFPel Diferente, vencedor do processo eleitoral interno e que integra a atual gestão.
Prevendo anteriormente a possibilidade da não nomeação do primeiro colocado no processo, a listra tríplice enviada ao Ministério da Educação já continha os nomes de membros da chapa vencedora, em uma espécie de pacto formado justamente para impedir a nomeação de alguém de fora do grupo político à frente da universidade. A decisão de compartilhar a gestão entre a dupla foi destacada nas falas dos participantes da coletiva como forma de "contra atacar os golpistas de Brasília e de Pelotas".
Primeiro colocado na eleição interna para reitor, Paulo Ferreira Júnior foi preterido na nomeação de Bolsonaro. Crédito: Reprodução/ JC
Ferreira, titular do Centro de Desenvolvimento Tecnológico da universidade, destacou que a solução encontrada reforça a continuidade da gestão, enquanto buscam validar seu nome como reitor de fato. "Vamos continuar lutando para minha nomeação. Até lá, faremos uma gestão compartilhada, nossa chapa nunca foi personalista e continuaremos sendo assim", afirmou o reitor, ressaltando que espera ser reconhecido como tal pela comunidade acadêmica.
Tanto ele como Hallal teceram elogios ao posicionamento de Isabela, que desde quarta foi envolvida em uma série de boatos e críticas, na alusão de que seria próxima de deputados bolsonaristas e, por isso, escolhida para o cargo. A decisão do presidente, segundo Hallal, foi uma intenção de retaliação pessoal a ele, por ter conduzido a pesquisa Epicovid no Brasil - referência no mapeamento do avanço do coronavírus em todo o País - e criticado a conduta do governo federal de enfrentamento à pandemia.
Também foi enfatizado durante a coletiva virtual que, em nenhum momento a professora Isabela, que até então atuava como diretora do Centro de Engenharias da universidade e já estava prestes a assumir a Pró-Reitoria de Planejamento e Desenvolvimento, admitiu assumir a reitoria no lugar do colega eleito.
Professora Isabela Andrade, segunda colocada na eleição, foi nomeada reitora pelo presidente da República na quarta-feira. Crédito: Reprodução/JC
Ao se manifestar, ela afirmou que a quarta-feira havia sido um dos piores dias de sua vida, por ver sua trajetória profissional criticada e sofrer acusações e comentários agressivos. "Foi um dia triste, pesado, e de provações. Não é fácil estar na vitrine e receber pedradas. Não desejo a ninguém o que estou passando por ter colocado meu nome à disposição para estar numa lista tríplice", disse.
Segundo ela, seus planos pessoais e profissionais eram outros, mas como membro do grupo vencedor da eleição decidiu assumir o cargo, ao lado de Ferreira, por entender que o programa de gestão é mais importante que um nome. "Não cairemos na estratégia de abrir mão de conduzir a Universidade pelos próximos quatro anos. E eu, em particular, me coloco em uma posição bastante comprometida. A partir de amanhã, eu e o Paulo estaremos, juntos na reitoria, numa soma de reitora nomeada e reitor eleito, respaldada por uma equipe e pela comunidade. Vamos assumir no interesse da comunidade e construir a universidade que a gente quer", concluiu, ressaltando que a equipe se comprometerá em realizar as 136 ações previstas no plano de gestão construído coletivamente durante a eleição.
As aulas na UFPel estão previstas para retornar em março, remotamente nas primeiras oito semanas letivas, enquanto será preparada a estrutura para passar a receber os alunos presencialmente, caso o cenário da pandemia permitia. A equipe administrativa que estará ao lado dos novos reitores permanece a mesma da atual gestão.