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Patrimônio

- Publicada em 28 de Outubro de 2019 às 11:04

Permissionários do Mercado Público podem disputar concessão

'O mercado é um prédio lindo, mas o mercadeiro é a alma', valoriza Adriana Kauer

'O mercado é um prédio lindo, mas o mercadeiro é a alma', valoriza Adriana Kauer


MARIANA CARLESSO/JC
O Mercado Público de Porto Alegre deve encarar em 2020 uma das suas maiores mudanças. O comando deve passar para um gestor privado. O modelo, que a prefeitura da Capital, não abre mão, gera temores, questionamentos e movimentação acelerada dos chamados mercadeiros, que são os atuais permissionários. É grande a chance que os comerciantes façam parte de um dos grupos para disputar o leilão para assumir o mercado por 25 anos.
O Mercado Público de Porto Alegre deve encarar em 2020 uma das suas maiores mudanças. O comando deve passar para um gestor privado. O modelo, que a prefeitura da Capital, não abre mão, gera temores, questionamentos e movimentação acelerada dos chamados mercadeiros, que são os atuais permissionários. É grande a chance que os comerciantes façam parte de um dos grupos para disputar o leilão para assumir o mercado por 25 anos.
Na semana passada, pelo menos três investidores fizeram propostas para os permissionários entrarem como sócios na Sociedade de Propósito Específico (SPE) a ser criada para se habilitar à concessão de uso, revela a presidente da Associação do Comércio do Mercado Público Central (ASCOMEPC), Adriana Kauer. Um deles já enviou proposta que começa a ser examinada. Adriana aposta que é possível estar em um dos grupos, mas destaca que o mais decisivo é que os comerciantes sejam parceiros, independentemente de quem vença. Em novembro, deve ser publicado o edital com as regras finais, quando se saberá quantas das 84 sugestões feitas em consulta pública serão acatadas. Audiência teve questionamentos e críticas.    
 
Nesta entrevista, a presidente, que vive o dia a dia do mercado desde os 12 anos na loja de itens para confeitaria, alerta para detalhes que geram incerteza sobre o perfil de lojas e serviços, permanência dos atuais ocupantes e ainda a previsão de que o gestor poderá obrigar a abertura 24 horas. Adriana ressalta ainda que os comerciantes não são contra opções que busquem a melhoria do local, como a concessão, mas adverte que o modelo tem de respeitar a tradição que consagrou  o complexo nos seus 150 anos de história, e frisa: "O mercado é um prédio lindo, mas o mercadeiro é a alma".             
JC – O que é o Mercado Público de Porto Alegre?
Adriana Kauer – O Mercado Público é um grande centro de abastecimento. Essa é a melhor terminologia para definir o local. Mas eu gosto muito do público no nome, é muito significativo, pois insere muita coisa. O mercado é um centro de abastecimento extremamente plural porque atende diversos públicos, religiões, classes sociais e idades. O mix que o mercado tem é uma coisa única, a gente não vê isso em outros mercados em outras cidades. O nosso tem a cara do mercado de Porto Alegre.
JC – Qual é a posição dos atuais permissionários sobre a concessão?
Adriana – Não somos contra nada que venha a somar para o mercado. Todo mundo quer o melhor, mas o caminho para chegar lá tem de ser na base de muita parceria, diálogo e construção. Com isso queremos dizer que algumas coisas precisam ser respeitadas. Entre elas, a tradição do Mercado Público. Ou seja, respeitar as pessoas que estão ali dentro, não só para permanecerem, mas reconhecendo que elas colocaram muito dinheiro ali dentro. Muitos se desfizeram de bens para ajudar a custear reformas em determinadas épocas. Com isso, elas ajudaram o mercado a estar aberto até hoje. Por isso, sempre friso: o dinheiro que vai para o mercado não é público, não vem o bolso do contribuinte. O dinheiro que sustenta o local vem das taxas de permissão pagas pelos 106 comerciantes, somando R$ 330 mil por mês. Muitos acham que estamos usando dinheiro da prefeitura. Não existe isso. Todo mundo paga para estar ali, e estes recurso é que mantêm o mercado funcionando. Além disso, temos plena convicção que, se o segundo andar estivesse aberto, a arrecadação seria muito maior, gerando mais receita para fazer mais coisas.
JC – Por que a reabertura do segundo andar e a restauração da fachada não foram feitas até agora? Teria como custear de outra forma que não pela concessão?
Adriana – Primeiro, tem condições sim de fazer. Existem R$ 10 milhões disponíveis do PAC Cidades Históricas do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) que foram destinados ao mercado, após o incêndio de 2013. Sempre que representantes do Iphan encontram a gente dizem: a rubrica está ativa e só falta atualizar orçamentos. Com o dinheiro, poderíamos fazer as obras necessárias para reabrir o segundo andar.
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JC – Quando surgiu a proposta da concessão, a associação cobrou o uso da verba?
Adriana – Sim, sim, mas a resposta foi que não se usaria esse dinheiro para arrumar o mercado, que os recursos devem vir da concessão.
JC – O que mais preocupa no modelo de concessão?
Adriana – Algumas coisas nos assustam. A primeira delas é quem vai dizer que quer ou não a permanência das atuais lojas no mercado. Estão dando a um gestor carta branca de julgamento sobre quem fica e quem sai, pois ele terá plenos poderes. Por mais que se diga que vai permanecer o mix, como garantir que no lugar de um restaurante que está lá não vai se colocar outro no lugar? Dizer que vai ser mantido o mix, como a prefeitura fala, não me diz muita coisa. Como vai ser feito isso? Nada me diz que um restaurante atendido pelos donos não vai ser trocado por uma franquia, o que iria descaracterizar o Mercado Público. Não existe nada sobre isso no edital. Solicitamos na consulta pública a proibição para ter franquias. Um segundo receio é que se instale uma grande rede dentro do mercado. O edital prevê que o gestor que vencer pode aumentar e diminuir as bancas de acordo com sua vontade. Ou seja, ele pode achar que uma banca é grande e reduzir, como pode juntar várias para uma única operação. O grande questionamento é se não vai dar tudo para uma grande rede. O mercado é hoje um dos maiores empregadores por metro quadrado do Rio Grande do Sul. São 30 pessoas a cada cem metros quadrados. Isso é muito relevante e é assim porque lá não tem autosserviço, sempre vai ter alguém para atender em qualquer loja. No edital, não tem nada que barre, por exemplo, ter um supermercado. Na audiência pública da semana passada, foi sugerida a proibição de uso de carrinho de supermercado pelas operações.
JC – Como será a cobrança de aluguel?
Adriana – Este é o nosso terceiro temor. Temos medo que a elevação dos aluguéis possa inviabilizar o negócio de alguém que já está no local. Hoje somos permissionários, passaremos a ser locatários. O valor que pagamos hoje sofre correção anual pela inflação. Outra coisa que normalmente acontece em shopping center é aumentar despesas via condomínio. No Mercado Público, são pequenos negócios, muitos não suportam mais custos. Um dos itens propostos pela associação é proibir também a inserção de verba de marketing e promoções, como para sorteios, dentro do condomínio. Pode até manter o aluguel num patamar, mas se inchar o condomínio vai inviabilizar os comerciantes. Sugerimos que tenha um teto na cobrança.
JC – Há algum limite para o valor a ser cobrado das operações?
Adriana – Desde o primeiro momento que se apresentou a ideia da concessão, estamos pedindo para a prefeitura que estabeleça um teto de valores. O edital cita que os atuais permissionários terão ‘preferência’, só que isso não adianta se alguém vier e oferecer dez vezes mais que o ocupante está pagando. Pela preferência, o comerciante terá de dizer se consegue cobrir a oferta. Não temos perna para isso.
JC - Famílias que se sucedem há gerações nas lojas terão alguma garantia sobre a permanência?
Adriana - Existe somente a preferência, mas ela não é explicada. Isso vai estar atrelado ao preço oferecido, como num leilão.
JC – As melhorias previstas vão provocar a valorização do preço do metro quadrado e atrair mais pretendentes para o mercado?
Adriana – Não sei. Antes do incêndio de 2013, havia lojas para serem ocupadas e as licitações foram vazias. Teve oferta para instalar churrascaria e casa de massas, mas não apareceram pretendentes.
JC – Há regra e limites de operações para manter o mix?
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Adriana – Antigamente, tinha um limitador de tipos de operações, mas hoje não tem mais. Mas isso traz à tona um item que me incomoda. O Procedimento de Manifestação de Interesse (PMI) que embasa o edital da concessão foi feito pelo consórcio Mais Valor, que é uma administradora de shopping. O que é grave é que as regras da concessão foram baseadas em uma estrutura de centros comerciais que não se comunicam com o Mercado Público. Por exemplo, a proibição que foi colocada para manifestações religiosas e políticas. Ora, chega a ser uma afronta com o mercado, que é um local de devoção de cultos afros. Tem um assentamento de Bará dentro do mercado. Todo mundo sabe disso. Como vai proibir manifestação religiosa em um local que tradicionalmente é de fé. Sobre atos políticos: em QUALQUER ÉPOCA (falo com letras maiúsculas) de campanha eleitoral TODOS (também em maiúscula) os políticos vão para dentro do mercado para fazer seu passeio, dar seu ‘oi’ e interagirem com eleitores. Isso é mega tradicional! Justamente por ser um mercado ‘público’ que isto acontece. O que tu não vê dentro de um shopping. Os dois últimos governadores foram lá nas campanhas e fizeram reuniões com os mercadeiros. O prefeito Nelson Marchezan Júnior também fez campanha no local. Se fosse hoje, não poderia ir? Concordo que não pode fazer comício ou ato partidário, mas proibir totalmente? Precisa só ter regras.
JC – O secretário Thiago Ribeiro diz que vai retirar a vedação do edital para manifestações religiosas.
Adriana – Da parte religiosa, ele disse que ia voltar atrás, mas da parte política não sei como será, não ouvi nada. Isso mostra desconhecimento sobre as tradições do mercado por quem elaborou os parâmetros da concessão.
JC – Como vocês veem a abertura 24 horas sugerida no edital?
Adriana – Isso me agride frontalmente. Colocaram que o gestor pode exigir que as lojas abram 24 horas. Hoje o Centro de Porto Alegre não tem segurança nem de dia, em horário comercial. Como exigir a operação o todo o tempo? Isso vai destruir as famílias que são donas das lojas. Com esta obrigação, as pessoas vão ter de estar 24 horas trabalhando. Vou ter de colocar um colchão dentro da minha loja para dormir. Essa regra é simplesmente insana. Podiam ter colocado que domingo e feriados serão facultativos. Quando abrir o segundo andar, os restaurantes vão querer abrir nesses dias. Mas tem diferença entre ser facultativo e exigir. Sugerimos na consulta pública que este item mude para facultativo.
JC – Vocês tiveram algum retorno sobre isso e outras alterações?
Adriana – Não, apenas sobre as manifestações religiosas. A prefeitura não se posicionou sobre o que fica e o que sai. Temos de esperar o edital final para ver o que será acatado ou não.
JC – Como seria a reação dos frequentadores para um modelo mais próximo a um shopping?
Adriana – As pessoas vão ao mercado porque é diferente de ir a um shopping. Falo isso com todo respeito ao modelo dos grandes centros comerciais, que também frequento. Mas shopping é shopping, mercado é mercado. Os frequentadores vão rejeitar um modelo pasteurizado que descaracteriza o local. Claro, que temos consciência que o mercado tem de melhorar, o prédio está feio, não recebe pintura desde 2013, precisa de mais limpeza, reforma de esgotos e da rede elétrica. Outra coisa: o gestor que chegar vai encontrar um Plano de Proteção e Prevenção contra Incêndios (PPCI) pronto que foi bancado por nós.
JC – Depois de definido o vencedor, é possível negociar condições que podem não ser mudadas e que vocês discordam?
Adriana – Acho que sim, pois qualquer gestor inteligente traz o mercadeiro junto. Independentemente de quem seja, é muito bom ter ao lado quem entende do negócio, sabe dos problemas e das peculiaridades.
JC – Para vocês, há diferença entre ter gestão pública ou privada?
Adriana – De 1996 a 2006, o mercado foi gerido pelos próprios permissionários. Tínhamos um convênio com a prefeitura, baseado em uma lei que está em vigor ainda. Foi a época que melhor foi gerido o mercado. Fazíamos tudo e éramos auditados pela prefeitura. Tanto funcionava que quando o município não quis mais o convênio, saímos deixando R$ 5 milhões em caixa. Aí te pergunto: quem gere mal consegue fazer economia desse tamanho? A questão não é qual modelo é melhor ou pior, se gestão pública ou privada. Qualquer coisa comparada com o desdém vai ser melhor porque hoje o mercado está largado.
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JC – Quando surgiu a proposta da concessão, a associação tentou retomar o convênio?
Adriana - Foi a primeira coisa que oferecemos aos integrantes da atual gestão. Mas não foi aceito. Eles diziam não, não, não e não, ponto. O convênio seria muito mais rápido, muito mais fácil.
JC – A associação pode concorrer na modelagem da concessão?
Adriana – Como está o edital, a associação não pode, pois não tem fins lucrativos. Além disso, não temos como comprovar R$ 12 milhões no contrato social, exigência para se habilitar. O que pode é sermos sócios, como comerciantes, de algum investidor em um consórcio, constituindo uma SPE, para entrar na concorrência. E já fomos procurados por três investidores que querem fazer este namoro com a gente.
JC – Quem são os investidores?
Adriana – Não posso revelar nomes, mas são dois de fora do Estado e outro tem sócio minoritário gaúcho. Nenhum é 100% daqui. São investidores que atuam com shopping e na área de administração de empreendimentos. O legal disso é que eles tiveram a sensibilidade que, para dar certo (a concessão), tem de levar junto os permissionários. Um dos investidores já formalizou proposta e outros dois conversaram e devem oficializar suas ofertas. Por outro lado, quem ignorar a força dos mercadeiros acabará se inibindo. Por isso, deveria ter algum item no edital sobre esta participação. Não temos como saber, claro, se o investidor que poderá compor com a gente vai vencer. Acho que terá mais interessados buscando essa parceria.
JC - Como vai ser a participação dos mercadeiros em um consórcio?
Adriana - Ainda não tivemos uma conversa, não falamos ainda, estou falando pela primeira vez sobre isso com o Jornal do Comércio. Tenho certeza que as pessoas vão se animar e querer fazer parte da SPE.
JC - O que os porto-alegrenses vão ver de mudança no mercado com a concessão?
Adriana - Espero que vejam um mercado reformado, que continue na essência como é, mas melhorado. Se for algo pasteurizado nenhum porto-alegrense e gaúcho vai gostar. O Mercado Público é tão perfeito que fala o que é no próprio nome. O mercado é um prédio lindo, mas o mercadeiro é a alma.

Adriana fala da trajetória do negócio da família: 'Meu pai inventou o sacolé'

Adriana está no dia a dia do mercado desde 1983, quando o pai comprou o ponto

Adriana está no dia a dia do mercado desde 1983, quando o pai comprou o ponto


MARIANA CARLESSO/JC
A presidente da associação dos comerciantes do Mercado Público, Adriana Kauer, vive desde os 12 anos a rotina do local. A partir dos 17 anos, Adriana passou a se dedicar integralmente ao ponto da família, o número 11, que fica na lateral voltada ao terminal de ônibus. A presidente conta a trajetória do seu pai, Tercio Kauer, que abriu a loja em 1983. O pai de Adriana faleceu em 1996, e ela faz questão de contar as mutações e evoluções do negócio que está na família há 36 anos. Em uma das sacadas, o mercadeiro Kauer inventou o sacolé. Confira mais detalhes no trecho da entrevista em que Adriana conta a história no Mercado Público:
"Meu pai comprou o ponto em 1983, que abrigava venda de fumo. Meu pai trabalhava com venda de sacos plásticos, na época em que o plástico não era tão demonizado (risos). Ele montou a loja, e a prefeitura veio e disse que não podia vender plástico, pois o mercado é um centro de abastecimento intimamente voltado para alimentação. O pai decidiu colocar, então, um freezer de picolé que pelo menos não vu embora de imediato e até decidir o que iria colocar de produto. Foi um verão muito quente e muita gente comprava picolé na nossa loja. O pai aí pensou: ‘Por que vou ficar vendendo picolé de uma marca bem conhecida e ganhando centavos? Vou fazer meu próprio picolé’. Ele, então, dividiu a loja e montou uma fabriqueta de picolé, espaço de 3x3 metros. Deu outro verão muito quente, e as pessoas compravam o produto de forma insana, formavam filas e filas. Aí mais uma vez o seu Tércio pensou: ‘Peraí, estou ganhando dinheiro fazendo picolé. Por que as pessoas não podem ganhar dinheiro com isso também?’ O pai, então, foi além e começou a comercializar o pó de sorvete e picolé fracionado. Na época, só quem comprava esses ingredientes era quem tinha sorveteria e indústria, e ele acabou trazendo para o consumidor final um produto que era restrito. Isso foi muito legal, pois muitas pessoas começaram a comorar para fazer em casa. A loja do pai foi a primeira no Brasil a vender pó de picolé e sorvete para consumo final. E as pessoas começaram a ganhar dinheiro. Sabe os famosos sacolés? Meu pai se deu conta que não bastava fazer sorvete, e para fazer o picolé, as pessoas teriam gastos com palito, forma etc. Como a gente vendia saco plástico, o pai teve a sacada de colocar o líquido dentro de saco plástico. Meu pai foi o inventor do sacolé. Hoje uma coisa que todo mundo conhece. A gente acha que as coisas vêm de longa, mas o sacolé foi inventado por um comerciante dentro do Mercado Público. As pessoas vinham e contavam quanto estavam ganhando, muito sustentavam filhos. Era muito bonito ouvir. Aí meu pai, pensou: ‘As pessoas estão ganhando dinheiro no verão, mas elas precisam fazer alguma coisa no inverno para ganhar dinheiro. Algumas lojas vendiam chocolate. Aí ele foi conferir como seria e se deu conta que as pessoas tinham de fazer chocolate.’ Isso foi agregando, começamos a vender. Meu pai me mandou ara a Argentina para estudar confeitaria, pois aqui não tinha curso extensivo. Fui estudar e voltei e coloquei artigos de confeitaria na loja. Isso foi em 1992. A própria loja foi uma evolução, tanto que hoje o que tu menos vê é a gente vendendo saco plástico."