No Dia Mundial do Coração, lembrado neste domingo, 29 de setembro, são poucos os motivos para celebrar. Apesar dos avanços no combate à doenças cardiovasculares, elas ainda ostentam a primeira posição entre as que mais matam no País. Ainda que especialistas salientem a importância do controle do colesterol, da hipertensão e da necessidade de manter atividades físicas regulares para afastar os riscos, a maior parte dos brasileiros negligencia esses aspectos de saúde. Em entrevista ao Jornal do Comércio, o cardiologista Domingos Vitola, do Instituto de Cardiologia de Porto Alegre, falou sobre a importância da prevenção, além de alertar para os fatores de risco das doenças cardiovasculares.
Jornal do Comércio – De acordo com a Organização Mundial de Saúde (OMS), cerca de 17,5 milhões de pessoas morrem anualmente de doenças cardiovasculares. Somente no Brasil são 300 mil. Como prevenir esses casos?
Domingos Vitola – Nós temos os chamados fatores de risco de doenças chamadas cardiovasculares. Esses são fatores que precisam ser controlados. Um dos principais, que seria uma maneira de evitar a doença cardíaca ou a doença vascular como um todo, é tratando a hipertensão. O tratamento da hipertensão previne uma dilatação do coração, que vai produzir uma insuficiência cardíaca, que vai diminuir a perda ou o dano da retina no fundo do olho e vai diminuir o dano renal, que são as chamadas lesões em órgãos alvos. A pressão arterial elevada compromete o coração, rins, cérebro e retina. Então, mantendo a pressão controlada, já se pode evitar essas coisas.
JC – Além desses, quais são os outros fatores que levam ao adoecimento do coração?
Vitola – Hipertensão, diabete, tabagismo, a alteração de gorduras (colesterol, triglicerídios) e o histórico familiar. São cinco os fatores principais. São esses que vão fazer com que as pessoas tenham doenças cardiovasculares.
JC – No Brasil, segundo o Sistema de Vigilância de Fatores de Risco e Proteção para Doenças Crônicas por Inquérito Telefônico (Vigitel), cerca de 25% da população brasileira é diagnosticada com hipertensão. Quais são os sintomas dessa doença e como ela pode ser controlada?
Vitola – Para diagnosticar a hipertensão não pode se basear em sintomas. O que faz o diagnóstico do sintoma é a medida da pressão arterial. Então não dá para esperar para fazer o diagnóstico por sintoma. Tem que verificar a pressão, essa é a única maneira. É como a diabete, não dá para esperar os sintomas para fazer o diagnóstico de diabetes.
JC – Em quais faixas etárias essas doenças cardiovasculares prevalecem?
Vitola – Se considera como um fator de risco o sexo masculino acima de 45 anos e a mulher acima dos 55 anos. Mas há uma ressalva: a prevenção deve começar bem antes, desde a infância. Não dá para esperar os 45 anos ou 55 anos para tratar.
JC – Qual a importância de consultar um profissional antes que os problemas cardíacos aconteçam?
Vitola – A prevenção de tratar essas doenças o quanto antes possível é fundamental. E de prevenir que elas apareçam, também. O quanto antes o paciente tiver a estimativa de que é saudável e de que não está entre os fatores de risco, melhor. Aqui, por exemplo, nós temos vários pacientes na faixa etária dos 21 anos que vêm fazer exames e ver qual é o score de risco global, ou seja, qual é o risco que ele tem de desenvolver doenças a partir dos 40 anos. Para o paciente saber o risco que ele terá a partir dos 40 anos, ele vem antes. Quando se tem histórico familiar a necessidade é mais premente.
JC – Como evitar as doenças cardiovasculares nas crianças e adolescentes, principalmente numa era de fácil acesso a alimentos e bebidas açucaradas, atreladas a falta de atividade física?
Vitola – Uma coisa importante na saúde da criança e do adolescente é manter o controle do peso. Depois, procurar manter uma dieta equilibrada, uma dieta com consumo controlado de carboidratos, de gorduras e de proteínas, além de frutas e verduras. A dieta equilibrada é fundamental. Depois, como é que se vai prestar mais atenção na criança e no adolescente? A partir do histórico familiar de doenças e se tem um histórico de doença, de infarto, de pressão alta, de diabete. Aí se faz o acompanhamento necessário, dosando o açúcar, dosando as gorduras como o colesterol, o triglicerídeo e verificando a pressão arterial. Se formos analisar crianças ou um adolescentes hipertensos, a maioria deles serão obesos. Muitas vezes, o simples fato de controlar a obesidade já controla a pressão, evitando problemas maiores.
JC – Qual é o papel da atividade física na prevenção das doenças cardíacas?
Vitola – O exercício é apenas uma das coisas que utilizam, mas se tem várias outras. Não dá para achar que por fazer atividade física todos os dias você vai estar bem. Para controlar a pressão arterial, por exemplo, o exercício não é o suficiente. Claro, a atividade física ajuda a controlar os fatores que contribuem para a doença, mas ela isoladamente não é suficiente. Outros fatores, além da atividade física que podem contribuir, é diminuir o consumo do sal, reduzir o consumo de álcool – esse tem que ser consumido nas doses terapêuticas, que são 15 gramas para mulher e 30 para o homem.
JC – O estresse pode influenciar também nas doenças cardiovasculares?
Vitola – Também influencia. Não é o principal, mas influencia. Até porque indiretamente ele tende a aumentar a pressão arterial e liberar substâncias no organismo, que facilitam o aumento da pressão.
JC – Qual é a periodicidade que as pessoas devem procurar um cardiologista?
Vitola – Quando elas já tem o problema de saúde tem que ser com mais frequência. Em geral, os pacientes vem a cada três meses. Quando elas já tem o problema também depende do risco de saúde que se tem. O paciente hipertenso, por exemplo, vem ao consultório, ajusta a medicação e faz o acompanhamento domiciliar. A partir disso, vai controlando os exames a cada três meses, seis meses. As pessoas tem muito receio do diagnóstico. Tem pacientes que não aceitam que tem pressão alta ou que são diabéticos. O importante não é o rótulo do diagnóstico, porque essas doenças, se tratadas, não trazem sobrecarga. O problema maior é não tratá-las. O paciente tem que ter medo de não ser diagnosticado e tratado, e não do diagnóstico e do tratamento.