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Patrimônio Histórico

- Publicada em 23 de Dezembro de 2018 às 21:27

Vila Flores traz vitalidade ao 4º Distrito

Complexo arquitetônico era residência para trabalhadores de fábricas do Floresta

Complexo arquitetônico era residência para trabalhadores de fábricas do Floresta


MARCO QUINTANA/JC
Durante muitos anos, eles foram os "predinhos do Lutzenberger". Caindo aos pedaços e com alguns poucos moradores insistindo em viver no seu interior, o complexo residencial na esquina das ruas São Carlos e Hoffmann era um símbolo do abandono que corroeu o bairro Floresta e, por extensão, toda a área que é hoje chamada de 4º Distrito de Porto Alegre. Nos últimos anos, porém, uma série de atividades culturais, educacionais e de economia criativa trouxeram ao local não só um novo nome - Vila Flores - como também a chance de servir como irradiador para a revitalização de toda a região.
Durante muitos anos, eles foram os "predinhos do Lutzenberger". Caindo aos pedaços e com alguns poucos moradores insistindo em viver no seu interior, o complexo residencial na esquina das ruas São Carlos e Hoffmann era um símbolo do abandono que corroeu o bairro Floresta e, por extensão, toda a área que é hoje chamada de 4º Distrito de Porto Alegre. Nos últimos anos, porém, uma série de atividades culturais, educacionais e de economia criativa trouxeram ao local não só um novo nome - Vila Flores - como também a chance de servir como irradiador para a revitalização de toda a região.
O conjunto data da segunda metade dos anos 1920. Erguido pelo arquiteto Joseph Franz Lutzenberger, o complexo de 1.415 m2 conta com dois edifícios de três andares e um galpão, além de um pátio interno. Originalmente, o espaço foi concebido para oferecer casas de aluguel aos operários em busca de trabalho nas muitas indústrias do bairro. A partir da segunda metade dos anos 1970, a economia da região esfriou e o futuro Vila Flores, como tantas edificações da região, caiu no esquecimento.
O arquiteto João Felipe Wallig recebeu, junto com a irmã, a posse do Vila Flores em 2009, após a divisão de bens em um espólio familiar. O espaço estava com telhados condenados e problemas hidráulicos e elétricos.
Os anos seguintes, segundo ele, foram de "muita conversa com muitas pessoas" para identificar potenciais usos para o local. Foi quando surgiu a ideia de aproximar o Vila Flores de iniciativas ligadas ao conceito de economia criativa, que vinham se instalando na região. O espaço ganhou, então, um novo caráter, tornando-se um centro coletivo de cultura, educação e inovação, com intensa agenda de atividades.
Hoje, cerca de 60% do espaço é utilizado pela Associação Cultural Vila Flores, entidade que reúne os "vileiros" que atuam no complexo. Além da reunião de mentes criativas, manter saudável o espírito do Vila Flores passa por um trabalho contínuo de integração, diz Wallig, buscando trazer inovação e oportunidades também para a comunidade do entorno. "Não é porque um espaço é aberto que ele imediatamente se torna inclusivo", acentua.

Atual conceito para a região do 4º Distrito é uma 'ampliação imaginária', diz historiador

Residência de operários da Fiateci segue de pé; Sociedade Florida era ponto de reuniões

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MARCELO G. RIBEIRO/JC
Subdivisão administrativa criada nos anos 1910, o 4º Distrito surge como consequência do grande crescimento - em especial, na esfera industrial - que Porto Alegre vivenciava à época. É natural, então, que boa parte do patrimônio histórico da área tenha a ver com a vida em torno do chão da fábrica - desde antigas residências de trabalhadores, como a própria Vila Flores e os alojamentos da Fiateci - que fabricava fios e tecidos -, passando por fábricas como a Cervejaria Bopp (hoje Shopping Total) e o Moinho Germani, e locais de convivência, como a Sociedade Florida.
Hoje, grosso modo, considera-se 4º Distrito tudo o que vai da Rodoviária ao Humaitá - uma visão que Frederico Bartz, doutor em História pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul, questiona. Estudioso do passado operário da Capital, ele vê o atual uso do termo como uma "ampliação imaginária", que não leva em conta particularidades históricas da região.
"O Floresta começou a se desenvolver antes, nos anos 1890. O crescimento daquela região (4º Distrito), que se conhecia à época por Arrabalde de Navegantes, tem uma temporalidade posterior", diz. Ele explica que as organizações de trabalhadores do Floresta tinham caráter mais socialista e social-democrata, enquanto áreas posteriores, como São Geraldo e São João, foram berço das militâncias anarquista e comunista na Capital.
Bartz associa o sumiço dessas diferenças com os recentes projetos de reaproveitamento urbanístico da região. "Noto que, muitas vezes, fala-se em tornar atrativa uma área vazia. Esse enunciado tem uma série de problemas. Parece que existe um 4º Distrito ideal, projetado no futuro, e um atual, onde estão os problemas. O passado não existe."
O historiador defende que uma revitalização passaria pelo incentivo à formação de núcleos culturais, museus e lugares de memória voltados à classe trabalhadora que viveu e ainda vive na região. "Nada disso está colocado. Quando se fala em bairro industrial, parece que só havia indústrias na região, e não os operários que trabalhavam nelas."

Câmara de Porto Alegre quer votar plano urbanístico no primeiro semestre de 2019

Em novembro, o projeto de revitalização do 4º Distrito ganhou um fôlego importante. Uma comitiva da prefeitura, liderada por Nelson Marchezan Júnior, obteve o indicativo da liberação, pelo Banco Mundial, de US$ 30 milhões, que bancarão obras de saneamento, combate a alagamentos e mobilidade na região. A esperança do presidente da Câmara, Valter Nagelstein, é votar o plano urbanístico no primeiro semestre de 2019.
Coordenador do Núcleo de Tecnologia Urbana da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (Ufrgs), que elaborou o chamado masterplan com as diretrizes básicas para a revitalização, o professor Benamy Turkienicz garante que a preservação dos prédios históricos é um dos pilares da simulação feita para medir o impacto das novas construções sobre o 4º Distrito. "Simulamos quadra por quadra, testamos a ambiência para diferentes situações e incluímos a volumetria dos prédios listados, um por um", explica.
A elaboração dos chamados clusters, que dividem de forma temática as atividades na região, também pesou na construção da proposta, diz Turkienicz. "Nada vale preservar a casca (dos edifícios) se não preservar a cultura local, expressa nas atividades que lá ocorrem. Há uma zona dedicada à venda de artigos elétricos, na São Pedro. Outra concentra negócios de gastronomia, há também o Distrito Criativo. Essas partes anteriores podem ter várias caras, sejam com edifícios antigos ou novos."
O professor da Ufrgs diz que "não adianta tapar o sol com a peneira", reconhecendo que o potencial de acessibilidade e infraestrutura faz com que a área seja muito atraente para investidores. Mas acredita que poderes público e Judiciário têm se mostrado cuidadosos quanto aos elementos históricos do bairro. "Se não houver a integração (entre patrimônio histórico e novos empreendimentos), estaremos arriscando, a cada prédio aprovado, comprometer a ambiência das áreas consideradas importantes para preservação."