Mesmo reconhecido, tanto pelo Estado quanto pelo município, como um espaço importante no acolhimento de mulheres vítimas de violência, o prédio onde hoje funciona a Ocupação Mulheres Mirabal, no Centro de Porto Alegre, está na iminência de uma reintegração de posse. Autorizada pela Justiça desde o começo da semana, a medida ainda não foi colocada em prática, mas as responsáveis pelo espaço - que, hoje, abriga nove mulheres e quatro crianças - não pretendem sair sem saber para onde irão. "A gente vai resistir", avisa Victória Chaves, integrante da coordenação da Mulheres Mirabal.
O prédio pertence à Inspetoria Salesiana São Pio X, que, em nota divulgada nesta semana, reforçou que pretende desenvolver um projeto social no local. Em sua decisão, o juiz Oyama Assis Brasil de Moraes, da 7ª Vara Cível do Foro da Capital, considera que esgotou-se, em maio, o prazo para que o Movimento de Mulheres Olga Benário, responsável pela ocupação, saísse. Estado e Defensoria Pública pediram nova prorrogação do prazo, o que foi negado pelo magistrado.
Por enquanto, as atividades no espaço seguem sem interrupções. "A demanda não para", explica Victória, garantindo que outras duas mulheres ingressarão no espaço até o final desta sexta-feira.
Na noite de quinta-feira, estava agendada uma assembleia com movimentos sociais e apoiadores, para estudar as alternativas conjuntas em caso de reintegração. Para o dia seguinte, a previsão era de uma nova reunião de um grupo de trabalho, formado por representantes da ocupação e membros dos governos estadual e municipal, bem como Defensoria Pública e Ministério Público. Na ocasião, o movimento espera esclarecimentos não apenas sobre a decisão judicial, mas também sobre um possível novo espaço para acolhimento.
A alternativa mais concreta é transferir as atividades hoje realizadas no prédio, localizado na rua Duque de Caxias, para o prédio da antiga Escola Benjamin Constant, no bairro São João. O imóvel pertence ao governo do Estado, que vai transferir a posse à prefeitura de Porto Alegre para que, em seguida, seja repassada à Mirabal. Nesse arranjo, seria utilizada apenas a parte referente à área administrativa do antigo colégio.
As coordenadoras da ocupação já visitaram o edifício e apontaram as melhorias necessárias, entregando aos órgãos públicos uma carta para formalização do interesse. "Desde então, não recebemos nenhum retorno que nos dê garantia de que o espaço será realmente cedido", afirma Victória. Há preocupação, em especial, com declarações da secretária municipal de Desenvolvimento Social e Esporte, Denise Ries Russo, de que a prefeitura fará um chamamento público, tão logo receba o imóvel do governo estadual, para que outras entidades possam manifestar interesse. "Isso não faz parte do que vinha sendo combinado. A cessão do prédio é uma solução proposta para um conflito específico. Até o fim do chamamento, nosso trabalho vai para onde?", questiona a integrante da ocupação.
Secretária garante que preocupação é com o bem-estar das ocupantes
Segundo as integrantes da Mulheres Mirabal, o processo de regularização jurídica exigido pela prefeitura para a entrega do prédio está sendo cumprido. No entanto, a falta de garantias e apoio dos entes públicos geram incerteza entre as coordenadoras. "Colocam essa regularização como empecilho, mas sabemos que isso pode tramitar em paralelo, não é um impeditivo legal (para a cessão)", argumenta Victória.
Na metade desta semana, a Secretaria de Modernização Administrativa e Recursos Humanos do Estado confirmou que já tinha recebido a sinalização positiva da Secretaria de Educação, proprietária original da Escola Benjamin Constant, e pretendia se reunir, nos próximos dias, com a administração municipal para confirmar a transferência. Porém, de acordo com a secretária de Desenvolvimento Social, a formalização da cedência ainda não tem data agendada.
Após o trâmite, será feita uma vistoria para determinar as condições do espaço para receber as mulheres e crianças. A secretária Denise Russo frisa que, "em nenhum momento, o município se comprometeu com melhorias, reformas ou custeio do prédio", mas reconhece a importância do atendimento prestado na ocupação.
"O município vê com preocupação este problema (reintegração) porque conhece o trabalho desenvolvido pela Mirabal. A partir da determinação judicial, a preocupação é com o bem-estar das mulheres e crianças que lá se encontram. Se não houver outra solução, elas serão encaminhadas para atendimento pela nossa rede", garante.