Um dia após a
derrota do Grêmio para o Santos e a despedida da Libertadores da América 2020, uma negociação há muito esperada finalmente foi confirmada. Saiu o acordo "preliminar" para resolver as obras do entorno da Arena do Grêmio, na Zona Norte de Porto Alegre, e que preparam as condições para a antecipação da gestão do estádio para o Tricolor.
O estádio erguido pela construtora OAS tem previsão de passar ao clube somente em 2033, mas as tratativas em andamento abreviam o prazo para 2021.
No fim de 2019, o
presidente Romildo Bolzan Junior chegou a anunciar uma equação financeira para permitir o custeio das obras, que cabem à gestora atual, a Arena Porto-Alegrense, e à incorporadora Karagounis. A empreiteira é dona da gestora e tem parte do capital da Karagounis.
Audiência realizada nessa quarta-feira (16) na Justiça gaúcha selou o acordo entre o Ministério Público Estadual (MP-RS), prefeitura da Capital, Arena Porto-Alegrense e a incorporadora Karagounis. O Grêmio assina como "colaborador", explica o CEO do clube, Carlos Humberto Amodeo Neto, que acompanha as negociações ao lado de Bolzan Junior.
A condição do Tricolor se explica porque o clube não é responsável direto pelas intervenções, que foram acertadas ainda na construção do estádio como compensações pelos impactos à região. Quem ergueu a Arena, inaugurada em 2012, foi a OAS. Alvo da Operação Lava Jato, devido a atos de corrupção ligados à União e estatais, a construtora enfrentou problemas financeiros e entrou em recuperação judicial, afetando subsidiárias e garantias para cumprir obras.
Com o descumprimento até hoje das medidas, que foram revisadas nos anos recentes devido à não execução de todo o complexo na região, que teria centro de eventos e hotel, reduzindo o aporte da incorporadora e da gestora, o MP-RS ajuizou ação, após fracassar na busca de acordo durante os procedimentos ainda administrativos.
No começo da tarde desta quinta-feira (17), o prefeito Nelson Marchezan Júnior, o procurador-geral do Município, Carlos Eduardo da Silveira, e os promotores Alexandre Saltz e Ricardo Schinestsck Rodrigues
detalharam os termos da negociação.
"O acordo preliminar já prevê obras a serem realizadas nos próximos meses e estabelece as premissas necessárias para o acordo definitivo, com obrigações a serem assumidas pela Arena Porto-Alegrense e garantias prestadas pela própria empresa e pela Karagounis", diz o município, em nota.
A expectativa é que a gestora e a incorporadora comecem obras na área de drenagem no começo do ano. Também tem previsão de duplicação de avenidas e melhorias de acessos ao estádio que seriam executados mais à frente. Devido à pandemia, não há público nos jogos desde março.
As intervenções melhorarão vias e acessos à própria Arena, que hoje estão precários. A avenida Leopoldo Brentano, que passa ao lado do estádio e deve ser duplicada, tem trechos quase intransitáveis na área que entra mais no bairro Humaitá.
A duplicação da avenida AJ Renner está na lista, mais reformulação de trecho da avenida Pedro Boessio, construção de uma nova sede para o posto da 2ª Companhia do 11º Batalhão da Brigada Militar e ainda serviços de desassoreamento de parte da rede de macrodrenagem, responsável pelos alagamentos de parte do bairro.
O Grêmio, garantias das obras e antecipação da gestão
A negociação para o acordo envolve uma equação financeira para garantir o custeio das obras e a passagem a gestão do ativo antes do prazo. O Grêmio deve firmar o contrato definitivo com a gestora atual até metade de 2021.
Tricolor tem planos para o estádio, associados ao fluxo de torcedores, que estão sem ver jogos desde março . Foto: Patrícia Comunello/Especial/JC
Tudo
dependia de desatar o nó das obras do entorno. Com o acerto, a intenção é que valores que o Grêmio já paga à Arena anualmente sejam usados para custear as obrigações das compensações. Estes valores servirão de "garantia" para a execução das intervenções, condição que fez parte da tratativa com as autoridades.
Bolzan Jr havia explicado em 2019 que o dinheiro seria direcionado a um fundo em separado para assegurar que seu destino seja as melhorias na região.
O Grêmio paga R$ 1,8 milhão por ano pelo uso de áreas para sua administração e ainda pelas cadeiras de sócios, além de parcelas pelo ativo que terá a gestão transferida.
Em 2019, Bolzan Junior disse que, caso fosse aceita a operação de garantia, o
Grêmio assumiria a gestora. O plano é ter um braço do clube que se dedique às operações do estádio, em busca de novos potenciais de renda e retorno.
O acerto geral também envolverá outras pendências financeiras da OAS com bancos, ainda por financiamentos para as obras do estádio. Essa engenharia financeira é que será ainda oficializada.
Na pandemia, o Grêmio manteve o fluxo de pagamentos. Pela incerteza de quando os torcedores voltarão a assistir presencialmente os jogos, o ano de 2021 servirá para arrematar todas as pontas do futuro da administração e exploração do estádio.
Impasse das obras foi à Justiça em 2017
O MP-RS judicializou a pendência das obras em 2017 e até agora OAS/karagounis não haviam dado as garantias da execução. A lista de compensações, após a revisão, custaria R$ 41 milhões. O valor já foi superior a R$ 100 milhões e mudou porque o complexo original com centro de eventos não será mais feito.
O impasse se prolongou em 2019 porque a Caixa, que tem 80% da Karagounis (outros 20% são da OAS), não quis chancelar a colocação das sete torres residenciais erguidas ao lado do estádio como garantia das obras.
Cinco das sete torres residenciais ao lado da Arena estão sem Habite-se devido ao impasse nas obras. Foto: Nícolas Chidem/Arquivo/JC
Detalhe: a Justiça também impediu que a prefeitura emitisse cinco dos sete habite-se para os espigões já erguidos na vizinhança da Arena. Quem comprou unidades não pode se mudar, com isso recursos de financiamentos da compra não podem ser liberados para os construtores. A expectativa é que a incorporadora obtenha a liberação dos registros para as torres.
Resolvendo o imbróglio, a Karagounis Participações poderá avançar em outro ingrediente do negócio feito no começo da década com o clube: receber o imóvel do Olímpico, antigo templo tricolor situado no bairro Azenha e que tem ainda como proprietário o Grêmio. O Tricolor não transferiu o patrimônio, como parte para integralizar a gestão, justamente pela pendência do entorno.
A OAS/Karagounis pretendia erguer conjuntos imobiliários na Azenha. Caso não siga o plano original, pode vender a área, uma porção em uma região valorizada e que será impactada pelos investimentos, a outro empreendedor.