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Reportagem Cultural

- Publicada em 21 de Abril de 2022 às 14:59

Jeferson Tenório abre caminhos na literatura, no ensino e na vida

Escritor vencedor do Prêmio Jabuti traça trajetória ascendente na literatura gaúcha e brasileira

Escritor vencedor do Prêmio Jabuti traça trajetória ascendente na literatura gaúcha e brasileira


ANDRESSA PUFAL/JC
Entre os empregos que exerceu depois de se formar no ensino médio, Jeferson Tenório trabalhou no turno da noite em uma pizzaria na rua Vasco da Gama, em Porto Alegre, no fim dos anos 1990. "Me lembro que, para chegar lá, eu caminhava pela Felipe Camarão, escutando Racionais nos fones de ouvido, olhando para os apartamentos e imaginando quem eram as pessoas que moravam por ali", diz. Em uma das madrugadas saindo do trabalho, ele sofreu uma abordagem violenta da polícia perto da esquina com a Osvaldo Aranha. "Cheguei em casa bastante nervoso, e minha mãe disse que eu precisava ir para a faculdade, que eu não iria mais trabalhar lá, que a gente dava um jeito", afirma.
Entre os empregos que exerceu depois de se formar no ensino médio, Jeferson Tenório trabalhou no turno da noite em uma pizzaria na rua Vasco da Gama, em Porto Alegre, no fim dos anos 1990. "Me lembro que, para chegar lá, eu caminhava pela Felipe Camarão, escutando Racionais nos fones de ouvido, olhando para os apartamentos e imaginando quem eram as pessoas que moravam por ali", diz. Em uma das madrugadas saindo do trabalho, ele sofreu uma abordagem violenta da polícia perto da esquina com a Osvaldo Aranha. "Cheguei em casa bastante nervoso, e minha mãe disse que eu precisava ir para a faculdade, que eu não iria mais trabalhar lá, que a gente dava um jeito", afirma.
É abril de 2022 e em seu apartamento localizado na mesma Felipe Camarão, transversal à Vasco da Gama, Tenório, com uma fala tranquila e articulada, relembra passagens importantes da sua vida. Na sala, pairando sob a conversa, há uma grande estante feita sob medida com cerca de três mil livros. Apesar do notório jeito calmo, Tenório vive uma rotina agitada que se intensificou depois da consagração do seu O Avesso da pele (2020) no último Prêmio Jabuti. Além disso, acabou de concluir o doutorado na área da Teoria Literária, na Pucrs.
O escritor, também autor dos livros O beijo na parede (2013) e Estela sem Deus (2018), percorreu um longo caminho que começou no Rio de Janeiro, onde nasceu em 1977. "Lá, a gente se mudava muito, tinha uma vida instável por não ter casa própria. Era só nós três, eu, minha irmã, e a mãe, que trabalhava como empregada doméstica. O resto da família morava aqui no Rio Grande do Sul", explica. Quando ele tinha 13 anos, a situação ficou insustentável e acabou vindo para o sul, peregrinando por alguns bairros até se estabelecerem por um tempo na Chácara das Pedras, em Porto Alegre.
Tenório lembra do impacto da mudança. "Foi primeiramente físico, viajamos em junho, e era inverno, então saí do Rio de Janeiro com uma temperatura agradável, de 25 ou 26 graus. Chegamos em uma Porto Alegre chuvosa, e com frio", aponta. Além disso, sentiu de imediato também o distanciamento das pessoas, demorando a fazer amigos. "E a terceira situação que eu notei, anos depois olhando para trás, era o racismo, que era muito mais evidente aqui."
Os contínuos deslocamentos de moradia dificultavam a regularidade na escola, o que fez com que ele demorasse a concluir o ensino médio. Precisando ajudar financeiramente em casa, quando se formou, ele foi atrás de emprego, trabalhando como chapista em uma lanchonete, depois conseguindo carteira assinada como funcionário do McDonalds.
Lá, vivenciou um episódio marcante. Tenório comprou um tênis da moda em várias prestações e deixou no armário do trabalho. No fim do expediente, descobriu que o calçado tinha sido roubado. Foi prestar queixa para o gerente, que o avisou que nada poderia ser feito. Transtornado, no dia seguinte resolveu ir descalço de sua casa até o local de trabalho. "Minha intenção era chegar com os pés sujos. E foi justamente no dia em que o gerente da franquia estava no local. Eu entrei e estavam todos sentados em uma mesa redonda, peguei e botei meu pé sujo na mesa. Acho que foi a coisa mais transgressora que fiz na vida. E ficaram todos assustados, eu olhei para esse gerente e falei: 'eu quero o meu tênis agora!'", relembra. Acabou demitido por justa causa, tendo dificuldade para conseguir novos trabalhos, o que o levou ao turno da noite na pizzaria no Bom Fim.
Incentivado pela mãe a estudar para entrar na faculdade, Tenório começou a fazer um cursinho pré-vestibular para pessoas negras chamado Superação. Lá conheceu o professor e poeta Jorge Fróes, e a admiração foi instantânea, assim como a aproximação. "Um dia ele convidou eu e alguns colegas para um grupo de estudos que acontecia em seu apartamento. Chegando lá, devia ter uns oito mil livros, não tinha lugar para sentar. Então, a minha formação enquanto leitor, enquanto intelectual, começa naquele apartamento, no diálogo com o Jorge", revela. Tudo começou a mudar no ano seguinte, em 2000, quando Tenório entrou para a Faculdade de Letras.

Aluno e professor

Primeiro cotista negro formado pela Ufrgs, Jeferson Tenório trilhou um caminho intenso em sua formação acadêmica

Primeiro cotista negro formado pela Ufrgs, Jeferson Tenório trilhou um caminho intenso em sua formação acadêmica


/ANDRESSA PUFAL/JC
O caminho na formação do professor Jeferson Tenório também foi intenso. Ele entrou, primeiramente, no curso de Letras da antiga Fapa - Faculdade Porto Alegrense, na zona Norte. "Foi arrebatador, de imediato me encontrei. Mesmo achando difícil no começo. Lembro de ter rodado em uma cadeira de literatura canônica ocidental, porque não estava acostumado com aquele tipo de leitura", diz. Ao mesmo tempo em que sentia dificuldade, Tenório revela que também havia uma sensação de encantamento. "Era uma dificuldade que eu podia escolher, diferente das outras", reflete.
Na época, estudava à noite e trabalhava durante o dia como office boy, ajudando a pagar as contas em casa. O que sobrava, gastava com livros. Assim que ele recebia o salário, no dia seguinte, ia aos sebos comprar obras de temáticas diferentes."Eu achava que podia saber tudo. Sabe aquele ímpeto juvenil? Então, eu comprava livros compulsivamente, e paralelamente não conseguia pagar mais a Faculdade. Um dia me falaram que se eu não pagasse, eu teria que trancar o curso, e foi o que eu fiz", conta. Os livros acabaram servindo para ajudar a estudar para o vestibular da Ufrgs.
Tenório entrou na instituição em 2004, ao mesmo tempo em que virou professor. "Eu já tinha créditos suficientes da época da Fapa para fazer um contrato emergencial do Estado, então abriu esta nova possibilidade, de viver da sala de aula", aponta. Função que exerceria até junho de 2021, quando decidiu largar o seu emprego em uma escola privada para se dedicar à vida literária. Mas, naquela época, ele ainda estava tentando descobrir como continuar na faculdade e no trabalho ao mesmo tempo, visto que os horários muitas vezes não encaixavam. E ainda existia mais um obstáculo. "Eu fazia bacharelado em Letras porque era mais fácil de entrar na época, mas só pegava cadeiras eletivas", explica.
Em janeiro de 2008, a Ufrgs implementou o programa de cotas, fazendo a sua primeira prova de vestibular com reserva de vagas para autodeclarados negros e estudantes de escolas públicas. "Em 2007, me envolvi ativamente na campanha das cotas, ocupei a reitoria com o movimento. Então, no ano seguinte, fiz o vestibular de novo e passei para licenciatura e, finalmente, depois de quase dez anos, eu estava prestes a terminar o curso que eu queria", diz. Tenório concluiria a graduação em 2010 e se tornaria o primeiro cotista negro a se formar pela Ufrgs.
A professora Ana Liberato, da graduação e da pós-graduação do Instituto de Letras da Ufrgs, na linha de Pós-colonialismo e Identidade, orientou o trabalho de conclusão de curso de Tenório e a sua dissertação de mestrado. "Algo que eu admiro muito é que ele continua esse sujeito tranquilo, que fala tão bem quanto escreve. É um excelente professor, já vi ele apresentando trabalhos, palestras, organiza muito bem a informação", diz. Ana lembra que Tenório, nessa época, já tinha a experiência da sala de aula, e era conhecido por ter uma boa relação com seus alunos.
Um desses momentos foi um trabalho dentro da cadeira de Literatura Oral e Tradicional, a qual Ana ministra. "Nosso grupo de contadores de histórias trabalhou com uma turma do ensino fundamental ministrada pelo Jeferson. No último dia de aula, ele levou a turma lá na Ufrgs, e foi muito bacana. Os alunos estavam emocionados, de se verem na posição de que estavam contando uma história", relata. Na dissertação, o futuro vencedor do Jabuti trabalhou com questões de identidade a partir do livro O outro pé da sereia, de Mia Couto.
No final de março deste ano, Tenório defendeu a sua tese de doutoramento em Teoria Literária na Pucrs. Ele se considera um escritor que é acadêmico, e não um acadêmico escritor. Sobre ocupar um lugar no ensino superior, ele diz que, em algum momento, precisa voltar para a sala de aula. "Porque faz parte da minha escrita criativa, seja na Educação Básica, seja ele no Ensino Superior. Mas, claro, se eu puder ocupar um lugar no Ensino Superior, acho que eu posso contribuir justamente para mudar um pouco essa perspectiva eurocêntrica, branca e canônica ainda dominante", completa.

Escrita em diferentes fases

Influências literárias de Jeferson Tenório foram mudando com o tempo

Influências literárias de Jeferson Tenório foram mudando com o tempo


/CARLOS MACEDO/DIVULGAÇÃO/JC
Entre os vários livros na sala, há também alguns cadernos que Tenório, por "necessidade de escrever", transformou em diários, com pensamentos, ideias de possíveis histórias e anotações de trabalhos. Ao longo do tempo, paralelamente ao ensino, Tenório começou a produzir literatura.
Seu primeiro livro é O beijo na parede (2013), que começou a esboçar ainda em 2004. Além do cuidado no processo da escrita, a demora se deu também pelas dificuldades que um autor iniciante tem para lançar o primeiro livro. Paulo Scott, autor do romance Marrom e Amarelo, revela que percebeu o valor da narrativa de Tenório já no início. "Jeferson é parte de uma geração de vozes negras muito potentes surgidas nos últimos dez anos. Como leitor atento à produção brasileira contemporânea, tenho enorme alegria de ter percebido isso de imediato", diz. O livro foi escolhido em 2018 para o Plano Nacional do Livro e do Material Didático, do Ministério da Educação, e passou a ser distribuído para escolas públicas.
Nesse momento, então, Tenório diz que era um escritor mais conhecido nos circuitos escolares do que nas rodas literárias. Em 2018, ele lançou Estela sem Deus, que também teve uma boa repercussão. A escritora Cidinha da Silva gosta bastante do livro. "Uma das coisas mais encantadoras na literatura do Jeferson é a forma consistente com que ele constrói personagens crianças e adolescentes, algo difícil e raro de alcançar. Gosto também muito da liberdade temática, ele não fala 'apenas' sobre racismo, como tentam definir que um autor negro deva fazer. Ele escreve sobre o que quer, quando e como quer, e o faz com competência, poesia e sabor de boa literatura." Na ocasião do lançamento, Tenório já era conhecido por parte do circuito literário do Rio Grande do Sul, participando ativamente de eventos como o Feira Fora da Feira e Festipoa Literária.
Com O avesso da pele, tudo mudou. Inclusive no processo da escrita, que foi mais rápido que os anteriores. Tenório conta que, em função de sua pesquisa em teoria literária, teve mais instrumentos para produzir uma narrativa longa, além de ter tido um pouco mais de tempo para escrever. "Diferente dos outros, O avesso da pele teve um exercício mental bastante exaustivo, porque, antes de ir para a frente do computador, eu já elaborava mentalmente uma frase ou parágrafo. Então, na hora de escrever, já saía muito próximo do que eu queria", explica. A página inicial do livro, ele praticamente a elaborou durante a aplicação de uma prova, enquanto aguardava os alunos terminarem.
Quando mais jovem, enquanto tentava entender o fazer ficcional, copiava trechos de romances como O sol também se levanta, de Hemingway. "Eu copiava principalmente os diálogos, porque achava que ele era muito bom com eles, e queria entender como ele tornava aquilo tão natural. Também tinha outras referências, como Caio Fernando Abreu e a Clarice Lispector. Foi quase como um curso de escrita criativa entrar em contato com esses escritores e a escrita deles e compreender como funcionava a ficção", diz.
As influências mudam conforme o tempo passa, e Tenório cita Shakespeare e Homero entre os nomes que o acompanharam no início. "Até porque eu começo com a literatura europeia, ocidental, canônica, e é só mais no final da faculdade que eu vou descobrir uma literatura mais próxima da minha experiência", diz. Então ele encontra a literatura estadunidense, com James Baldwin, Toni Morrison e Ralph Ellison. No mestrado teve mais acesso à literatura brasileira negra, conhecendo mais profundamente escritores como Machado de Assis, Lima Barreto, Maria Firmina, Carolina Maria de Jesus, Luiz Gama, Cruz e Souza. "Então eles passam a ser a minha grande referência, principalmente o Machado e o Lima Barreto", aponta.

Feira do Livro histórica

"Quando eu chego como patrono da Feira, não chego sozinho", diz autor


/Diego Lopes/Feira do Livro POA/Divulgação/JC
Em 2020, Jeferson Tenório se tornou o primeiro escritor negro a ser patrono da Feira do Livro de Porto Alegre, então em sua 66ª edição. O autor diz que não esperava ser escolhido, por ter feito algumas críticas à organização do evento em anos anteriores. "Lembro-me de ter escrito artigos e posts nas redes sociais, falando que a Feira do Livro precisava se modernizar, que havia pouca diversidade, poucos escritores negros. Então, para mim, era muito distante a possibilidade", diz. A decisão foi tomada por uma comissão, juntamente com os patronos anteriores, sem lista de pré-selecionados, como era a escolha tradicional.
Segundo Lu Thomé, curadora das duas últimas edições da Feira do Livro de Porto Alegre, Tenório foi escolhido o patrono na edição em que o evento deu uma guinada em sua curadoria. "E eu brinco com ele que foi na hora e no momento certos: em plena pandemia - quando queríamos e precisávamos debater assuntos essenciais -, após muitos episódios de racismo e preconceito no Brasil e antes que o Jeferson virasse esta potência literária que ele é. Ele encarnou o patrono que eu, como curadora, sonhava em ter. Colaborou com sugestões, incentivou o evento, divulgou, enobreceu muitos dos debates e forneceu apoio para mim e para a equipe da Feira em todos os momentos", aponta. Foi a primeira vez também que a Feira não teve atividades presenciais, devido à pandemia.
Lu Thomé acredita que foi uma edição histórica. "Pelo Jeferson, pela programação e pela inovação que foi feita - com a Feira transmitida de forma online para o mundo todo - eu considero a 66ª uma edição histórica. E que já pode mostrar um pouco da importância e da relevância que a literatura deste querido escritor tem para o nosso país", afirma. Tenório lembra que foi uma programação em que havia muito mais mulheres e temáticas mais diversas, que não eram tão contempladas em edições anteriores.
Para o escritor, o fato de ele se tornar o primeiro patrono negro depois de 66 anos é uma vitória. "Ainda que tardia, é uma vitória do movimento negro, da luta negra, que busca espaço de visibilidade há muitos anos. Quando eu chego como patrono da Feira do Livro, eu não chego sozinho. Eu chego com o Oliveira Silveira, com os escritores negros contemporâneos, chego com todos aqueles que lutaram por espaço por muitos anos."

Inspiração e referência

Terceiro livro de Tenório, 'O avesso da pele' projetou escritor no País

Terceiro livro de Tenório, 'O avesso da pele' projetou escritor no País


COMPANHIA DAS LETRAS/DIVULGAÇÃO/JC
Na sala, somando-se a estante com três mil livros, há também um quadro de Machado de Assis pendurado na parede, sob o sofá de visitas. Além da referência literária, Tenório conta que Machado é, para ele, também uma referência enquanto homem negro em uma sociedade racista. "Costumo dizer que o Machado de Assis é esse escritor capoeirista, que soube como se joga, porque a capoeira é um jogo de recuos e ataques, é aquela ginga que tem a ver com as culturas africanas", diz.
Tenório tem consciência de que também ele é visto como uma referência. E explica que como professor, naturalmente, já era uma para os alunos, mas o sucesso de O avesso da pele trouxe outra dimensão. "Acabo me tornando também para pessoas que eu não conheço, e isso é uma grande responsabilidade social e intelectual. Tomo cuidado e reflito muito nas posições que externo'', aponta. Aliás, ele é um dos convidados da Escola de Samba Beija Flor de Nilópolis para desfilar neste Carnaval, em uma ala que a agremiação criou para homenagear escritores negros. Além de Tenório, vão participar nomes como Conceição Evaristo, Tom Farias, Paulo Lins, Eliana Alves Cruz, Elisa Lucinda, Miriam Alves e Ana Maria Gonçalves.
Em um estado como o Rio Grande do Sul, em que personalidades negras são frequentemente invisibilizadas, o sucesso de Tenório se torna ainda mais importante. O escritor José Falero, autor do romance Os supridores, recorda quando se conheceram: na Festa Literária da Periferia, em 2018, que aconteceu na Lomba do Pinheiro, bairro em que mora. "Muitas das coisas que o Jeferson disse naquele dia me encheram de esperança e orgulho, mas uma fala em particular eu recordo com carinho especial. Ele disse: 'O livro me salvou. Mas não de maneira messiânica. Não é que eu tenha lido um livro e me tornado outra pessoa. O livro salvou o meu dia. Ele salva alguns dos meus dias. Ele me salva em alguns momentos'", lembra. Na hora, o escritor tomou um susto, porque Tenório compartilhava a mesma ideia que ele tinha com a literatura. "Naquele momento, eu não fazia ideia de que o Jeferson se tornaria um dos meus melhores amigos, como de fato se tornou; mas eu entendi, na mesma hora, que não são só os livros que eventualmente nos salvam: às vezes quem nos salva é o escritor", afirma.
A poeta e escritora Lilian Rocha diz que os temas trabalhados por Tenório a atravessam de forma instigante. "É uma narrativa bastante fluida, intensa e profunda. Quando eu abro o livro não me dá mais vontade de parar de ler, e isso me aconteceu com os três livros dele. Parei apenas para dormir até acabar. Ou seja, são livros que permeiam em alguns aspectos a minha existência", diz Lilian.
O poeta Marlon Pires também tem uma experiência para contar com Tenório. Quando foi ajudar o escritor Marcelino Freire na organização da Balada Literária, em São Paulo, acabou encontrando o autor de O beijo na parede no evento. Acabaram passeando por centros culturais como a Casa das Rosas e o Itaú Cultural. "Ele me deu uma aula sobre Carolina Maria de Jesus e o Quarto de despejo. A melhor aula da vida", diz. O poeta tem um livro publicado e está fazendo um financiamento coletivo para a próxima publicação. "Ultimamente se fala muito das masculinidades pretas, afeto de homens pretos. Talvez para o Jeff tenha sido só mais uma manhã em São Paulo, mas eu senti naquela manhã afeto, cuidado e respeito com quem está começando. Vi ali uma referência e um amigo."

Cotas em destaque

Novo livro de Jeferson Tenório deverá tratar de estudantes cotistas em uma universidade

Novo livro de Jeferson Tenório deverá tratar de estudantes cotistas em uma universidade


ANDRESSA PUFAL/JC
O escritor já tem uma nova ideia de livro em que está trabalhando. "É sobre três estudantes universitários negros, um de Letras, um de História, e outro de Direito, que entram pelo sistema de cotas. Também quero contar sobre a mudança que ocorreu principalmente nos cursos de humanas, em que hoje é praticamente impossível que um professor entre em uma sala de aula e não toque em temas que a gente está tocando hoje, como discurso antirracista, falar em outros saberes", diz. No momento, Tenório está fazendo pesquisa e entrevistando cotistas. A previsão de lançamento? "Sei o que quero fazer, mas a ideia é terminar até 2023, e lançar, talvez, em 2024", finaliza.
A Lei de Cotas completa dez anos em 2022. Para Tenório ele acha muito difícil que seja vetada. "Acho que vai passar pelo Supremo, vai ter continuidade. Claro que alguns grupos vão dizer que é racismo inverso. Por isso é preciso fazer uma pressão", diz.
No final de março, Tenório sofreu ameaças de morte por uma palestra que daria em uma escola na cidade de Salvador. Eram mensagens de ódio contra ele e o livro O avesso da pele, e também pelo prêmio Jabuti que recebeu. "Muitas pessoas se sentiram encorajadas com o governo Bolsonaro, e muitas sempre foram racistas, ou fascistas. O problema é que se sentiram autorizadas a falar sobre isso", diz. A palestra acabou acontecendo em âmbito virtual.

* Rafael Gloria é jornalista, mestre em Comunicação pela Ufrgs, editor fundador do Coletivo de Jornalismo Cultural Nonada – Jornalismo Travessia e sócio da agência Riobaldo