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SUSTENTABILIDADE

- Publicada em 05 de Junho de 2019 às 03:00

Projeto reintroduz espécies nativas em áreas indígenas

Daisy e Denise são responsáveis pelos viveiros na aldeia, unindo conceitos e necessidades dos índios

Daisy e Denise são responsáveis pelos viveiros na aldeia, unindo conceitos e necessidades dos índios


LUIZA PRADO/JC
A cerca de 23 quilômetros do Centro Histórico de Porto Alegre está localizada a Aldeia da Verdade, no bairro Lomba do Pinheiro. No espaço de 15 hectares, 16 famílias de índios Guarani cultivam plantações de aipim, batata doce, melancia, amendoim e milho. Além dos alimentos, a comunidade da aldeia, também conhecida como Teko'a Anhetenguá na língua Tupi-Guarani, produz artesanato, utilizando árvores e galhos do terreno.
A cerca de 23 quilômetros do Centro Histórico de Porto Alegre está localizada a Aldeia da Verdade, no bairro Lomba do Pinheiro. No espaço de 15 hectares, 16 famílias de índios Guarani cultivam plantações de aipim, batata doce, melancia, amendoim e milho. Além dos alimentos, a comunidade da aldeia, também conhecida como Teko'a Anhetenguá na língua Tupi-Guarani, produz artesanato, utilizando árvores e galhos do terreno.
A população que se autodeclara indígena no Brasil, de acordo com a última pesquisa do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), é de 817.963 índios. Desse total, 9,2% da população está no Sul do País, sendo 32.989 índios residentes no Estado (48 terras indígenas, sendo 21 destas Guarani, de acordo com dados da Fundação Nacional do Índio - Funai).
Os Guaranis constituem a maior população indígena dos litorais do Sul e Sudeste, vivendo em cerca de cem aldeias junto à Mata Atlântica, entre os estados do Rio Grande do Sul e do Espírito Santo. 
Com o objetivo de recuperar, conservar e aumentar a biodiversidade em sete aldeias Guarani do Rio Grande do Sul, o Instituto de Estudos Culturais e Ambientais (Iecam) criou o projeto Ar, Água e Terra: Vida e Cultura Guarani.
A iniciativa visa à contribuir para o desenvolvimento etnográfico nas áreas indígenas, através de atividades como encontros, trilhas, oficinas com aldeias, viveirismo, cultivo e plantio de espécies vegetais nativas, saúde, confecção artesanal, intercâmbio entre as aldeia e educação ambiental, abrangendo práticas como reciclagem e compostagem.
Uma das metas é reintroduzir as espécies nativas nas áreas onde há índios. No total, sete aldeias participam ativamente do projeto, entretanto, por enquanto, apenas duas contam com os viveiros de mudas de árvores originárias, a Teko'a Anhetengua, em Porto Alegre, e a Teko'a Yriapu (Aldeia Som do Mar), em Palmares do Sul.
Na Capital, ele foi construído em 2007, atendendo os ritos tradicionais dos Guarani para a construção de espaços, como a definição da localização e da orientação solar de acordo com as divindades.
A arquiteta, produtora cultural e especialista em energias renováveis Daisy Wolf, 54 anos, é uma das responsáveis pela criação dos viveiros. Atualmente, o espaço na Lomba do Pinheiro, que funciona também como estufa no inverno, possui mais de três mil mudas de espécies nativas e tem o objetivo de chegar a seis mil.
Ela conta que foram utilizados alguns materiais tradicionais na construção de habitações e casas de reza, como a taquara e o capim santa fé.
Daisy afirma que o projeto do viveiro-estufa foi elaborado visando unir conceitos e necessidades apontadas pelos Guarani e melhores padrões de construção, com um sistema de captação e armazenamento da água da chuva para a irrigação, além de um espaço de compostagem ao lado do local.
"A sustentabilidade é importante neste projeto. Utilizamos tudo aquilo que sobra. Quanto mais entrosado com a natureza estiver, mais importante o espaço é para os Guarani", salienta a especialista.

Benefícios revertidos para a comunidade e o meio ambiente

Projeto os reaproximou da fauna e de espécies nativas, diz Pires

Projeto os reaproximou da fauna e de espécies nativas, diz Pires


/LUIZA PRADO/JC
José Cirilo Pires, 46 anos, é o cacique da Aldeia da Verdade há 22 anos. Segundo ele, é visível a mudança desde que o projeto Ar, Água e Terra está atuando na área em que vive: "É muito legal. Não traz benefícios apenas para nós, mas também para o meio ambiente, para os passarinhos. Estamos vendo eles mais por perto, antes não enxergávamos eles por aqui, as crianças não conheciam. É uma alegria para a gente. Esse projeto trouxe animais para nossa vista, é muita felicidade. A gente vivia no meio de pinus, agora temos outras árvores", conta.
Entre as espécies presentes no viveiro estão cerejeira, araticum, chau-chau, jabuticaba, angico branco, angico vermelho e ipê roxo. Em relação aos cuidados com as mudas destacam-se a rega, a retirada de folhas estragadas e a renovação da terra, feitas pelos cuidadores do viveiro. Para os Guarani, as plantas devem ser cuidadas como crianças.
Diretora da Iecam e coordenadora executiva do projeto, Denise Wolf, 50 anos, afirma que o Ar, Água e Terra é uma união das vontades da tribo com a dos profissionais da entidade, que buscam devolver aos indígenas aquilo que lhes foi tirado. "Junto com os saberes que os Guaranis nos trazem e as demandas deles, o que percebo é que essa interação está resultando em recuperação de áreas que já foram entregues degradadas para eles. A gente pensa na recuperação de área, mas antes de pensar nisso, pensamos em garantir a segurança alimentar deles, através de roças tradicionais, roça de alimentos para núcleos familiares ou florestas comunitárias, o que varia de acordo com cada aldeia", explica.
Além de proteger e cuidar da comunidade Guarani, uma das preocupações de Denise é a visão que a população tem deles. "Temos que tirar os indígenas desse espaço de invisibilidade que a sociedade prefere manter, vamos dar voz a eles, dar espaço a eles", comenta.
Pires, além de responsável pela Aldeia da Verdade, é cacique geral em cerca de 50 aldeias indígenas espalhadas pelo Rio Grande do Sul. Para ele, é um trabalho árduo, devido ao olhar que as pessoas têm sobre os índios. "Não é fácil, tenho responsabilidade por toda essa aldeia e outras do Estado. Tenho cuidado de responder para a sociedade como o índio vive e a cultura, como esclarecer para o branco como nós, índios, vivemos. É um peso ser cacique, porque temos que dizer para a sociedade o que é uma cultura diferente", alerta.