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Jornal da Lei

- Publicada em 07 de Agosto de 2021 às 09:42

Lei Maria da Penha: os 15 anos de uma das mais avançadas legislações relacionadas a gênero do mundo

Para Gabriela, embora a lei tenha certa magnitude, ainda é reiteradamente não cumprida

Para Gabriela, embora a lei tenha certa magnitude, ainda é reiteradamente não cumprida


FREDY VIEIRA/JC
Vinicius Alves
Considerada pelo Fundo de Desenvolvimento das Nações Unidas para a Mulher (Unifem) uma das legislações mais avançadas do mundo sobre o tema, a Lei Maria da Penha completa 15 anos neste sábado (7).
Considerada pelo Fundo de Desenvolvimento das Nações Unidas para a Mulher (Unifem) uma das legislações mais avançadas do mundo sobre o tema, a Lei Maria da Penha completa 15 anos neste sábado (7).
Além das diversas melhorias que a lei recebeu ao longo dos anos, outros dispositivos foram criados com o intuito de barrar e prevenir esse tipo de violência. Recentemente, foi sancionada a Lei 14.188/2021, que incluiu no Código Penal o crime de violência psicológica contra a mulher. Há pouco mais de seis anos, também foi incluído o feminicídio como circunstância qualificadora do crime de homicídio.
Contudo, apesar dos avanços que iniciaram com a Lei Maria da Penha, sobretudo na questão do acesso ao atendimento à mulher em situação de violência, como a criação de diferentes canais de denúncia, a violência contra a mulher ainda é um problema grave no Brasil.
Para se ter ideia, uma pesquisa do Datafolha, encomendada pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP), publicada em junho deste ano, apontou que 1 em cada 4 mulheres brasileiras (24,4%) acima de 16 anos afirmou ter sofrido algum tipo de violência (física, psicológica ou sexual) nos últimos 12 meses, durante a pandemia de Covid-19.
Na comparação com a mesma pesquisa feita em 2019, foi verificada uma leve diminuição de 3%, o que configura uma estabilidade dos números, já que o percentual ficou dentro da margem de erro da pesquisa, que é de 3 pontos.
A fim de refletir a respeito dos 15 anos de Lei Maria da Penha, o Jornal da Lei entrevistou a advogada Gabriela Souza, criadora do primeiro escritório de advocacia voltado totalmente para mulheres no Estado.
"O judiciário precisa enxergar que nesses
15 anos muito se avançou,
mas muito se resistiu à aplicação da lei."
Jornal da Lei - O que podemos entender como principal foco da Lei Maria da Penha?
Gabriela Souza - O foco da legislação é prevenir e punir toda violência doméstica, ou seja, aquela que acontece no ambiente intimo doméstico ou familiar, entendendo que a violência doméstica é uma violação dos direitos humanos.
JL - De que forma podemos avaliar a efetividade da lei no país?
Gabriela - A Lei Maria da Penha é uma das melhores leis relacionadas a gênero do mundo e conhecida por 9 a cada 10 brasileiros. Muito embora seja uma lei dessa magnitude e o País seja um dos mais violentos do mundo contra mulheres, ela é reiteradamente não cumprida, ou então, diminuída. Nós temos uma efetividade, uma positividade, mas também temos uma questão de quase negativa de cumprimento desta lei, o que preocupa bastante, principalmente diante dos números que lidamos diariamente.
JL - Quais os principais desafios para se chegar a uma efetividade ideal?
Gabriela - A lei foi revolucionária no sentido que tirou da escuridão um problema muito sério e, como disse anteriormente, é uma das 3 melhores do mundo por ser muito completa e rica. Porém, não vamos conseguir ter a plenitude de sua efetividade se não tivermos investimentos públicos e se não houver campanhas de educação. A lei tem dois pilares: o da punição, no sentido de prender o agressor, e tem outro pilar importantíssimo, que muitas vezes fica em segundo plano, que é o da prevenção, que envolve educação. Educação precisa de recurso, de verba e atenção estatal. Muitas vezes essa atenção é negada, quase que propositalmente, em virtude de uma cultura que temos ainda muito enraizada de violência contra as mulheres em nosso País.
"Temos de olhar para o lado e,
ao ver uma pessoa em situação de violência,
nos comprometermos individual e coletivamente
para que a violência doméstica termine"
JL - Ainda há falta de compreensão a respeito do que a lei aborda?
Gabriela - Precisamos ter um pouco mais de clareza e compreensão dos tipos de violência. Nessa semana, por exemplo, foi criminalizada a violência psicológica, o que é um avanço incrível, uma vez que antes constava na lei que esse tipo de violência era um tipo de violência doméstica, mas não crime. A partir de agora virou crime. Acredito que falta compreensão estatal e social de que vivemos uma epidemia de violência doméstica. Cabe a todos nós essa prevenção, uma atuação direta. Temos de olhar para o lado e, ao ver uma pessoa em situação de violência, nos comprometermos individual e coletivamente para que a violência doméstica termine. 
JL - Acredita que a Lei Maria da Penha possa ter implementado uma cultura de combate à violência contra a mulher no País?
Gabriela - Tenho certeza de que a lei implementou uma cultura de combate à violência contra a mulher, principalmente se compararmos o Brasil a países sem legislação sobre isso. Mas ainda há muito o que trabalhar. Existe uma anticultura de violência que é baseada na lógica patriarcal pela qual nossa sociedade foi construída, mas aos poucos, com muita luta e muita consciência, vamos fazendo deste lugar um lugar melhor para as mulheres.
JL - Como podemos garantir que seu entendimento chegue aos grupos mais vulneráveis de mulheres?
Gabriela - Podemos garantir falando sobre a lei, falando de educação, juntando e explicando isso, porque, conhecer a lei e seus direitos empondera. E todos os mecanismos de defesa às mulheres precisam ser intensificados na medida que, muito embora tenhamos uma das melhores leis do mundo, ainda pecamos muito na sua aplicação.
"Precisamos vencer esse mito da mulher perversa
para que elas, vítimas de violência,
consigam ser abraçadas plenamente"
JL - E de que forma pecamos na sua aplicação?
Gabriela - Por exemplo, a lei fala na aplicação de medida protetiva em 48h, ou seja, um juiz precisa analisar o pedido e decidir em 48h pelo deferimento ou indeferimento da medida. Isso não existe em diversos lugares do Brasil e, muitas vezes, acaba demorando mais de um mês para obter essa medida protetiva. Não há uniformidade na interpretação. Além disso, varas de família não analisam com a devida importância essas medidas protetivas e, muitas vezes, mandam as mulheres desistirem em beneficio da família ou para não causar tumulto num processo que discute questões familiares. O judiciário precisa enxergar que nesses 15 anos muito se avançou, mas muito se resistiu à aplicação da lei. É preciso enxergar isso para que seus profissionais possam ser capacitados e passem a entender que o acolhimento à mulher é um serviço diferenciado, que a medida protetiva é necessária, muitas vezes, pra manutenção da vida e não com uma ideia de uma “mulher perversa”, que tem como objetivo prejudicar o homem para obter vantagens. Precisamos vencer esse mito da mulher perversa para que elas, vítimas de violência, consigam ser abraçadas plenamente. 
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