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Entrevista

- Publicada em 24 de Maio de 2022 às 17:46

Para industriais, a inflação crescente é uma das grandes preocupações neste ano

Gilberto Porcello Petry explica que o setor cresceu no primeiro trimestre

Gilberto Porcello Petry explica que o setor cresceu no primeiro trimestre


LUIZA PRADO/JC
Jefferson Klein
Após o Rio Grande do Sul sofrer com uma seca que pode impactar o resultado da sua economia ao final de 2022, uma das maiores preocupações do setor indústria do Estado agora é o avanço inflacionário. O presidente da Fiergs, Gilberto Petry, alerta que há um limite para o repasse dos custos. Além disso, o dirigente ressalta que a questão reflete na elevação da taxa de juros no País.
Após o Rio Grande do Sul sofrer com uma seca que pode impactar o resultado da sua economia ao final de 2022, uma das maiores preocupações do setor indústria do Estado agora é o avanço inflacionário. O presidente da Fiergs, Gilberto Petry, alerta que há um limite para o repasse dos custos. Além disso, o dirigente ressalta que a questão reflete na elevação da taxa de juros no País.
Jornal do Comércio - A questão inflacionária preocupa a indústria?
Gilberto Petry - Sim, é uma das grandes preocupações e por vários motivos. A indústria tem um limite para repassar preços, esse limite é dado pela estrutura do mercado de cada produto e pelas condições do consumidor. Em alguns casos, a produção começa a ser afetada, pois o produtor já observa uma queda na demanda. Em outros casos, o produtor analisa os seus custos e percebe que o mercado só vai absorver o seu produto se a oferta for num preço que representa prejuízo para a operação. Outra face desse quadro inflacionário é o aumento da taxa de juros. O Banco Central ajusta a Selic para segurar a economia e assim conter o descasamento entre a oferta e a demanda. Entretanto, isso representa um brutal aumento no custo de capital. Imagine aquelas empresas que tomaram o Pronampe (Programa Nacional de Apoio às Microempresas e Empresas de Pequeno Porte) em 2021 à taxa de 6% ao ano mais a Selic. Em maio do ano passado, a Selic estava 3,50%, agora está em 12,75%, certamente isso gera uma grande preocupação.
JC - A seca que assolou o Rio Grande do Sul no começo do ano pode comprometer o resultado da economia gaúcha em 2022?
Petry - A expectativa de perda da produção agrícola no Rio Grande do Sul é muito grande, acompanhamos as estimativas da Emater para a produção agrícola e já se observa uma queda superior a 40% na safra de grãos em comparação com a safra passada. Assim, temos a expectativa de uma queda no PIB do Estado por conta dessa estiagem. Do ponto de vista da indústria, nossa maior preocupação está na agroindústria, aquela que utiliza grãos para a produção animal e de alimentos. Esse setor enfrenta pressões grandes pelo lado dos custos e pelo encolhimento na demanda, são indústrias que trabalham com margens mais baixas e que são compensadas pelo elevado volume. Quando o volume diminui pela menor oferta de insumos, em um ambiente em que o repasse de preços é muito difícil, temos chance de uma crise.
JC - Como o senhor avalia o desempenho da indústria gaúcha neste primeiro semestre?
Petry - A indústria cresceu no primeiro trimestre, mas o que estamos observando é uma desaceleração desse ritmo de crescimento. Em março, o nosso Indicador de Desempenho Industrial, por exemplo, apontou que o setor avançou apenas 0,2% em relação a fevereiro. Esse desempenho tem refletido um cenário que começa a inflexionar. Estamos lidando com insumos mais caros e o custo de capital também cresceu muito com o avanço da Selic. Aquelas indústrias que tiveram que se endividar ou que fizeram investimentos começam a sentir o maior peso dos custos financeiros. Tudo isso está ocorrendo em um ambiente em que a demanda está em desaceleração e existe uma incerteza muito grande sobre qual será o custo para as economias trazerem de volta a taxa de inflação para níveis aceitáveis.
JC - O que se pode esperar para o setor industrial do Rio Grande do Sul para a segunda metade do ano?
Petry - No geral, esperamos que a indústria enfrente muitos ventos contrários. No segundo semestre a economia do País entra em compasso de espera por conta da incerteza do cenário eleitoral. Não é algo que achamos positivo, mas que já experimentamos em outras ocasiões.
JC - A indústria gaúcha está sofrendo com a escassez de insumos? Quais segmentos mais afetados?
Petry - Ainda temos um elevado número de indústrias sofrendo com os problemas nas cadeias de suprimentos. Os segmentos mais afetados são aqueles que dependem de componentes importados, tanto pela previsibilidade de prazos que continua baixa, quanto pelo elevado custo logístico. Por exemplo, a pesquisa Sondagem Industrial que fizemos no final de março e publicamos em abril, mostrou que a falta ou o alto custo das matérias-primas, consequência das restrições nas cadeias de suprimento, manteve-se, no primeiro trimestre de 2022, como o maior problema enfrentado pela indústria gaúcha pelo sétimo trimestre consecutivo. Porém, o percentual de indústrias que apontaram esse problema caiu de 67,3% para 60,5%.
JC - A alta dos custos dos insumos na cadeia industrial ainda é um problema para o setor? Até quando essa dificuldade deve durar?
Petry - A alta continua sendo um problema, na medida em que os custos médios de produção continuam aumentando. O relato mais comum entre os industriais é: "não conseguimos comprar duas vezes a matéria-prima pelo mesmo preço. A cada nova compra os preços estão mais elevados." Até quando esse problema deve perdurar é uma pergunta que não sabemos responder. A resposta depende muito do tipo de produto que estamos tratando. A dinâmica esperada para a normalização no mercado de semicondutores é diferente daquela das resinas termoplásticas. No início de 2022 tínhamos a expectativa de preços mais estáveis, entretanto a guerra na Ucrânia mudou todo o cenário.
JC - O Rio Grande do Sul enfrenta hoje uma limitação da oferta de gás natural, como isso impacta a indústria? O que pode ser feito?
Petry - Existem algumas recomendações importantes para ajudar a solucionar essa questão, como destravar a venda da Transportadora Brasileira Gasoduto Bolívia-Brasil, o Gasbol, e garantir a instalação de compressores no gasoduto na Região Sul, para manter minimamente a pressão e ampliar a capacidade de transporte no curto espaço de tempo. Além disso, é necessário assegurar investimentos estruturais para ampliação da capacidade do Gasbol, permitindo definitivamente a expansão da oferta, e destravar a agenda regulatória da ANP (Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis).
JC - Há outras medidas que podem ser tomadas para aprimorar o mercado local de gás?
Petry - Convém ressaltar a necessidade de tornar mais ágil o cronograma de execução do Termo de Cessação de Condutas do Cade (que prevê a venda de ativos da Petrobras para quebrar o monopólio exercido pela petroleira nacional) e de se buscar uma solução junto a Aneel (Agência Nacional de Energia Elétrica) para a autorizar o Grupo Cobra a assumir o empreendimento termelétrico Rio Grande, ou que se encontre uma solução administrativa que viabilize a construção do complexo (que é associado à implantação de um terminal de gás natural liquefeito). Também é importante, aqui no Estado, acelerar a publicação de resolução da Agergs que trata da regulação do mercado livre de gás natural e cadastro de comercializadores no Rio Grande do Sul.
JC - O que a Fiergs espera dos dirigentes que serão eleitos como presidente e governador nas próximas eleições?
Petry - Passado esse momento de pandemia, que foi muito particular, esperamos que os eleitos voltem a pensar em uma agenda de longo prazo, e sabemos que para essa agenda ter sucesso ela precisa incluir uma política industrial. Uma das mudanças estruturais que a pandemia tem provocado nos países é um olhar mais atento para o importante papel da indústria na economia. No nosso caso, olhando especificamente para o Brasil e Rio Grande do Sul, a boa e a má notícia é que grande parte dos desafios permanecem os mesmos. Assim, o diagnóstico nós já temos. A indústria sofre de uma carga tributária extremamente complexa e que é focada na tributação de bens. Temos todas as distorções possíveis no nosso sistema tributário, tais como: cumulatividade de impostos, não neutralidade e a oneração de exportações.
JC - A guerra entre Rússia e Ucrânia teve algum impacto? Qual?
Petry - Os impactos ocorreram, inicialmente, por meio de uma expectativa de aumento nos preços de insumos e matérias-primas. A perspectiva para esse ano era de uma normalização nas cadeias de produção e um reestabelecimento na oferta de peças e componentes importados. Tanto a guerra na Europa, quanto a volta do lockdown na China, frustraram essa expectativa. Nesse sentido, as indústrias sentiram o aumento no preço dos derivados de petróleo e do aço, bem como no custo do frete.
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