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Direito Trabalhista

- Publicada em 23 de Março de 2020 às 20:25

Covid-19 massifica home office no Brasil

Reforma trabalhista de 2017 regulamentou o teletrabalho no País

Reforma trabalhista de 2017 regulamentou o teletrabalho no País


MARCO QUINTANA/JC
A pandemia do novo coronavírus (Covid-19) provocou mudança em uma série de hábitos dos brasileiros, tais como cuidados com higiene, compras de supermercado e, é claro, as relações de trabalho. Desde o crescimento de casos confirmados no Brasil, o trabalho remoto - ou home office - passou a fazer parte da realidade de um número cada vez maior de empresas. Ainda que essa seja uma situação excepcional, a regulamentação do teletrabalho garantida pela última reforma trabalhista (Lei nº 13.467/2017) facilitou o processo de transição durante este momento.
A pandemia do novo coronavírus (Covid-19) provocou mudança em uma série de hábitos dos brasileiros, tais como cuidados com higiene, compras de supermercado e, é claro, as relações de trabalho. Desde o crescimento de casos confirmados no Brasil, o trabalho remoto - ou home office - passou a fazer parte da realidade de um número cada vez maior de empresas. Ainda que essa seja uma situação excepcional, a regulamentação do teletrabalho garantida pela última reforma trabalhista (Lei nº 13.467/2017) facilitou o processo de transição durante este momento.
Alguns aspectos, como a jornada de trabalho, não geram dúvidas. Os horários, em princípio, não sofrem alterações. "Considerando que a alteração da modalidade de trabalho presencial para o remoto é transitória, decorrente dessa situação atípica e emergencial, a presunção é de que o empregado seguirá a mesma jornada de trabalho presencial", explica a advogada especialista em Direito do Trabalho e membra da Associação dos Advogados Trabalhistas de Empresas do Rio Grande do Sul (Satergs-RS) Cecília Vianna.
É importante salientar, também, que a reforma trabalhista não regulamenta o sistema de horas extras para o home office, mas, para a advogada, essa questão pode ser negociada. "Contudo, se, na prática, houver efetivo controle sobre os horários realizados, o regime poderá ser descaracterizado, gerando direito às horas extras", ressalta.
Outros aspectos, como o fornecimento dos equipamentos de trabalho, entram para o campo da subjetividade. "Especialmente nessa situação transitória, é imprescindível que o empregador forneça os meios necessários à execução das atividades - tais como notebook, acesso à internet e aparelho de celular, por exemplo - e arque com as respectivas despesas", defende Cecília. Embora essa seja a opinião de muitos profissionais da área, nem todas as empresas conseguem atender a essa norma. Por isso, é importante que o empregador negocie com o empregado.
Mas, antes de existir a negociação quanto aos materiais de trabalho, deve haver um acordo quanto ao novo formato. Segundo o artigo 75-C da Consolidação de Leis de Trabalho (CLT), o home office só pode ser estabelecido mediante acordo mútuo entre ambas as partes da relação trabalhista. O advogado especialista em Direito Coletivo do Trabalho Flávio Obino Filho atenta, também, para a necessidade de formalizar um aditivo contratual para definir o início da prestação de serviços pelo modelo do teletrabalho.
"O documento deve prever a responsabilidade pela aquisição, manutenção ou fornecimento dos equipamentos tecnológicos e da infraestrutura necessária e adequada à prestação do trabalho remoto, e, também, o eventual reembolso de despesas suportadas pelo empregado", complementa Obino Filho.
Por outro lado, Cecília reconhece que, mesmo que o aditivo contratual e o consenso mútuo sejam exigidos por lei, a pandemia traz certa flexibilização para essa legislação. "Diante da situação atípica em que estamos vivendo, as duas exigências são relativizadas, seja pela urgência, seja pela preservação de bem maior, que é a saúde coletiva."
Para o advogado especialista em Direito do Trabalho e com atuação em negociação coletiva Stephan Eduard Schneebeli, não há necessidade de alteração de cláusulas contratuais, tendo em vista que é uma situação provisória. "Em um primeiro momento, essas mudanças que estão sendo feitas agora só podem ocorrer se não forem prejudiciais ao trabalhador. Por exemplo, reduzir a jornada de trabalho sem reduzir o salário", explica.

Organizações experienciam teletrabalho pela primeira vez

Se adaptar ao home office não tem sido tarefa difícil, tendo em vista que, nos últimos anos, a prática se popularizou. É o caso do escritório de advocacia Sampaio Ferraz Advogados. Embora todos os funcionários já tenham feito home office, é a primeira vez que o escritório trabalha dessa maneira em coletividade. "A maioria dos advogados e do setor de administração já usava um sistema implementado em 2017. O escritório utiliza um sistema de arquivos na nuvem. Então, com o laptop da empresa, eles conseguem trabalhar normalmente", contextualiza o sócio Bruno Furiati.
Para a Coliseu, imobiliária com mais de 40 anos de atuação, a experiência foi novidade. Segundo o diretor de Novos Negócios, Sérgio Canarim, a empresa já utilizava a internet como aliada há um bom tempo, mas esta é a primeira vez que todos fazem home office. "Temos dez funcionários, e, por enquanto, o pessoal não teve dificuldades. A jornada e o formato de trabalho seguem os mesmos. Nos comunicamos com a equipe e com os clientes por aplicativo de mensagens, e isso reduziu o contato", explica.
Pensando nos obstáculos, diversas empresas elaboraram soluções. A Assinaturasgratis.com é uma plataforma criada pela lawtech Contraktor para assinatura de contratos on-line totalmente gratuita. A ferramenta existe desde o ano passado, mas, com o surto do coronavírus, a procura aumentou. No dia 15 de março, o pico diário da plataforma foi de seis usuários. No dia seguinte, 230. Além disso, a Google liberou gratuitamente a ferramenta Hangouts Meet, um recurso exclusivo da plataforma de videoconferências Hangout, para que empresas com grandes demandas de comunicação consigam fazer o home office tranquilamente.

Preocupações do Direito do Trabalho não se resumem a realizar tarefas de casa

A reclusão devido a Covid-19 não tende a afetar as relações de trabalho apenas no que se refere ao local físico. De acordo com o vice-presidente do Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região (TRT-4), desembargador Francisco Rossal de Araújo, a crise do coronavírus pode causar uma série de problemas a curto, médio e longo prazos. "O teletrabalho é apenas uma face disso, até porque muitos trabalhadores não conseguem fazer teletrabalho. Mas já existem categorias anunciando suspensão de contratos de trabalho, despedidas em massa, redução de carga horária dos funcionários, e isso pode ser um problema."
O desembargador se preocupa, também, com os trabalhadores que não fazem parte de categorias organizadas e que, no atual cenário, não serão protegidos. "Nesse caso, outros tipos de medidas terão que ser tomadas, como, por exemplo, a ampliação do conceito de Bolsa Família, a ampliação de ajuste e de parcelamento de dívida, a postergação de pagamento de impostos. Tudo começa pela relação trabalhista que vai parando e afetando as pessoas, as questões econômicas passam pelas questões trabalhistas", defende.
"Muita coisa vai mudar. As coisas vão ser divididas em antes e depois do coronavírus", brinca Schneebeli. Para ele, a pandemia vai ser responsável por mudar muitos aspectos das relações trabalhistas à medida que os empresários sintam necessidade de se adaptar a novas formas de trabalho e, assim, percebam que elas são mais baratas, por exemplo. Portanto, além da necessidade de proteção à saúde, surge a necessidade da proteção às relações de trabalho.