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Economia

- Publicada em 16 de Agosto de 2021 às 12:11

Times de futebol podem se transformar em clube-empresa

Caprara alerta para a necessidade de gestão profissionalizada a quem adotar o novo regime

Caprara alerta para a necessidade de gestão profissionalizada a quem adotar o novo regime


Medeiros, Santos &Caprara Advogados/divulgação/jc
Agora é oficial. Os grandes times do Brasil podem passar de associações sem fim lucrativo à Sociedade Anônima de Futebol. O presidente Jair Bolsonaro sancionou, com vetos, o Projeto de Lei nº 5.516/2019 do senador Rodrigo Pacheco (DEM-MG). Publicada no Diário Oficial do dia 9 de agosto, a Lei 14.193/2021 permitirá aos clubes que recebam recursos financeiros de pessoas físicas, jurídicas e de fundos de investimento, pedir recuperação judicial e negociar as dívidas por meio do Poder Judiciário, além de levantar recursos por meio de emissão de debêntures, de ações ou de investidores.
Agora é oficial. Os grandes times do Brasil podem passar de associações sem fim lucrativo à Sociedade Anônima de Futebol. O presidente Jair Bolsonaro sancionou, com vetos, o Projeto de Lei nº 5.516/2019 do senador Rodrigo Pacheco (DEM-MG). Publicada no Diário Oficial do dia 9 de agosto, a Lei 14.193/2021 permitirá aos clubes que recebam recursos financeiros de pessoas físicas, jurídicas e de fundos de investimento, pedir recuperação judicial e negociar as dívidas por meio do Poder Judiciário, além de levantar recursos por meio de emissão de debêntures, de ações ou de investidores.
Um dos títulos que poderão ser emitidos são as debêntures-fut, com prazo mínimo de dois anos de vencimento e remuneração mínima igual à da poupança, permitindo-se remuneração variável vinculada às atividades da sociedade. A nova lei prevê regras de parcelamento de dívidas, além de permitir que as obrigações civis sejam separadas das trabalhistas, sem repassá-las a essa nova empresa que será criada com as novas regras.
A Sociedade Anônima do Futebol também pode ser criada a partir da separação do departamento de futebol do clube ou pessoa jurídica original ou ainda por iniciativa de pessoa natural ou jurídica ou de fundo de investimento. O clube-empresa terá como objetivo formar atletas profissionais e obter receitas com a negociação dos direitos esportivos dos jogadores, além de permitir a exploração econômica de ativos, inclusive imobiliários.
Aos clubes que decidirem se tornar Sociedade Anônima de Futebol, o advogado Guilherme Caprara, advogado, especialista em Direito Tributário, Financeiro e Econômico, sócio do escritório Medeiros, Santos & Caprara Advogados, diz que será necessária a adoção de uma gestão profissionalizada. Em entrevista ao Jornal do Comércio, o especialista alerta também para o cuidado com outras responsabilidades que passam desde uma reorganização administrativa, de recursos humanos, econômica e financeira até aspectos tributários que irão recair sobre a atividade empresarial.
Jornal do Comércio – Na prática, o que muda para os clubes de futebol que se tornam empresas?
Guilherme Caprara – A Sociedade Anônima do Futebol (SAF) nada mais é do que um modelo de sociedade anônima, que permitirá aos clubes de futebol que aderirem ao novo regime uma série de ferramentas e instrumentos legais que não se aplicam às associações sem fins lucrativos. Com a nova modalidade, os times que se transformarem em clube-empresa poderão se valer da emissão de títulos, debêntures e ações, se sujeitar aos regimes de insolvência previstos no ordenamento jurídico brasileiro (pedir recuperação judicial, extrajudicial e/ou falência), além de captar recursos de investidores (pessoas físicas, jurídicas ou fundos de investimento). A nova Lei 14.193/2021 ainda traz a figura do Regime Centralizado de Execuções. É uma espécie de concurso de credores, em que será possibilitado aos clubes-empresas o pagamento das dívidas trabalhistas e cíveis em um prazo de até seis anos (prorrogável por mais quatro anos) o que é uma excelente alternativa, visto que o procedimento será todo mediado e centralizado em um único juízo, podendo conduzir de forma harmônica os interesses do devedor e dos seus credores.
JC– Atualmente, a maioria dos times são associações sem fins lucrativos. Quais cuidados devem observar ao decidirem se tornar Sociedade Anônima do Futebol?
Caprara – O clube de futebol, a partir da transformação para a figura da Sociedade Anônima do Futebol – SAF, estará sujeito, praticamente, ao regime jurídico geral destinado às sociedades empresárias. Isso exigirá dos clubes não somente uma gestão profissionalizada (o que é uma premissa de sucesso dos grandes times mundo afora), mas também outras responsabilidades que passam, desde uma reorganização administrativa, de recursos humanos, econômica e financeira, além dos aspectos tributários que irão recair sobre a atividade empresarial. Ainda estarão sujeitos às regras do direito de insolvência brasileiro (tanto a recuperação judicial quanto à falência) previstas na Lei 11.101/05. Obrigatoriamente, terão um conselho fiscal e de administração permanentes.
JC – A mudança permitirá aos clubes receberem recursos financeiros de pessoas físicas, jurídicas e fundos de investimento. De que forma isso será possível e quais cuidados precisam ser observados?
Caprara – Evidentemente que para um clube empresa (SAF) receber recursos de investidores (sejam pessoas físicas, jurídicas ou fundos de investimento), será necessária uma preparação em termos de governança empresarial que conceda a segurança jurídica necessária para essas complexas operações. Adequações à Lei Geral de Proteção de Dados e às normas de compliance também serão fatores preponderantes para atrair investidores aos clubes- empresa. Ainda será necessário se adequar às regras da Comissão de Valores Mobiliários (CVM), que costumam exigir muito das sociedades que tenham algum tipo de transação mobiliária.
JC – O texto aprovado permitirá, primeiramente, ao clube ou pessoa jurídica original efetuar o pagamento das obrigações aos seus credores por meio da recuperação judicial ou extrajudicial. Grandes times, como o Cruzeiro, buscam formas de sanar o rombo no fluxo de caixa. A nova lei poderá ser uma saída? De que forma?
Caprara – Sem dúvida, estamos diante de uma excelente oportunidade para a tão sonhada profissionalização dos clubes de futebol no Brasil. Um negócio que movimenta bilhões de reais por ano não pode prescindir de uma gestão eficiente, economicamente comprometida e que gere benefícios à atividade e à sociedade. A lei vem para propiciar uma revolução nas entidades futebolísticas nacionais. Com uma gestão profissionalizada, séria, comprometida e racionalizada, os clubes de futebol no Brasil podem se tornar potências internacionais, a exemplo dos grandes times da Europa que já aderiram a este regime empresarial. Os meios de reestruturação de dívidas, como a recuperação judicial, a extrajudicial e até mesmo o Regime Centralizado de Execuções (figura criada pela Lei das SAFs, que visa a unificação do concurso de credores), são ferramentas que poderão ser utilizadas pelos clubes-empresas a partir da transformação e adoção do novo modelo de negócio.
JC – Quais são os prejuízos para os times que adotarem o status de clube-empresa e não estiverem preparados para isso?
Caprara – Ao mesmo tempo que a lei traz possibilidades e oportunidades de profissionalização e reorganização dos clubes brasileiros, ela também, consequentemente (como toda ação e reação), enceta maiores responsabilidades não somente para os gestores, mas também para os próprios clubes de futebol. Exemplos dessas obrigações são os encargos tributários que antes eram mitigados (e até exonerados) por força da filantropia e da figura das instituições sem fins lucrativos; os consectários do direito de insolvência (convolação da recuperação judicial em falência, na hipótese de rejeição do plano de recuperação empresarial); a maior rigidez das regras de governança corporativa e compliance, a fim de atrair e manter investidores e, ainda, poderá haver a responsabilidade dos próprios administradores por atos praticados contrariamente à lei ou ao estatuto da sociedade, dentre outras.
JC – A decisão de um time se tornar clube-empresa tem que tipos de impacto para os torcedores?
Caprara – Do ponto de vista do torcedor, zero impacto negativo. Só posso contabilizar efeitos positivos para a torcida. Um clube que, antes era gerido ao bel-prazer da sua direção (muitas delas que até mesmo se perpetuam no poder), terá que prestar contas não somente aos seus associados, mas também a toda a sociedade (Fazenda Pública, CVM, investidores etc.). Grandes responsabilidades criam novas oportunidades. A transparência e a profissionalização dos times de futebol, a partir da adesão ao regime do clube-empresa, podem trazer benefícios que extrapolam a esfera empresarial, mas também a adesão de novos sócios e associados, que terão a possibilidade de acompanhar os números e resultados do seu time dentro e fora de campo. Além disso, a lei mitiga, porquanto atribui um "superpoder" ao clube, na qualidade de acionista classe A, os riscos de troca de cor do uniforme, estádio, emblemas e símbolos, por exemplo, que são identidades dos clubes e a paixão do torcedor.
JC – A medida pode ser vantajosa para qualquer time de futebol, independentemente do porte?
Caprara – Isso varia. A análise para a transformação de um time de futebol para o clube-empresa deve ser a partir de um trabalho muito bem desenvolvido. Um planejamento prévio bem realizado, com critérios técnicos, poderá chegar em um diagnóstico que indique (ou não) a adesão ao novo regime empresarial. E isso só será possível com o auxílio de profissionais (advisers, advogados, contadores, economistas, administradores etc.) e consultorias multiprofissionais especializadas neste tipo de trabalho.
JC – Foram vetados pelo presidente Jair Bolsonaro os dispositivos do projeto de lei que implicavam renúncia de receita por parte da União, por violarem a Lei de Responsabilidade Fiscal e a Lei de Diretrizes Orçamentárias. De que forma a decisão repercute para os clubes e para a União?
Caprara – Ao sancionar a lei da SAF, o Presidente da República vetou o regime especial de tributação previsto no Projeto de Lei aprovado pelo Congresso. Na prática, os clubes que se transformarem em Sociedade Anônima do Futebol deverão pagar os mesmos impostos que empresas comuns. Considerando que hoje a maioria dos clubes estão sob o formato de associações sem fins lucrativos (que gozam de isenções tributárias, parciais e até totais), o risco é o de que as instituições esportivas deixem de se transformar para o formato empresarial, justamente por causa da alta carga tributária que passarão a recolher. Além do mais, isso poderia gerar um desequilíbrio nas competições, haja vista que o regime da Sociedade Anônima do Futebol é facultativo, e que continuariam a ser disputadas entre associações e empresas. A justificativa da União para vetar os trechos referentes ao regime especial tributário foi pragmática: segundo o Ministério da Economia, o regime especial acarretaria em renúncia de receita, sem o cancelamento equivalente de outra despesa obrigatória e sem que estivesse acompanhada de estimativa do seu impacto orçamentário e financeiro, o que poderia ser sanado legislativamente pelo Palácio do Planalto.
JC – O clube-empresa também terá como objetivo formar atletas profissionais e obter receitas com a negociação dos direitos esportivos dos jogadores, além de permitir a exploração econômica de ativos, inclusive imobiliários. De que forma isso será possível? Que tipos de risco devem ser observados nessas negociações?
Caprara – A alienação, oneração, cessão ou qualquer disposição de bens e direitos (mobiliários e imobiliários), inclusive direitos de propriedade intelectual poderão abranger a reestruturação societária e empresarial do clube-empresa. Isso engloba, evidentemente, direitos econômicos sobre jogadores e também sobre a marca dos times de futebol. Isso se dá a partir desta “empresarialização” ou profissionalização do time de futebol, que passará a ser regido pelas regras gerais de direito empresarial do país. E, como tal, poderá recorrer a qualquer negócio jurídico permitido às demais empresas que exploram as mais diversas atividades empresariais. O clube será uma empresa stricto sensu. Eventuais riscos se encontram em qualquer tipo de negócio do nosso dia a dia. São inerentes à vida e, principalmente, à atividade empresarial. Para o sucesso da transformação é indispensável, como adiantei anteriormente, uma gestão extremamente profissionalizada e que encete segurança jurídica a todos os players envolvidos na profissionalização do futebol (clube-empresa, diretoria, gestores, jogadores, torcida, investidores etc.).
JC – De que forma os investidores são envolvidos no processo e quais cuidados devem observar?
Caprara – As cautelas gerais para qualquer tipo de operação de investimento. Uma governança corporativa forte, transparência, o atendimento de regras claras de compliance são exemplos de cuidados que os investidores poderão adotar antes de aportar recursos nas novas Sociedades Anônimas de Futebol.
JC – Os clubes deverão ter equipe especializada para tratar das mudanças? Qual o papel dos contadores e advogados no processo?
Caprara – É fundamental. O sucesso de um processo de transformação societária (de instituição/associação sem fins lucrativos para uma Sociedade Anônima do Futebol – SAF) está intimamente atrelado à realização de um planejamento prévio bem definido. A partir do trabalho de consultorias e de profissionais especializados (advisers, advogados, contadores, economistas, administradores etc.), pode ser um fator preponderante para a mitigação dos riscos durante o procedimento de transformação.
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