Um enorme número de mortes em decorrência da pandemia de coronavírus, apesar de robustos aportes feitos para mitigar os impactos da doença se comparado com outros países emergentes, é uma evidência que o Brasil se equivocou na estratégia político-econômica adotada durante a crise da Covid-19, aponta a consultora econômica Zeina Latif. Esse cenário, segundo ela, abriu espaço para o crescimento da inflação no País.
“A gente gastou bastante e ao mesmo tempo não colheu os frutos”, critica a ex-economista-chefe da XP Investimentos, que foi a palestrante do evento BRDE Cenários, realizado de forma online nesta quarta-feira (4). Para Zeina, ficou claro que houve falhas do governo federal em coordenar ações mais efetivas quanto ao direcionamento e uso dos recursos públicos durante a pandemia. O auxílio emergencial, cita como exemplo, gera um bem-estar na economia de efeito rápido, porém de fôlego curto, que não sustenta o crescimento de longo prazo. “E fica a fatura para pagar a conta mais adiante”, ressalta.
A consultora defende que é essencial ter cuidado com a disciplina fiscal. Ela adverte que o Brasil registra uma pressão inflacionária (expectativa na casa de 7% para este ano, sendo que a meta, estipulada pelo Conselho Monetário Nacional, é de 3,75%) que destoa do mundo e o Banco Central está sendo forçado a subir juros para contê-la. Zeina acrescenta que não se pode descartar a hipótese que a taxa Selic chegue aos dois dígitos (acima 10%), apesar de que atualmente esse não seja o panorama mais provável. “O quadro inflacionário mostra que erramos a dosagem da política econômica”, enfatiza. A economista comenta que a situação começou a ser percebida a partir de meados do ano passado. Ela alerta que uma inflação mais alta tende a ser “teimosa”, ou seja, mais duradoura, pois estimula setores formadores de preços a repassar custos.
Ainda quanto à pandemia, a consultora destaca que muitas empresas de maior porte, devido ao coronavírus, acabaram antecipando seus planos de modernização e digitalização de processos. No entanto, algumas companhias não possuem recursos para tomar essa medida e poderão não sobreviver mesmo no período pós-vacinação. A economista admite que não será possível salvar todas essas empresas e o importante é focar os auxílios públicos para os grupos que “valem a pena”, como os que não terão uma empresa substituta para cumprir o seu papel e precisam captar os recursos dessa maneira (sem a possibilidade de consegui-los no mercado).
Zeina também diz que é preciso apoiar a qualificação da mão de obra, já que a pandemia fez aumentar o nível de desemprego no País. Outro gargalo a ser solucionado é na área de infraestrutura. A consultora salienta a questão da energia e afirma que não é apenas a crise hídrica no Brasil que gera essa atual insegurança quanto ao abastecimento elétrico. De acordo com ela, é preciso aumentar os investimentos nesse segmento e para isso são necessárias regras claras e com previsibilidade, sem mudanças feitas de forma frequente.