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Economia

- Publicada em 12 de Outubro de 2020 às 16:00

Estudo alerta para déficit de indústria high-tech no Rio Grande do Sul

Morem aponta que a indústria de transformação gaúcha é predominantemente low-tech

Morem aponta que a indústria de transformação gaúcha é predominantemente low-tech


RODRIGO MOREM/ARQUIVO PESSOAL/DIVULGAÇÃO/JC
Patrícia Comunello
A indústria gaúcha tem baixa intensidade tecnológica e o período de recessão recente acabou atingindo em cheio também segmentos que são carro-chefe high-tech na atividade do Rio Grande do Sul. O diagnóstico está em um dos estudos mais profundos, em matéria de indicadores, que mapeou onde estão o comportamento dos segmentos que tem maior desenvolvimento tecnológico.
A indústria gaúcha tem baixa intensidade tecnológica e o período de recessão recente acabou atingindo em cheio também segmentos que são carro-chefe high-tech na atividade do Rio Grande do Sul. O diagnóstico está em um dos estudos mais profundos, em matéria de indicadores, que mapeou onde estão o comportamento dos segmentos que tem maior desenvolvimento tecnológico.
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O pesquisador responsável pela Radiografia da indústria High-tech do Rio Grande do Sul, Rodrigo Morem, pesquisador do Departamento de Economia e Estatística (DEE) da Secretaria de Planejamento, Governança e Gestão (SPGG), pontuou os déficits de desenvolvimento na área, o vazio da alta tecnologia na Metade Sul e ainda a demanda de recursos humanos. Na apresentação da radiografia na sexta-feira passada (9), o titular da pasta de SPGG, Cláudio Gastal, destacou que o estudo permite conhecer dados para fazer a politica na área. 
Uma das explicações para uma menor diversificação high-tech é que há uma dependência tecnológica vinda de cadeias como a automotiva e de máquinas agrícolas, cujos investimentos são definidos pelas sedes e há muitas subsidiárias no Brasil. A preocupação, adverte Morem, é com a capacidade local de responder a demandas associadas ao envelhecimento da população, avanços tecnológicos acelerados e até a mudanças climáticas.
O secretário estadual de Inovação, Ciência e Tecnologia, Luís Lamb, aposta em programas e editais para elevar investimentos e incentivos para incrementar a intensidade, incluindo ações na pandemia, além de ampliar ações de formação de recursos humanos voltados à área. A Fapergs lançou o Doutor Empreendedor. Para piorar o quadro, o governo federal anunciou que vai levar adiante a ideia de extinguir a Ceitec, primeira fábrica de semicondutores do Brasil e que fica em Porto Alegre.
Confira na entrevista, mais detalhes do diagnóstico:
Jornal do Comércio - O que o estudo mostra?
Rodrigo Morem - A pesquisa abordou um recorte específico de setores da indústria de transformação gaúcha, que são aqueles considerados de “alta” e de “média-alta” intensidade tecnológica, qualificados, então, como high-techs. O objetivo foi investigar a importância desses setores e seu desempenho no período 2007-2017, juntamente com o do agregado da indústria de transformação, indicando algumas de suas implicações para o desenvolvimento economia gaúcha a mais longo prazo.
JC - Como é medida e o que traduz a intensidade tecnológica?
Morem - Essa segmentação de setores high-tech e low-tech baseia-se na Taxonomia de Intensidade Tecnológica criada pela Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico (OCDE). Essa classificação dos setores é elaborada a partir da análise do dispêndio das empresas em pesquisa e desenvolvimento (P&D) de tecnologias, relativo a alguma medida de seus recursos próprios (receita líquida de vendas ou valor adicionado na produção). Assim, a intensidade tecnológica mede o quanto cada setor industrial, em média, se esforça para investir na realização de atividades de P&D para desenvolver inovações. Com base nesse critério, os setores da indústria de transformação são comparados e segmentados estatisticamente em quatro grupos: “Alta”, “Média-Alta”, “Média-Baixa” e “Baixa”. Os dois dois primeiros são os high-techs.
JC - O que é o Valor de Transformação Industrial (VTI) e o que descreve sobre o nível de tecnologia?
Morem - O VTI é um indicador calculado pelo IBGE. É medido pela diferença entre o Valor Bruto da Produção Industrial (VBPI). É o valor total das vendas de produtos industriais fabricados e de serviços industriais prestados, ajustado pela variação de estoques, e o Custo das Operações Industriais (COI) (compras de insumos, energia, água, etc.). Assim, o VTI mede o quanto cada setor industrial em particular gera de valor (valor adicionado) em seu processo de produção. O seu valor está relacionado com a complexidade e a sofisticação das tecnologias empregadas e com o nível de qualificação e de remuneração da força de trabalho.
JC - O RS é low, medium ou high tech?
Morem - A indústria de transformação gaúcha é composta predominantemente por setores low-tech. Em 2017, esses setores foram responsáveis por 69,5% do VTI e por 78,1% do pessoal ocupado na indústria gaúcha.
JC - Quem se saiu bem no intervalo de 2014 a 2017?
Morem - O intervalo 2014-2017 abrange o período de crise da economia brasileira, cuja substancial queda na demanda impactou fortemente o desempenho dos setores da indústria de transformação. Poucos setores industriais apresentaram bom desempenho. A pesquisa teve foco principalmente nos setores high-tech e não analisou individualmente todos os low-tech. Considerou apenas aqueles low-tech dentre os oito setores industriais de maior peso em termos de participação no VTI da indústria de transformação. Nesse conjunto, de 2013 para 2017, o refino de petróleo e biocombustíveis (110,7%) e a fabricação de alimentos (13%) tiveram desempenhos positivos em VTI.
JC - E quem não se saiu bem?
Morem - A maior parte dos setores industriais não se saiu bem. Além da crise da economia brasileira, a Argentina, principal comprador de produtos manufaturados gaúchos, também esteve em crise no período 2014-2017. Dentre os setores que foram analisados na pesquisa, tiveram desempenho negativo, com as maiores quedas em VTI no período de 2013 para 2017, o automotivo (-49%), de máquinas e equipamentos (-31,8%) e a fabricação de produtos de metal (-28,4%), cujas retrações ficaram acima da média da indústria de transformação do RS (-15,7%).
JC - O estudo apontou que fomos bem na produção de alimentos mas nada bem em alta tecnologia - por que os dois não somam?
Morem - Na realidade, o crescimento na fabricação de alimentos ou na agropecuária gerou, sim, uma demanda positiva para os produtos de setores high-tech, especialmente nos casos da indústria química (conservantes, defensivos agrícolas, embalagens plásticas (compra indireta de resinas plásticas da química) e outras. No período de 2013 para 2017, a queda no VTI da indústria química (-4,8%) foi menos intensa do que na média da indústria de transformação gaúcha (-15,7%). Contudo, essa demanda positiva associada à produção de alimentos, embora importante, foi insuficiente para compensar a queda nas vendas para outros setores econômicos ligados à indústria química, que possui encadeamentos com várias outras atividades econômicas, tais como com o setor automotivo e com a fabricação de máquinas agrícolas, por exemplo, que foram fortemente afetadas pela crise brasileira. De outro lado, para a fabricação de máquinas agrícolas (média-alta) do RS, a demanda originária da agropecuária brasileira foi negativamente afetada pela deterioração nas condições para a tomada de crédito, o que se somou à queda de 24,3% nas exportações de seus produtos, de forma que essa atividade teve queda em seu VTI de 23,5% no período.
JC - Seis regiões dos Coredes respondem por 32% de participação de setores high-tech. E ainda vê-se o vazio no sul que há décadas busca desenvolvimento. O que estamos fazendo de errado ou não estamos fazendo? 
Morem - A pergunta toca em um ponto importante, que é a questão do desenvolvimento regional. As atividades econômicas existentes nessas regiões, consideradas low-tech, também são importantes localmente e para a economia gaúcha, além de muitas delas serem demandantes de produtos de setores high-tech para a sua produção. A questão consiste nas dificuldades que essas regiões com “vazios” apresentam para aumentar o seu grau de industrialização e, nesse processo, elevar a diversificação da estrutura de sua indústria de transformação em direção à uma maior participação de setores high-tech. Cabe indicar que o aumento de participação na economia dos setores de serviços intensivos em conhecimento, como, por exemplo, os de desenvolvimento de software ou os de P&D, também são importantes nesse sentido. Além disto, também é  importante que as empresas, tanto de setores high-techs quanto de low-techs, produzam utilizando-se de tecnologias e técnicas organizacionais no estado da arte de suas respectivas atividades, além de buscarem a realização de um maior esforço para inovar. A história econômica mostra que as nações consideradas desenvolvidas, em sua maioria, trilharam esse caminho. Em especial, em alguma medida, essas nações também tiveram a inserção de empresas no desenvolvimento de tecnologias-chave de alguma(s) das cinco revoluções tecnológicas do capitalismo, que precederam a que estamos presenciando atualmente. Logicamente, realizar esse processo de industrialização, de inserção em setores high-tech e de atualização tecnológica com sucesso não é nada trivial, exigindo a realização de esforços significativos.
JC - O que é mais urgente nesta corrida high-tech?
Morem - A economia mundial está passando por um momento ímpar de revolução tecnológica com o surgimento de um amplo conjunto de novas tecnologias, algumas delas radicalmente novas ou disruptivas. Notadamente, isso vem ocorrendo em digitalização e internet das coisas (indústria 4.0, agricultura de precisão...), em inteligência artificial, em softwares, em energias renováveis, em veículos automotores, em saúde, em novos materiais nanoestruturados e outras. Para essas tecnologias radicalmente novas, o mercado é greenfield, existindo amplo espaço para elevar as vendas das empresas e gerar emprego e renda. Enquanto essas novas tecnologias não estão suficientemente afirmadas no mercado, existe uma janela de oportunidade importante para a inserção de empresas (gaúchas e, no geral, de outros locais) no desenvolvimento dessas novas tecnologias. Inclusive, em determinados nichos de mercado, ainda predominam empresas iniciantes de pequeno porte de base tecnológica, as chamadas startups. Evidentemente, a inserção com sucesso nesses mercados requer das empresas a formação de capacitações tecnológicas, a realização de esforços em P&D para inovar e a articulação com outros atores do sistema regional de inovação nesse processo, destacando-se aí as universidades. Contudo, essa janela de oportunidade é temporária. A medida que os gargalos à difusão dessas novas tecnologias no mercado vão sendo superados, as empresas pioneiras na introdução dessas inovações vão crescendo, bem como criando uma série de barreiras à entrada de rivais, visando proteger e ampliar suas parcelas de mercado. A medida que esse processo avança, vai se tornando cada vez mais difícil, em termos de conhecimento acumulado e dispêndio de recursos para desenvolver essas tecnologias, para que outras empresas se insiram com competitividade nesses nichos de mercado de maior crescimento de vendas. Evidentemente, as regiões e países com a inserção bem-sucedida de produtores locais nesses mercados são beneficiadas, enquanto que as demais tendem a crescer menos. Portanto, aproveitar essas janelas de oportunidade, que ainda estão abertas, seria particularmente importante nesse momento.
JC - O estudo mostra o cenário até 2017. De 2018 para cá podemos ter melhorado? O RS foi protagonista ou coadjuvante?
Morem - Essa pergunta é importante, mas as informações disponíveis ainda são pontuais. Não há levantamentos oficiais de dados abrangentes e sistematizados que identifiquem especificamente a inserção de empresas (brasileiras e gaúchas) nessas novas tecnologias, que têm originado empresas unicórnio. Sem que seja feita uma análise abrangente, fica difícil identificar se esses dois casos que você menciona são fenômenos isolados; ou se fazem parte de um processo maior e sustentado de inserção brasileira e gaúcha nas tecnologias da atual revolução tecnológica. Além disto, ainda não temos dados disponíveis para 2019 para poder avaliar a performance anual recente dos setores industrias high-tech. Por outro lado, a pandemia afetou negativamente o desempenho da indústria em geral. Os dados do PIB trimestral calculado pelo DEE indicam que, no 2º trimestre de 2020 relativo ao mesmo de 2019, a produção de alguns setores industriais high-tech do RS caiu substancialmente: Veículos automotores, reboques e carrocerias (-70%), Máquinas e equipamentos (-14,1%), Produtos químicos (-22,5%).
JC - Onde estão nossos ovos de ouro para puxar os gráficos para cima?
Morem - A recuperação da indústria de transformação gaúcha, em geral, com elevação do desempenho de seus setores high-tech, em específico, ganhando participação nessa estrutura, é importante para o fortalecimento da economia gaúcha. No RS existem algumas empresas inovadoras relevantes, inclusive de capital local, tanto em setores high-techs como em low-techs. A inovação é uma das principais fontes para o aumento da competitividade e do desempenho comercial das empresas. Dispomos de universidades com boas capacitações em ensino e pesquisa, que são importantes ao sistema gaúcho de inovação para dar suporte aos esforços tecnológicos para desenvolvimento de inovações pelas empresas. Soma-se, ainda, os parques tecnológicos do RS, que são instrumentos fundamentais de suporte ao surgimento de startups, sobretudo em setores high-tech mais intensivos em tecnologia e, particularmente hoje, nos segmentos que estão desenvolvendo as tecnologias-chave da atual revolução tecnológica.
JC - Podemos nos espelhar em algum exemplo - no Brasil ou no mundo?
Morem - Não é trivial percorrer, em um contexto econômico e social distinto, exatamente o mesmo caminho de países que se tornaram desenvolvidos. Contudo, pode-se olhar a experiência de diferentes nações bem-sucedidas, buscando retirar lições que permitiram embasar a construção de nossas próprias soluções, isto é, que sejam adequadas à realidade econômica e social local, bem como aos anseios de desenvolvimento de nossa sociedade. O que a experiência histórica dos países nos mostra é que aqueles que se esforçaram em desenvolver e aplicar novos conhecimentos na produção de bens e serviços, e na vida em geral, foram recompensados nesse objetivo de desenvolvimento.
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