O presidente da Câmara de Indústria, Comércio e Serviços de Caxias do Sul (CIC), Ivanir Gasparin, reconhece que a
Covid-19 é uma doença difícil de ser controlada e que exige longos períodos de internação dos pacientes em unidades de terapia intensiva, condições para que seja tratada com muita cautela e responsabilidade. Mas tem posição crítica em relação às restrições impostas.
Eduardo Leite participou de videoconferência com o setor recentemente e projetou reforma tributária.
Gasparin alega que o Estado não fez sua parte como havia prometido, em março, de equipar os hospitais, o que permitiria atender a grande demanda esperada por internações. Também cobra o fato de o Estado, na sua forma mais ampla, ter feito poucos sacrifícios quando comparado à comunidade em geral.
Jornal do Comércio - Na comparação com cidades de estruturas similares, como avalia a situação econômica e social de Caxias do Sul em função da pandemia do coronavírus?
Ivanir Gasparin - Acredito que seja muito parecido com as cidades de mesmo porte. Talvez até pior, porque paramos bem mais cedo, conseguimos achatar a curva, mas agora voltou a crescer e isto é preocupante. Já quando tomamos por base as cidades menores da região, a situação é bem pior, por causa da dependência muito forte que temos das atividades do comércio, dos serviços e da indústria. A maioria dos demais municípios da região tem economia mais voltada à agricultura, onde a repercussão do vírus é menor. Talvez estejamos melhor que as cidades dependentes do turismo, estas sim muito afetadas.
JC - Tem também a questão da indústria automotiva, muito forte na cidade, e que tem sido, nacionalmente, uma das mais afetadas?
Gasparin - Dependemos muito da indústria de autopeças, uma das mais afetadas pela crise sanitária. Só não é pior porque muitas das nossas empresas atendem o setor primário. O que preocupa muito é usar sempre a média como referência de queda. Tem se falado em 18% como média no varejo. Mas, em Caxias, as lojas ligadas ao vestuário já operam com baixas de 70% a 75%. A média esconde deformações. O mesmo ocorre com a indústria, tem empresas que praticamente fecharam, e algumas dobraram atividade. Neste momento, tem de verificar caso a caso para se ter uma visão mais real do que está acontecendo. Não dá para comparar, por exemplo, supermercados, que é atividade essencial, com os demais.
JC - Em que condições sairemos desta crise?
Gasparin - Todos irão perder. Temos muita desinformação, mesmo com o excesso de informes. Muita gente se passando por especialista, e basicamente de um lado só: do fique em casa. Concordo que o ideal seria ficar em casa, mas como fazer para pagar as contas? Tenho recomendado, dentro do possível, não buscar recursos no sistema financeiro. O capital de giro é bom para o curto prazo. Quem buscou este dinheiro e não vendeu nos últimos três meses terá um rombo enorme mais adiante. O sistema financeiro, como está sendo feito no Brasil, acaba prejudicando. São valores muito elevados para pagar. Creio que capital de giro deve ser de curto prazo e com alavancagem de venda. Mas não acredito que teremos esta alta no faturamento de forma imediata. Para recuperar a perda de agora é preciso planejar um fluxo de caixa de longo prazo. Está se vendendo uma ilusão de que buscar dinheiro para capital de giro é a saída. Na verdade, é muito perigoso.
JC - A forma do governo gaúcho atuar, na sua avaliação, está correta?
Gasparin - A doença é de difícil controle e exige muito dias de internação em UTI. No início, os governos usaram como argumento para a parada das atividades econômicas a necessidade de equipar os hospitais para atender a demanda de paciente. Mas até agora pouco foi feito. Para a Serra Gaúcha veio muito pouco. Então, precisamos continuar parando porque o Estado não fez o seu papel.
JC - E sobre a questão financeira?
Gasparin - Já de longa data o Estado tem problemas financeiros, não consegue nem pagar em dia os seus funcionários. Agora, o problema se estendeu para boa parte da iniciativa privada. Só que o Estado não abre mão de receber os tributos, exige pagamento integral do ICMS, por exemplo. Não ajuda o empreendedor sob o argumento de que está difícil para o Estado. Mas se está difícil para o Estado, imagine para o empresário.
JC - Em abril, Caxias fechou mais de 5 mil vagas formais. O desemprego seguirá em alta?
Gasparin - Acredito que deveremos repetir estes números em maio. Talvez, ao longo do ano, chegue-se a números próximos aos da última crise econômica, superior a 20 mil. Ainda tem a falta de informações mais apuradas. Ficamos limitados ao Cadastro Geral de Empregados e Desempregados, que fornece informações somente dos que têm vínculo formal. Tem a questão da microempresa, que emprega basicamente o dono e familiares, que fecha seu negócio, por falta de condições de pagar impostos e demais despesas, mas não entra nestas estatísticas. Sequer baixa o CNPJ, porque não tem condições financeiras para arcar com este custo. Para quitar tudo isto, se conseguir, leva muitos anos. O Brasil talvez seja o único país no mundo com legislação que prejudica o empreendedor ao extremo. O devedor pessoa física que não pagar suas contas tem seu crédito restabelecido após cinco anos. Já a pessoa jurídica fica com esta dívida para sempre. Sequer conseguirá dar baixa no CNPJ. O empresário, hoje, é a corda mais fraca.
JC - Como avalia a ação dos governos frente à Covid-19?
Gasparin - Acho que faltam orientações. Se não descobrirmos logo uma vacina, creio que o que temos aí será o normal. Neste momento, as pessoas que ignoram esta situação estão mais contentes do que aqueles preocupados com o que pode vir a acontecer com o Brasil e com o mundo. O ex-ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta, previu em abril que teríamos longo período de crise. Parece estar se confirmando.
JC - O setor empresarial de Caxias está empenhado na realização de campanhas para auxiliar a população e os hospitais, principalmente. Até quando será possível suportar estas iniciativas?
Gasparin - Está se encerrando, campanha precisa ser curta e intensiva. Acho que o melhor apoio do empresário, neste momento, é gerando emprego, pagando plano de saúde e impostos. Com isto, vamos conseguir chegar vivos mais à frente. O que dói é que no setor público não foi feito nada ainda, sequer campanha para arrecadar fundos para ajudar hospitais. Não é possível que estas pessoas, que não perderam emprego, não tiveram redução da renda, que têm salário garantido e bom, não estejam mobilizados para ajudar a sociedade. Quando falo em Estado, incluo todas as esferas do Executivo, do Legislativo e do Judiciário.