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Economia

- Publicada em 13 de Maio de 2020 às 21:19

Covid-19 pode custar R$ 720 bilhões ao Brasil

Para economista, crise atual é intensa em todos os países

Para economista, crise atual é intensa em todos os países


LUIZA PRADO/JC
Marcelo Beledeli
O ex-secretário da Fazenda do Rio Grande do Sul (2007-2009), Aod Cunha, acredita que os efeitos da crise econômica provocada pela pandemia de Covid-19 poderão ser os piores já vistos na economia mundial em muitas décadas. Segundo o economista, que participou do Tá na Mesa Virtual da Federasul nesta quarta-feira, além de a recessão ser mais abrangente do que em outros períodos, como a crise de 2008, os governos possuem menos condições para fazer políticas para combater seus efeitos econômicos. 
O ex-secretário da Fazenda do Rio Grande do Sul (2007-2009), Aod Cunha, acredita que os efeitos da crise econômica provocada pela pandemia de Covid-19 poderão ser os piores já vistos na economia mundial em muitas décadas. Segundo o economista, que participou do Tá na Mesa Virtual da Federasul nesta quarta-feira, além de a recessão ser mais abrangente do que em outros períodos, como a crise de 2008, os governos possuem menos condições para fazer políticas para combater seus efeitos econômicos. 
No Brasil, a situação é ainda pior, segundo Aod. O ex-secretário lembra que o País teve um crescimento muito fraco na última década, ao contrário do resto do mundo, e só recentemente conseguiu aprovar mudanças tímidas para estabelecer responsabilidade fiscal. Dessa forma, o governo brasileiro possui menos condições para bancar ferramentas de ajuda à população e empresas - ações que podem gerar um custo de R$ 720 bilhões aos cofres públicos neste ano. 
Aod Cunha defende a agenda de reformas, como a tributária e administrativa, a fim de tornar o País atrativo economicamente. Entretanto, o economista teme a falta de lideranças políticas que assumam responsabilidade por esses desafios.
Apesar de acreditar que retorno à normalidade só acontecerá quando houver segurança coletiva, como o descobrimento de uma vacina ou a adoção de protocolos para evitar o contágio pela população, Aod esclarece que as pessoas precisam ter noção de que a recessão não será permanente. "Nenhuma crise é eterna. Esta também irá passar", destaca.
Jornal do Comércio - Qual a gravidade da crise da Covid-19 para a economia mundial?
Aod Cunha - É uma crise grave, que pode atingir uma severidade que nenhuma pessoa que esteja viva hoje já tenha presenciado. O Banco Central da Inglaterra (BoE, na sigla em inglês), por exemplo, prevê uma queda de 12% na economia britânica neste ano, a maior queda anual em mais de 300 anos de registros deles (o BoE foi fundado em 1694). E isso acontece porque essa crise, ao contrário de outras mais recentes, provoca um choque tanto na oferta quanto na demanda. Ela atinge o coração da atividade econômica, que é a mobilidade do capital humano. Uma crise mais recente, a de 2008, foi intensa, mas restrita ao setor financeiro da economia. A maioria dos países já apresentava crescimento no final de 2009. Agora, não temos um sinal claro de que haverá uma recuperação rápida. Os países já praticam taxas de juros baixas, e os bancos centrais não têm muito espaço de manobra para políticas econômicas. Além disso, o crédito está mais escasso.
JC - Como as condições do Brasil para enfrentar a crise se comparam às dos outros países?
Aod - Entramos na crise em uma situação pior que a média global, devido às nossas incapacidades políticas. Desde 2009, o mundo vivia um ciclo de crescimento, embora em ritmo menor do que o ciclo anterior a 2007/2008 - a China, por exemplo, estava crescendo 6% ao ano, enquanto, no início dos anos 2000, era 12%, e países desenvolvidos passaram de uma taxa de 3,5% a 4% para 1,5% ou 2%. Mas o Brasil, na maior parte da última década, teve recessão ou crescimentos pífios do Produto Interno Bruto (PIB), ou seja, não acompanhamos o mundo. Isso aconteceu por problemas próprios da economia brasileira, por culpa nossa. Ao longo da década de 2000 e início da de 2010, crescemos graças ao boom das commodities e por termos uma demografia favorável, com boa oferta de mão de obra jovem no mercado de trabalho. Não soubemos aproveitar esse momento e promover melhorias, como reformas econômicas e investir em educação. Agora, estamos perdendo o bônus demográfico, com o envelhecimento da população, e só podemos crescer se aumentarmos a produtividade, que está estagnada.
JC - As medidas de auxílio aos cidadãos e às empresas já realizadas pelo governo federal são eficientes?
Aod - O Brasil não está inventando essa roda, o mundo inteiro está adotando medidas semelhantes de mitigação da crise para manter a renda mínima da população e salvar empregos. Esse pacote envolve a ajuda às empresas que mantenham empregos, com o subsídio no caso de corte de jornada e salários e suspensão de contratos; a ajuda emergencial direta de R$ 600,00 para a população mais vulnerável; a permissão para o Banco Central realizar a compra de ativos de empresas, como debêntures; e a ajuda para estados e municípios, que foi aprovada pelo Congresso. Eu mesmo, que tenho uma visão econômica mais liberal, ligada ao mercado, defendo que não tinha outra solução, era preciso fazer medidas nesse sentido. Não podemos deixar as pessoas morrerem de fome, nem as empresas acabarem. Mas é importante que essas ações sejam transitórias. Não podem se transformar em políticas permanentes, para não pressionar ainda mais as contas públicas, que já ficarão extremamente fragilizadas.
JC - Quais as repercussões financeiras que essas ações terão nos cofres públicos?
Aod - Só a ajuda emergencial de R$ 600,00 para cerca de 60 milhões de pessoas deverá custar em torno de R$ 130 bilhões. Isso é maior do que o déficit primário do setor público, que era projetado em R$ 115 bilhões para 2020. Se somarmos todas as medidas já anunciadas, o déficit público, neste ano, deve alcançar R$ 720 bilhões em 2020. Mas isso não para por aí! Junto com outras medidas em debate, e se as ações já tomadas forem prorrogadas, podemos fechar o ano com um déficit primário de R$ 1,2 trilhão, mais de 10% do PIB de 2019. Além disso, se a economia cair 5% ou 6%, como já se prevê, a dívida bruta deve passar de 100% do PIB ainda em 2020. Portanto, se as soluções transitórias se transformarem em ajuda permanente, teremos um problema fiscal muito sério, que vai se refletir em alta de taxas de juros, em alta do dólar e em inflação.
JC - E como vê o Rio Grande do Sul nesse cenário?
Aod - Acho que o Estado tem uma situação fiscal muito difícil, e ainda está enfrentando desafios adicionais, como a seca, que deverá ter um reflexo forte na atividade econômica. Nesse sentido, o socorro da União ainda é mais relevante para nós. A vantagem que vejo para o Rio Grande do Sul é que, para enfrentar essa crise, é preciso ter coesão social e maturidade política. No País, temos uma dificuldade muito grande neste aspecto, estamos muito polarizados e há dificuldade de diálogo. Aqui, o governador Eduardo Leite tem apresentado capacidade e habilidade política, estabilidade emocional, e consegue fazer um diálogo com vários setores com opiniões diferentes. A sociedade gaúcha tem dado um bom exemplo nesse sentido.
JC - Diante dessas dificuldades, qual seria a solução?
Aod - Passada essa crise, não podemos abandonar o rumo da responsabilidade fiscal, que estávamos tentando implementar a tanto custo. Precisamos lembrar que mesmo essa ajuda é transitória, não permanente. Dinheiro não jorra a custo zero, essa conta terá que ser paga no futuro. Quando o ambiente voltar à normalidade, a agenda de reformas precisa ser retomada. No entanto, tudo passa por uma solução política. Os economistas e os analistas podem dar todas as recomendações técnicas, e o fazem, mas sem ambiente político para gerar boas leis e um ambiente de prudência fiscal isso não resolve nada. A crise é intensa para todos os países, que terão que lidar com suas consequências. Mas, no Brasil, falta capacidade de liderança e coordenação política para que as instituições públicas consigam dar um rumo melhor para o País. Esse é o maior desafio brasileiro agora.
JC - Até quando devemos viver essa crise?
Aod - A normalidade só deve retornar após a descoberta de uma vacina ou a adoção de protocolos pela população para evitar o contágio. Mas, ainda que a crise seja grave, ela vai passar. Desde 1929, o mundo teve 17 ciclos de crescimento, seguidos por recessões. E, após todas as crises, o mundo estava mais rico e a população, mais próspera do que no período anterior. Então nenhum crescimento dura para sempre, e nenhuma crise é eterna. Esta também irá passar. No caso do Brasil, haverá, sim, em um primeiro momento, demissões e mortalidade de empresas. Mas vamos continuar sendo um país com 200 milhões de pessoas, que produz muitas riquezas e gera muitas oportunidades. Sabemos o que precisamos fazer para retomar um caminho de crescimento, mas é preciso maturidade política e tranquilidade emocional para navegar durante a crise. O Brasil tem muitos desafios, muito trabalho a fazer, mas, se seguirmos um caminho de reformas, podemos melhorar.
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