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Economia

- Publicada em 25 de Fevereiro de 2020 às 20:10

Em tempos de cocriação, propriedade intelectual desafia mercado

Nuno Caldas estará no segundo Tech Art Festival, que acontece no dia 21 de março, na Fábrica do Futuro

Nuno Caldas estará no segundo Tech Art Festival, que acontece no dia 21 de março, na Fábrica do Futuro


/ARQUIVO PESSOAL/DIVULGAÇÃO/JC
Patricia Knebel
Quem é o dono de uma ideia surgida em uma maratona de desenvolvimento? A empresa tradicional que demandou o projeto ou a startup que pensou e desenvolveu o protótipo? E no caso de um aplicativo criado individualmente pelo colaborador de uma companhia, usando recursos do seu ambiente de trabalho? Em tempos de cocriação e inovação aberta, o debate da propriedade intelectual nunca esteve tão em alta. Para falar sobre esse e outros temas, o português Nuno Caldas é uma das presenças confirmadas da 2 edição do Tech Art Festival, que acontece no dia 21 de março na Fábrica do Futuro.
Quem é o dono de uma ideia surgida em uma maratona de desenvolvimento? A empresa tradicional que demandou o projeto ou a startup que pensou e desenvolveu o protótipo? E no caso de um aplicativo criado individualmente pelo colaborador de uma companhia, usando recursos do seu ambiente de trabalho? Em tempos de cocriação e inovação aberta, o debate da propriedade intelectual nunca esteve tão em alta. Para falar sobre esse e outros temas, o português Nuno Caldas é uma das presenças confirmadas da 2 edição do Tech Art Festival, que acontece no dia 21 de março na Fábrica do Futuro.
Engenheiro e advogado, ele é especializado em transferência de tecnologia. Iniciou a sua carreira no setor de desenvolvimento da Bosch em Portugal, e depois atuou na área de biotecnologia. Há 15 anos mora no Brasil e é atualmente sócio do escritório Dannemann Siemsen, com uma atuação voltada para a inovação e estratégia de proteção e expansão de negócios apoiados em ativos intelectuais. Entre os clientes estão players como AGCO, Hospital Sírio Libanês, Nestlé e Volkswagen.
Jornal do Comércio - O quanto a nova era digital, e seus conceitos de colaboração, cocriação e inovação aberta, desafiam a legislação sob o aspecto da propriedade intelectual?
Nuno Caldas - Nestes últimos anos, a riqueza vem assumindo cada vez mais formas intangíveis e o capital intelectual é a base da competitividade através de conhecimentos e experiências. Isso faz com que o mercado precise de uma legislação desenvolvida que garanta o direito sobre as inovações tecnológicas e as obras artísticas e literárias. Considero a legislação de propriedade intelectual brasileira é bastante completa e uma das mais avançadas no mundo. Na verdade, mais que adequar a legislação, o importante é a conscientização das pessoas e das empresas para ações conjuntas voltadas à inovação e desenvolvimento econômico.
JC - Como definir de quem é o direito à propriedade intelectual de uma ideia criativa?
Caldas - Propriedade intelectual é um termo usado para se referir a criações da mente, como invenções, trabalhos artísticos, design e símbolos, nomes e imagens utilizados no comércio. Esta é a definição da Organização Mundial da Propriedade Intelectual. O dono de qualquer ideia é o criador, aquele que idealizou tal ideia, a pessoa física cujo estado de espírito manifestou determinado conceito criativo. Ideias, no entanto, podem ser enquadradas como conceitos abstratos e, por si só, não são objeto de proteção industrial ou mesmo intelectual. Um exemplo disso pode ser dado por uma ideia que surge para criar um carro sem rodas. Esse seria o conceito criativo, mas a forma construtiva ou sistema que permite chegar em tal solução é que seria objeto de proteção, por exemplo, por meio de uma patente.
JC - E no caso de um produto gerado a partir de um hackathon ou de um app criado por um funcionário dentro da empresa?
Caldas - O direito de titularidade de uma propriedade imaterial é de seu autor ou autores. Este é um direito inerente e inalienável da pessoa física e só será diferente por força contratual. Um exemplo desta exceção decorre da relação de um contrato de trabalho onde um funcionário desenvolve algo para a empresa e, nesse caso, o dono do direito passa a ser automaticamente a empresa. Assim, em um evento de hackathon, se há uma solução criada para um problema e posteriormente uma empresa aperfeiçoa essa solução até chegar em um produto ou uma solução comercializável, o mais provável é que estejamos perante um regime de copropriedade. Mas a questão da titularidade de direitos de propriedade intelectual pode estar contratualmente determinada, por exemplo, no termo de adesão ao evento. Deste modo, uma empresa que promova um hackathon pode disciplinar que os participantes se obrigam a ceder, de forma não onerosa e exclusiva, todos os direitos patrimoniais decorrentes dos projetos desenvolvidos durante o evento. O que define a titularidade do direito é o grau de participação de cada parte.
JC - Que cuidados legais devem ser tomados por quem gera a inovação?
Caldas - Na prática, é importante que quem gera a inovação realize a transmissão do conhecimento por meio de um contrato que discipline tanto a titularidade (dono) quanto o pagamento. Enquanto isso não for possível, é importante sentar em uma mesa de negociação com um contrato de confidencialidade ou um memorando de entendimento que defina o que está a ser discutido e garanta os direitos tanto do criador quanto da empresa. Este tipo de abordagem tende a ser saudável para o desenvolvimento de uma parceria, podemos ver como os alicerces de uma fundação. Quanto mais sólida a base de uma casa, mais forte ela será quando submetida a todo tipo de condições.
JC - Legalmente, as startups estão mais desprotegidas por, muitas vezes, terem menos força que as empresas maiores nessa questão da proteção legal das ideias geradas?
Caldas - O direito de obter uma patente está ao dispor de todos na sociedade e, portanto, sob o ponto de vista conceitual, não há diferença entre um inventor pessoa física, uma startup e uma empresa maior e mais estruturada. Esta discussão reside principalmente em dois fatores: o grau de conhecimento do sistema de patentes e a capacidade de pagamento para contratar um especialista. No caso do grau de conhecimento, há uma imensa informação à respeito do tema e o INPI tem tido um papel pedagógico na sociedade. Hoje basta fazer uma consulta direta no site e esclarecer as dúvidas. Com relação à capacidade de pagamento, as taxas do INPI são relativamente reduzidas e ao alcance de qualquer startup. O principal elemento que obstaculiza o depósito de uma patente é o custo para contratação de um especialista na redação da patente. Mas a lei prevê instrumentos que oferecem às startups formas de consolidar a sua propriedade intelectual tal qual uma empresa de maior porte. Com um conhecimento claro da tecnologia desenvolvida, foco e algum conhecimento básico de estratégia em propriedade intelectual é possível competir de igual para igual e majorar o posicionamento de uma startup. Na verdade, ainda existe falta de consciência das startups nesse tema.
JC - E a LGPD, o quanto ela pode impactar os negócios das startups?
Caldas - A LGPD entrará em vigor em agosto de 2020. Startups normalmente são empresas de base tecnológica e que trabalham com dados pessoais, de modo que com a LGPD terão mais um item para levar em consideração no momento de idealização e desenvolvimento da empresa. A existência ou não de governança a este respeito deverá ser um dos critérios de avaliação na hora de aporte de investimentos, visto que estamos a falar de um potencial passivo futuro.
JC - A criatividade encontra proteção hoje na nossa legislação?
Caldas - Sob o ponto de vista da proteção e da geração de valor, uma criação sempre encontra guarida na legislação. A legislação nacional de Propriedade Intelectual tem todos os elementos para resguardar os interesses do criador. A criatividade pode, muitas vezes, parecer não encontrar previsão legal onde se enquadrar, mas é, em si, um dos motores da transformação legal. Embora seja a legislação que busca se atualizar para se enquadrar na atualidade, há inúmeras formas de a criatividade se enquadrar na legislação.
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