O software livre sempre carregou muito fortemente um viés social e político no seu posicionamento no mercado. Nos últimos anos, entretanto, o aspecto tecnológico ganhou relevância, e o ideológico foi ficando de lado, o que acabou por enfraquecer o movimento tradicional.
"Estamos diante de divisões políticas, e as pessoas com cores diferentes estão tendo muita dificuldade de conversar. Isso está acontecendo no mundo todo e tem sido uma razão forte para levar a algumas reduções dos debates sobre o tema e da adoção", lamenta Alexandre Oliva, ativista do Movimento Software Livre e conselheiro da Free Software Foundation (FSF) América Latina. Ele participou como painelista, na semana passada, no Fórum Internacional do Software Livre (Fisl 18), que aconteceu no Centro de Eventos da Pucrs. Foram mais de 400 palestras e debates sobre o uso de tecnologias livres. "Estamos nessa resistência, e o Fisl é um símbolo da preocupação com o lado social e ético do software livre, e não apenas com o técnico", elogia.
Um dos fatores que tem feito o movimento tradicional perder espaço é o sucesso do Open Source. Os envolvidos nesses projetos, de fato, foram bem-sucedidos em identificar práticas do movimento, como o desenvolvimento colaborativo de software e a revisão de programas, e levar para as empresas. "É uma dissidência do movimento do software livre que procura levar para as grandes corporações vantagens práticas das técnicas usadas pelo software livre, mas que varreu para baixo do tapete questões importantes, como as sociais, as políticas e as éticas", comenta Oliva.
O coordenador adjunto da Associação Softwarelivre.org, Ricardo Fristch, explica que está cada vez mais clara essa divisão entre o software livre - que é a não propriedade do software e que permite toda liberdade ao usuário - e o open source - que são códigos abertos, mas com propriedade e o vigoroso apoio dos grandes players de tecnologia. Ele destaca, porém, a importância de se manter as quatro liberdades do software livre: usar, copiar, modificar e distribuir. "Precisamos ter uma tecnologia que liberta, que não nos aprisiona ou nos obriga a utilizar determinados softwares, com determinados padrões e equipamentos que acabam nos aprisionando", defende.
Apesar dessa divisão, e dos aspectos éticos e sociais terem perdido um pouco de espaço nos debates, a evolução deste mercado foi grande nos últimos 20 anos. Mesmo que, no Brasil, alguns órgãos governamentais tenham trocado o software livre pelo proprietário nos últimos anos, a adoção é uma realidade em todas as áreas, e, hoje em dia, muitas empresas optam por trabalhar com essas soluções. "Os grandes players mundiais de tecnologia são usuários, participam e financiam muitos projetos de software livre. Até aquelas corporações que, no passado, não se associavam ao software livre, hoje, patrocinam vários projetos nessa área", destaca Fristch.
Ele cita que tecnologias como Blockchain, Big Data, Inteligência Artificial e Internet das Coisas têm permitido avanços importantes em áreas como medicina, governo eletrônico e setor de serviços. "Todas essas novas tecnologias têm sido possíveis graças à utilização dos softwares livres e de padrões abertos", relata.
Oliva destaca o nível de segurança que as soluções livres oferecem. "Existem diversos bugs de arquitetura de hardware que apavoram as empresas há tempos, mas que quem usa software livre não precisa se preocupar. Se tudo que usarmos estiver sob nosso controle, podemos investigar, auditar e modificar, ou seja, não temos o que temer", complementa.