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Políticas Públicas

- Publicada em 01 de Dezembro de 2021 às 20:45

PL que altera lei do Conselho Estadual de Cultura tramita na Assembleia Legislativa em regime de urgência

Associação Gaúcha de Escritores (AGES) protocolou representação contra à Sedac no sábado (29)

Associação Gaúcha de Escritores (AGES) protocolou representação contra à Sedac no sábado (29)


GABRIELA DI BELLA/ARQUIVO/JC
Encaminhado pelo governo do Estado à Assembleia Legislativa do Rio Grande do Sul (AL/RS) para ser votado em regime de urgência, o Projeto de Lei (PL) 418/2021 seguiu para a Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do parlamento gaúcho nesta segunda-feira (20). Tramitando na Casa desde o último dia 11, o texto que prevê a alteração da legislação que regulamenta o Conselho Estadual de Cultura (CEC) entrou na pauta do Plenário já no dia 12 de novembro. 
Encaminhado pelo governo do Estado à Assembleia Legislativa do Rio Grande do Sul (AL/RS) para ser votado em regime de urgência, o Projeto de Lei (PL) 418/2021 seguiu para a Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do parlamento gaúcho nesta segunda-feira (20). Tramitando na Casa desde o último dia 11, o texto que prevê a alteração da legislação que regulamenta o Conselho Estadual de Cultura (CEC) entrou na pauta do Plenário já no dia 12 de novembro. 
A pressa na aprovação instiga e gera descontentamento por parte de representantes do Conselho e de 21 entidades ligadas ao setor, que encaminharam documento ao governo solicitando a retirada do regime de urgência na votação. "Posto que matéria complexa e de grande repercussão, carece ainda de amplo debate e não da forma açodada como tramita, no apagar das luzes do ano Legislativo", diz um trecho da carta enviada pelo grupo ao governador Eduardo Leite, no final da tarde da última sexta-feira (26). 
Ainda conforme o documento, o PL 418/2021 foi elaborado "de forma unilateral", pela Secretaria de Estado do Rio Grande do Sul (Sedac), impedindo a participação daqueles que criaram a lei a ser alterada, e de sequer argumentar, ponderar, emitir pareceres contrários ou colaborativos à proposta. O grupo de representantes culturais afirma que o momento é "inadequado para uma alteração substancial do Conselho, haja vista a pandemia e as consequências especialmente no setor da Cultura, e o fato de não ter havido um debate amplo com a classe artística."
Baseada neste documento assinado pelas 21 entidades, a Associação Gaúcha de Escritores (Ages) protocolou representação no Ministério Público do Rio Grande do Sul (MPRS) contra a Secretaria proponente original do projeto. 
Segundo a justificativa do PL protocolado na Assembleia Legislativa, "no contexto de pandemia da Covid-19, novas formas de trabalho foram implementadas pelo CEC, que, por meio de reuniões virtuais, pôde dar sequência de maneira remota às suas sessões". A partir dessa nova forma de funcionamento, a Sedac entende que há possibilidade de uma maior representação regional, observando as nove regiões funcionais dos Conselhos Regionais de Desenvolvimento (Coredes) e os segmentos artísticos e culturais definidos nos Regimentos Internos dos respectivos Colegiados Setoriais de Cultura.
Além disso, a Secretaria propõe ampliar a participação das entidades na concorrência ou indicação de nomes para o processo de votação do colégio eleitoral. O PL também amplia a composição do CEC, passando de 24 para 27 conselheiros, o que contribuiria para o preenchimento das vagas asseguradas para as nove Regiões Funcionais, considerando a eleição de 18 membros. "Ainda, para ampliar a representatividade na composição entre os segmentos artísticos e culturais, o Projeto de Lei assegura vagas para os representantes de segmento com correspondência em colegiado setorial, oportunizando, assim, a diversidade e o caráter de abrangência estadual do Conselho Estadual de Cultura", destaca a justificativa do projeto.
Sobre o funcionamento do Conselho, o PL dispõe sobre as Comissões Especiais, visando "tornar mais eficiente" a organização interna e os fluxos dos processos de estabelecimento de diretrizes, fiscalização e elaboração de pareceres, que serão regrados por meio de seu Regimento Interno. Por fim, para as sessões, "assegura expressamente" a possibilidade de participação remota dos conselheiros, "viabilizando a participação regional prevista nessa atualização legislativa".
Conforme a assessoria de imprensa da Secretaria de Estado da Cultura, um dos pontos mais importantes no que se refere à proposta de atualização da lei do CEC é a "democratização da composição do Conselho, garantindo vagas às regiões funcionais do Estado, bem como para representantes de todos os segmentos culturais". "Da mesma forma, a ideia é permitir um aumento do colégio eleitoral, proporcionando a votação e indicação a qualquer entidade cultural sem fins lucrativos, devidamente inscrita na Sedac, para permitir a participação de representantes de distintas regiões" do Rio Grande do Sul.
O presidente da Ages, Alexandre Brito, afirma que "é difícil citar algo de positivo (no PL), pois mesmo os pontos que poderiam ser considerados como de avanço para a comunidade cultural e para o próprio CEC" não estão claros. "Grande parte destes temas é deixada para uma regulamentação posterior, o que torna muito vago o entendimento de como vai se dar a participação das nove regiões setoriais e de como vai ser feita esta ampliação do Conselho, para contemplar mais segmentos do setor e aumentar a representatividade (de entidades) do interior", continua o dirigente.
Brito justifica a preocupação do setor, uma vez que seria "extremamente invasivo e inconstitucional, de que, como está proposto no PL, as entidades que venham a se candidatar às eleições do CEC precisem se cadastrar na Sedac". Desta forma, a Secretaria passaria a ser responsável em criar critérios para que as mesmas possam participar do processo, destaca Brito. O dirigente destaca que muitos pontos estão "imprecisos" no PL. "Isso tudo feito sem ouvir a comunidade cultural e solicitando urgência na votação", adverte.
A Sedac, por sua vez, afirma que escutou sim o Conselho. Em março de 2021, a Secretaria informou ao CEC que a lei de regulamentação do órgão passaria por alteração, e solicitou sugestões do que os conselheiros consideravam que deveria ser modificado. "Isso acontece em um momento inoportuno, adverso e em plena pandemia. Mesmo após a solicitação de adiamento para amplo debate com a classe cultural, tal diálogo jamais ocorreu", destaca o ex-presidente do Conselho, Airton Ortiz.
Ele afirma que foram inúmeros os pedidos, tanto do próprio conselho, como de entidades culturais, para que fosse publicado o teor das alterações propostas. "Mas só foi possível acesso ao projeto de lei, quando este foi enviado à Assembleia Legislativa. Antes disso, o que houve foi solicitação de envio de sugestões, o que é bem diferente", pondera. Ele enfatiza que "em momento algum o governo informou à comunidade cultural o detalhamento do que pretenderia mudar, sendo comunicado somente em linhas muito gerais as áreas de alteração".
Brito avalia que "o que está em curso" é uma tentativa de "enfraquecimento" do CEC, que historicamente cria "dificuldades" à Sedac, por conta de seu papel fiscalizador (da Secretaria de Cultura). "Sempre foi conflituoso no sentido de construir políticas públicas em conjunto", uma vez que o órgão responde pelos projetos de cada gestão do governo que se estabelece.

Integrantes do Conselho vão pedir retirada de urgência do projeto

"Majoritariamente", o Conselho de Cultura irá solicitar à Assembleia Legislativa que seja retirado o regime de urgência da votação do PL, informa o vice-presidente do CEC, José Francisco Alves. Ele destaca que esta é a primeira vez que uma mudança na legislação do Conselho teve a consulta do governo. "Nunca ocorreu antes. Esse fato é positivo, pois inédito. Em vista disso, o nosso texto com sugestões enviado à Sedac, que foi debatido exaustivamente em quatro meses, foi contemplado em boa parte no PL do governo", pondera.
"Porém, a diretiva do CEC vai apresentar aos deputados a nossa própria sugestão, integral. Nosso texto tem a colaboração da ampla maioria dos conselheiros, que trouxeram sugestões suas e de suas entidades", destaca Alves. "Escutamos, inclusive, os conselhos de outros estados. O PL do governo é um bom projeto. Mas o a proposta do CEC é mais completa." Segundo o vice-presidente do Conselho, ambas propostas visam ampliar a participação da sociedade. "Desde 1993, quando iniciaram as eleições para o CEC, via entidades, as que participam são praticamente as mesmas. Essa distorção vai acabar, seja com o PL do governo, seja pela adesão dos deputados às propostas do CEC."
Membro do Colegiado Setorial de Música do Estado, o professor do Centro de Artes da Universidade Federal de Pelotas (Ufpel) e presidente do Conselho Municipal de Cultura desse município, Leandro Maia, destaca a necessidade de articular esta legislação com as demais em nível nacional e estadual. "É preciso considerar a complexidade do tema, sem contar com todas as grandes transformações que vivemos no último ano."
Na opinião de Maia, a legislação proposta "empurra com a barriga" a definição de segmentos artísticos culturais dentre aqueles representados pelos colegiados. "Aí a conta não fecha: o PL deixa a lacuna para a definição de quais segmentos estarão presentes (nove de 12), além de não impedir que um mesmo segmento tenha maior representação do que outros." Para ele, a solução seria dada pela previsão de um "regulamento" a ser produzido pelo Poder Executivo. "É como se fizéssemos uma lei em branco, que dá poderes ao executivo para definir não somente a forma de eleição em si, mas também o perfil dos conselheiros e quais segmentos seriam representados ou não."
Outros representantes do setor cultural avaliam que o projeto de lei apresenta lacunas "incontornáveis que, por coincidência ou não", tornam o conselho mais suscetível ao controle do governo.
"Os colegiados não foram convidados para o debate", reforça o coordenador do colegiado de Dança, Edson Possamai. "Isso está no texto do PL, mas não aconteceu", sinaliza. Sobre o projeto em si, Possamai destaca que não há nenhuma indicação no texto de que os cargos serão assumidos por pessoas com ligação à Cultura, "com notório saber ou currículo específico". Ao destacar que o CEC é um dos mais antigos do País, Possamai afirma que isso se dá justamente porque sempre se manteve autônomo. "Com a mudança da legislação, a autonomia, de certa forma, é ferida, uma vez que o governo que estiver no mandato irá interferir no processo de eleições."
Possamai ainda destaca que o PL propõe que as entidades que venham a concorrer a vagas no CEC serão somente as cadastradas na Sedac. "No entanto, o único cadastro que há na Secretaria é o de inscritos em projetos no Pró-Cultura, e nem sempre são de entidades ligadas à Cultura. Esse é o risco: ter entidades que não representam o setor no CEC. Entre outros vários pontos, o coordenador do colegiado de Dança destaca que a Lei do Sistema Estadual de Cultura cita um Conselho Estadual de políticas culturais. "Me parece estranho que, ao sugerir a alteração da lei, isso não seja considerado."
Ainda assim, Possamai opina que nem tudo da proposta é ruim. Ele exemplifica com o processo de considerar as nove regiões do Estado e contemplar o interior, onde há processos culturais diferentes. "O problema", diz ele, "é construir tudo sem a participação da sociedade civil, e de forma nebulosa." O coordenador do colegiado de Dança destaca ainda que, apesar de ouvir as sugestões do CEC, a Sedac não as considerou em sua maioria.
"O que nos preocupa é que a regionalização ocorre só nos dois terços da sociedade civil, enquanto não há regras nem critérios para os indicados de governo", observa o presidente regional do Instituto de Arquitetos do Brasil, Rafael Passos. Além disso, o dirigente entende que o regulamento eleitoral e o registro das entidades culturais que poderão participar deve partir do CEC, para que o Conselho siga de forma autônoma "Não é adequado que seja feito pela Sedac", avalia. Passos finaliza ressaltando que o ideal é que o assunto siga sendo discutido, para que sejam avaliadas as propostas da Secretaria, mas também as enviadas pelo Conselho, para que seja possível se "chegar a um ponto em comum."