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Cultura

- Publicada em 03 de Outubro de 2021 às 19:48

Obra narra trajetória do primeiro vencedor do Freio de Ouro

Reconhecido como 'Ginete do Século', Vilson Souza tem sua trajetória retratada em livro

Reconhecido como 'Ginete do Século', Vilson Souza tem sua trajetória retratada em livro


DHÉSIKA VIDIKIN/DIVULGAÇÃO/JC
Igor Natusch
Para o gaúcho do campo, o cavalo é um companheiro de todas as lidas. Mais do que domínio do homem sobre a fera, o que se estabelece entre eles é uma relação de parceria e cumplicidade: de fato, há quem diga que o cavalo escolhe quem vai montá-lo, tanto ou até mais do que o cavaleiro. Quando o humano leva o pé ao estribo, alça a perna e monta, é como se propusesse uma parceria - um acordo de força telúrica que define o montador, o cavalo, a pampa, o mundo inteiro.
Para o gaúcho do campo, o cavalo é um companheiro de todas as lidas. Mais do que domínio do homem sobre a fera, o que se estabelece entre eles é uma relação de parceria e cumplicidade: de fato, há quem diga que o cavalo escolhe quem vai montá-lo, tanto ou até mais do que o cavaleiro. Quando o humano leva o pé ao estribo, alça a perna e monta, é como se propusesse uma parceria - um acordo de força telúrica que define o montador, o cavalo, a pampa, o mundo inteiro.
Poucos nomes, na história do Rio Grande do Sul, sintetizaram essa simbiose tão definidora para o imaginário de nosso Estado quanto Vilson Charlat de Souza. Primeiro campeão do Freio de Ouro, em 1982, e um dos maiores vencedores da prova, o "Ginete do Século" revolucionou a doma e ajudou a forjar a raça crioula, ajudando a profissionalizar a atividade e deixando um legado festejado em todos os cantos do Rio Grande e além.
Alvo de muitas e justas homenagens em vida, o ginete, que faleceu no final do ano passado, agora é eterno também em livro. Escrito por Renato Dalto, Coração de cavaleiro - a arte de Vilson Souza conta com curadoria de Pablo Souza, neto do retratado, e reúne uma série de histórias, fotos e testemunhos. A obra teve lançamento oficial no último fim de semana, durante a final da 39ª edição do Freio de Ouro, no Parque de Exposições Assis Brasil, em Esteio (RS) - nada mais adequado para quem, em 1982, conquistou o título pela primeira vez, em um dos capítulos marcantes de uma trajetória singular.
O livro pode ser adquirido diretamente no site vilsonsouza.com.br. O valor da obra de 206 páginas é R$ 119,90, com envio incluso para todo o Brasil.
"Meu avô foi feliz em vida, foi muito homenageado em vida durante esses anos todos. Era uma figura unânime, com um carisma diferente, que cativava e recebia o carinho das pessoas. O que faltava era o compilado das realizações", comenta Pablo Souza. A ideia de transformar a história de vida de Vilson Souza em livro surgiu em 2019, a partir de uma exposição realizada em Bagé para homenagear os 85 anos do cavaleiro. Escritor de destaque no meio criolista, Renato Dalto teve a contribuição direta de Vilson, em mais de um sentido: além do contato direto com o icônico ginete, pôde acessar as anotações pessoais do retratado, em registros que se estendem por várias décadas.
"Todos os dias ele registrava o cotidiano dele, as coisas que tinha feito, os cavalos que tinha montado no dia. E, no final da vida, reconstruiu sua trajetória por meio de um diário", conta Pablo. Esse caderno, em especial, traz registros vindos da sempre elogiada memória de Vilson, que vão até 2017 - anotações feitas depois que ele aprendeu a escrever com a mão esquerda, já que o lado direito do corpo foi afetado por um AVC, em 2007. Foi essa atividade, que inventou para si como forma de ocupar o tempo, que acabou sendo um dos principais fios condutores de Coração de cavaleiro.
Das páginas do livro, surge um homem cuja trajetória foi, desde o início, norteada pela convivência com o cavalo. Aos 14 anos, lá para os lados do Ibirocai, resolveu que queria montar o zaino Republicano - que estava na doma, com fama de corcovear solenemente. Vilson, na verdade, já tinha dado umas gineteadas no lombo do bicho, mas em segredo, para que seu pai não soubesse. Quando o cavalo apareceu, levado a cabresto, na propriedade dos Souza, o ainda guri Vilson pediu para montar; o pai, seu Marcos, negou. "Meu pai, nunca lhe teimei, mas desta vez o senhor me dá licença, que eu vou montar esse cavalo", respondeu o filho, em um quase inédito desafio. "Tu monta, mas se cair apanha", respondeu o pai.
Vilson, é claro, não caiu. Ao contrário: gineteou com tanta autoridade que os olhos do pai se encheram de lágrimas. E esse montar abriu caminho para outros tantos que se seguiram, em uma trajetória na qual o homem e o cavalo são parceiros inseparáveis. Só no Freio de Ouro, foram 11 premiações - cinco de ouro (incluindo a pioneira, montando Itaí Tupambaé), quatro de prata, dois Freios de Bronze. Se hoje o cavalo crioulo, ao um só tempo resistente e dócil, é reconhecido no mundo todo, é porque Vilson criou todo um método de doma, praticamente inventando um jeito gaúcho de montar a cavalo e virando respeitado treinador no meio.
Despediu-se dos concursos de cavalo crioulo em 2001, aos 69 anos. Seguiu ensinando, até o fim da vida, que o segredo de domar um cavalo é fazer com que ele entenda o que a gente pensa. Uma lição simples, pode até parecer, mas que traz em si a profundidade de um mundo inteiro - afinal, o cavaleiro e o cavalo se forjam juntos, nas lidas campeiras que vão do rasgar da aurora ao recolher do sol. E disso, Vilson Souza sempre soube muito bem.
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