Um reencontro com um amigo. Talvez seja possível resumir assim o efeito de Meu amigo Bussunda, série em quatro episódios do Globoplay que estreia nesta quinta-feira (17), marcando os 15 anos da morte de um humorista que marcou a televisão brasileira. Durante os quatro episódios, o espectador é convidado a um passeio pela trajetória de Cláudio Besserman Vianna, guiado pelas vozes de tanta gente que conviveu e se encantou com sua presença – uma jornada capaz de, ao mesmo tempo, realçar o quanto Bussunda tinha de amigo também para nós, que nos divertíamos com ele na tela de televisão e nas salas de cinema.
“O nome Meu amigo Bussunda veio de cara na minha cabeça, mas, ao desenvolver a série, percebi que (a frase) era um primeira pessoa de várias pessoas”, comenta Claudio Manoel, amigo e colega de Bussunda no grupo Casseta & Planeta e que assina a direção geral da produção. “Enquanto produzíamos a série, eu ouvia pessoas mais jovens da equipe dizendo ‘poxa, deve ter sido legal conviver com esse cara’. Acaba sendo um convite para o camarada que está assistindo também entrar nessa intimidade”. Nos três primeiros episódios, Claudio Manoel divide direção e roteiro com Micael Langer; no último, a parceria é com Júlia Besserman, filha de Bussunda e que tinha 12 anos quando o pai faleceu, na Alemanha, durante a cobertura da Copa do Mundo de 2006.
A produção narra, ao longo dos três primeiros capítulos, a trajetória de Bussunda em ordem cronológica, usando imagens inéditas e de arquivo, além de entrevistas com parentes, amigos, colegas e integrantes do Casseta & Planeta. Claudio Manoel surge como entrevistador e testemunha, servindo como um fio narrativo unindo os episódios. Na última parte, Júlia propõe uma análise sobre o Bussunda que sobrevive à sua ausência, com entrevistas que abordam sua filosofia de vida (apelidada carinhosamente de “zen bussundismo” por amigos) e a influência dele no humor que se faz hoje no Brasil.
Para quem conviveu de forma próxima com Bussunda durante décadas, realizar o documentário foi uma mistura de reencontro e catarse. “O tempo ajuda a tornar possível fazer essa jornada. E você vai revivendo lembranças muito gostosas, vai vendo que (devido ao luto) você também se privou de lembrar de momentos muito legais. Isso traz uma proximidade de novo, para o bem e para o mal”, pondera Claudio Manoel. “Foi um reencontro com a risada, com o fascínio que ele causava nas pessoas, com a capacidade de tirar humor de tudo sem forçar a barra que ele tinha. Mas também traz de novo questões de perda. Durante esses meses, todo dia eu acordava pela manhã e tinha pesquisa, edição, entrevistas para fazer. O Bussunda voltou a estar tão presente na minha vida quanto na época em que a gente morava junto. Quando esse trabalho se encerra, a janela se fecha, dá um certo vazio.”
Com o emblemático grupo Casseta & Planeta, Bussunda gravou inúmeros programas televisivos, além de escrever 11 livros, protagonizar dois filmes (A Taça do Mundo é nossa, de 2003, e Casseta & Planeta: seus problemas acabaram!, de 2006) e realizar uma série de shows. Participou também de outras produções cinematográficas - entre elas, dublou a voz do personagem principal nos dois primeiros filmes da série de animação Shrek. Um legado que, como mostra Meu amigo Bussunda, tem tudo a ver com uma vocação natural para provocar o riso, em um caminho que meio que só poderia ter dado mesmo no que deu.
“Bussunda era um recordista de empatia”, define o amigo e diretor da série. “Não era de chegar causando, mas, no sapatinho, ele ia dominando os espaços. Ele tinha um relaxamento natural, diria até uma preguiça humorística, uma coisa meio bonachona – mas, ao mesmo tempo, uma rapidez de raciocínio e uma originalidade no olhar que nunca tinham nada de forçado. E ele gostava de tornar as coisas mais divertidas, brincava no trabalho, fazia comentários divertidos sobre coisas sérias. Era um cara realmente raro”, recorda.
Uma abordagem que, como sabemos, marcou época no humor brasileiro. E que, na parte final da série, se transforma em reflexão sobre o Bussunda que poderia ter sido, nesses 15 anos após sua partida. “É aquela especulação: se o Pelé jogasse hoje, ainda seria o Pelé? Sempre falo que, a não ser que o Bussunda tivesse sofrido uma lesão cerebral grave, ele continuaria sendo hoje a mesma pessoa inteligente, rápida, sagaz que era ao observar o mundo, mas a partir das situações e contextos de agora. Mesmo as coisas que a gente tinha escrito no passado: em muitas, a gente já tinha mudado o olhar com o passar do tempo, inclusive com a paternidade, a vida adulta. Mas ele sempre teve essa coisa de gostar de ser metralhadora giratória no humor. Acho que a gente ainda estaria rindo juntos, não sei de quem, em qual nicho, apanhando de quem.”