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Cultura

- Publicada em 18 de Abril de 2021 às 20:08

Os 135 anos do modernismo da Pasárgada de Manuel Bandeira

Escritor teria sido arquiteto caso não tivesse tido contato com poesia quando foi à Suíça tratar tuberculose

Escritor teria sido arquiteto caso não tivesse tido contato com poesia quando foi à Suíça tratar tuberculose


DIVULGAÇÃO/ARQUIVOO LYGIA FAGUNDES TELLES/IMS
Roberta Requia
Mesmo não participando da Semana de Arte Moderna, evento símbolo do Modernismo no Brasil, Manuel Bandeira permanece na história como importante representante desse movimento. Nascido há 135 anos, completados nesta segunda-feira (19), em Pernambuco, queria na verdade seguir os caminhos do pai na engenharia, tendo ingressado no curso aos 18 anos.
Mesmo não participando da Semana de Arte Moderna, evento símbolo do Modernismo no Brasil, Manuel Bandeira permanece na história como importante representante desse movimento. Nascido há 135 anos, completados nesta segunda-feira (19), em Pernambuco, queria na verdade seguir os caminhos do pai na engenharia, tendo ingressado no curso aos 18 anos.
Porém, antes de conseguir realizar a vontade de assentar residência fixa após uma vida de muitas mudanças na família Bandeira, a doença que deixou marcas nas obras de muitos artistas e poetas desde o século XVIII assolou também o jovem Manuel. Diagnosticado com tuberculose, começou uma peregrinação pelos antigos sanatórios que tratavam a doença.
Até então, os tratamentos para a doença eram pouco convencionais e a recomendação médica era de que os doentes permanecessem em regiões serranas, por conta do ar. Até a década de 1940, quando os primeiros tratamentos contra a doença começaram a ser desenvolvidos, havia poucas alternativas para os infectados.
Em alguns dos principais trabalhos de sua vasta obra poética, é possível encontrar referências diretas aos períodos de doença. O professor e escritor Pedro Gonzaga cita o poema Pneumotórax como uma destas células. "Todos os amantes da poesia brasileira vão lembrar de Pneumotórax, quando o assunto é tuberculose. Um médico, um quê insensível e debochado, a fazer os procedimentos de auscultação do pulmão. No entanto, neste mesmo poema está um verso que define a presença da tuberculose (e da morte) na poética de Bandeira: 'a vida inteira que podia ter sido e que não foi'", comenta Gonzaga.
Ele também relembra dos mesmos traços em seu poema mais famoso, Vou-me embora pra Pasárgada, e em Testamento, onde escreve: "Criou-me, desde eu menino,/ Para arquiteto meu pai./ Foi-se-me um dia a saúde/ Fiz-me arquiteto? Não pude! Sou poeta menor, perdoai!".
Em uma entrevista ao jornalista Homero Senna da extinta revista O Jornal, em 1969, Bandeira revela que sua ida para a Suíça em busca de tratamento para a tuberculose foi custeada com os últimos recursos financeiros do pai: "Durante muitos anos vivi provisoriamente. Hemoptises, tosse, febre, desesperança. Andei de ceca em meca, alopatia, homeopatia, e em junho de 1913 segui para um sanatório suíço. Meu pai ganhava um conto e novecentos. A passagem, ida e volta, custava 900 mil réis. O sanatório, com balcão e quarto, 360 mil réis que valiam 600 francos suíços. Com a guerra (1ª Guerra Mundial) o franco dobrou e eu não pude continuar lá. Foi quando perguntei ao Dr. Bodmer: 'Quanto tempo de vida o senhor me dá?' A resposta: 'O senhor tem lesões teoricamente incompatíveis com a vida, mas nenhum sintoma alarmante. Pode durar uns cinco dez anos'. Calcule!", escreveu Bandeira.
Acontece que a ida para a Suíça é decisiva para sua entrada na Literatura. Lá morou entre 1913 e 1914, quando se tornou amigo do poeta francês Paul Éluard, que lhe apresenta a literatura de vanguarda francesa.
Quando voltou ao Brasil, passou a morar no Rio de Janeiro, cidade pela qual era apaixonado. Em 1917, estreou seu primeiro livro de poemas: A cinza das horas, com um total de apenas 200 exemplares custeados por ele mesmo.
Em 1922, já amigo íntimo de Mário de Andrade, não quis viajar até São Paulo para participar da Semana de Arte Moderna. Porém, seu poema Os Sapos, uma crítica aos parnasianistas, foi declamada por Ronald de Carvalho na abertura do evento. "Gosto de acreditar que é preciso considerar o segundo modernismo também, o de 1930, para falarmos em uma contribuição plena dos poetas para a renovação de nossa literatura. Neste sentido, Bandeira e Drummond são os maiores modernistas", explica Pedro Gonzaga.
Para ele, a obra de Bandeira entre as duas décadas, 1920 e 1930, representa em sua melhor versão o puro modernismo brasileiro. "Os três Andrades (Mario, Oswald e Drummond), embora mais radicais em seus procedimentos estéticos, e igualmente imbuídos da necessária ideia de descobrir o Brasil por meio da valorização da fala e da cultura popular, não me parecem, no aspecto da dicção, terem encontrado a fluidez de Bandeira", declara.
O jovem de 18 anos que sonhava em cursar desenho não conquistou o título de arquiteto. Foi escritor, poeta, ensaísta, crítico literário, professor e membro da Academia Brasileira de Letras, ao qual tomou posse da cadeira 24, em 1940, posição que ocupou até 1968, quando morreu em decorrência de uma hemorragia gástrica. Seu corpo foi sepultado no mausoléu da ABL.
Com versos que mesclam simplicidade e profundidade na maneira como expressa seus temas, Gonzaga ressalta a importância do conhecimento da obra de Bandeira no período escolar. "É o poeta perfeito para fazer os alunos se aproximarem da poesia. Um poema como O bicho, com sua aparente simplicidade, traz todos os elementos que um professor precisa para apresentar o grande poder da lírica a quem está começando (concisão, poder de surpresa, imagética, sonoridade), com a virtude de ainda não exigir os conhecimentos formais que a poesia mais clássica tem por compromisso", e completa: "É um poeta que nos ensina a lidar ternamente com esta complexidade existencial, será sempre um gigante. Além disso, o mergulho na experiência cotidiana tenta tornar mais compreensível o tema do poema".
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