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Cultura

- Publicada em 16 de Outubro de 2020 às 17:24

Gal Oppido cria publicação inspirada na antiga arte japonesa

'Pequeno dicionário erótico ilustrado japonês português japonês' usa verbetes como ponto de partida para ilustrações

'Pequeno dicionário erótico ilustrado japonês português japonês' usa verbetes como ponto de partida para ilustrações


GALERIA LUME/DIVULGAÇÃO/JC
Igor Natusch
Um dicionário é, por óbvio, um objeto cheio de significados - e de imagens, embora talvez elas não pareçam tão óbvias à primeira vista. Foi enxergando o que há de visual entre os verbetes que o fotógrafo e artista visual Gal Oppido criou seu Pequeno dicionário erótico ilustrado japonês português japonês (Galeria Lume, 28 págs., R$ 100,00), no qual as palavras se unem em desenhos inspirados no shunga, xilogravuras japonesas de conteúdo sexual que remontam ao século XVII.
Um dicionário é, por óbvio, um objeto cheio de significados - e de imagens, embora talvez elas não pareçam tão óbvias à primeira vista. Foi enxergando o que há de visual entre os verbetes que o fotógrafo e artista visual Gal Oppido criou seu Pequeno dicionário erótico ilustrado japonês português japonês (Galeria Lume, 28 págs., R$ 100,00), no qual as palavras se unem em desenhos inspirados no shunga, xilogravuras japonesas de conteúdo sexual que remontam ao século XVII.
A obra traz também uma série de poemas de Celina Ishikawa - que, ao invés de serem ilustrados, acabam ajudando a ilustrar as artes de Oppido, em mais uma das muitas provocações de uma obra singular. O livro foi produzido entre março e junho deste ano, no auge da pandemia do novo coronavírus no País. A peça gráfica traz páginas soltas, criando um impacto visual semelhante ao de uma coleção de cartões ao estilo japonês.
Para as ilustrações, Oppido escolheu como ponto de partida palavras ligadas ao shunga e, com seu traço, foi desenhando sobre as páginas do dicionário, criando conexões com palavras do entorno. Assim, além da camada visual, há também um elemento textual, com conjuntos de palavras capazes de evocar sentidos que complementam a experiência visual.
O trajeto que levou a esse dicionário, digamos, ricamente ilustrado é bastante incomum. O volume original pertenceu à artista plástica Sachiko Koshikoku e a seu marido, Michio Osawa, um fotógrafo que chegou a documentar a família real japonesa em visita ao Brasil. Desenvolvendo há vários anos o projeto Shunga, serenos e ofegantes, que usa a arte japonesa como ponto de partida, Gal Oppido se uniu aos esforços para arrecadar recursos para o tratamento de Sachiko, que sofria de câncer.
Após o falecimento da artista, em agosto do ano passado, Oppido acabou sendo convidado para avaliar o acervo do casal, com vistas a uma possível doação. "Expliquei que o material tinha muito uso, estava bem desgastado e seria dificultoso dar destino a ele", conta Oppido, em entrevista ao Jornal do Comércio. "Me foi dito, então, que eu poderia ficar com o que me interessasse. Acabei ficando com esse dicionário e com uma outra revista de fotografia, da década de 1960, muito pelo trabalho que desenvolvo sobre shunga", acrescenta.
A presença do dicionário acabou virando, de forma inesperada, uma provocação artística para seu novo dono. "O dicionário físico é uma nuvem semântica, como diz o (compositor e ensaísta) José Miguel Wisnik. Várias palavras acabam convivendo naquelas páginas duplas. Fiquei impressionado pelo fato do volume ter sido muito usado, e pensando em como ele tinha sido uma interface para acessar um novo país, a partir da língua pátria", explica. "Eu estive desenhando muito durante a pandemia, e o dicionário ficava sempre a poucos metros dos meus olhos. Aí, como eu sempre gostei de desenhar em superfície, resolvi abri-lo e fazer uma seleção de palavras que tivessem ligação com o universo do shunga."
A próxima etapa foi chamar Celina Ishikawa, que criou pequenos versos eróticos a partir de cada palavra-chave escolhida originalmente pelo ilustrador. Na hora de dar acabamento ao livro, Oppido optou por um formato que remetesse às embalagens tradicionais japonesas - "uma peça muito concisa, sintética e que tivesse um ritual de manuseio", afirma. O resultado final é, nas palavras do autor, uma espécie de objeto-tributo a Sachiko Koshikoku e Michio Osawa, que reinventa criativamente um objeto que marcou a trajetória de ambos no Brasil - além de, é claro, propor novas camadas de significado a essa interação entre culturas (aparentemente) tão distantes.
Do mesmo modo que um dicionário (erótico ou não) se desdobra em diferentes direções, o Pequeno dicionário erótico ilustrado japonês português japonês deve ganhar outros contornos no futuro próximo. Alguns versos de Celina, com acento pronunciado para o feminino ou masculino, devem ser transformados em vídeo, com trilha sonora de Ricardo Severo. "Mais adiante, eu penso em dar desdobramento como coreografia, já que eu fotografo dança com frequência também. São uma série de vetores, em suportes diferentes", explica.
E a revista dos anos 1960, que Oppido tomou para si junto com o dicionário de Sachiko e Michio, também vai virar arte em breve. A ideia, que o artista descreve como "uma espécie de revista-revista", está sendo desenvolvida ao lado da pesquisadora de cultura japonesa Christine Greiner. Resta aguardar para ver de que modo será concretizada mais essa ponte entre mundos: Japão e Brasil, palavra e imaginação.
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