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Cultura

- Publicada em 02 de Setembro de 2020 às 17:34

Eduardo Galeano, que completaria 80 anos, marcou a identidade latino-americana

'As veias abertas da América Latina' (1971) foi o livro mais famoso do escritor uruguaio

'As veias abertas da América Latina' (1971) foi o livro mais famoso do escritor uruguaio


GABRIELA DI BELLA/ARQUIVO/JC
Roberta Requia
Um dos maiores escritores da América Latina, o uruguaio Eduardo Galeano estaria completando 80 anos nesta quinta-feira, caso estivesse vivo. Falecido em 2015 de edema pulmonar, Galeano foi jornalista e autor de diversas obras que estão entrelaçadas com a história e com a literatura latino-americana. Obcecado pela lembrança e memórias de sua terra, escreveu livros que dão uma perspectiva histórica e cultural para o continente americano e seus habitantes que até hoje enfrentam as consequências do colonialismo.
Um dos maiores escritores da América Latina, o uruguaio Eduardo Galeano estaria completando 80 anos nesta quinta-feira, caso estivesse vivo. Falecido em 2015 de edema pulmonar, Galeano foi jornalista e autor de diversas obras que estão entrelaçadas com a história e com a literatura latino-americana. Obcecado pela lembrança e memórias de sua terra, escreveu livros que dão uma perspectiva histórica e cultural para o continente americano e seus habitantes que até hoje enfrentam as consequências do colonialismo.
E são dessas características que nasce seu livro mais famoso, considerado como uma "bíblia" da intelectualidade latino-americana. Lançado em plena ditadura militar, no ano de 1971, o livro As veias abertas da América Latina foi banido durante as ditaduras do Chile, Argentina, Brasil e no próprio Uruguai, motivo pelo qual Galeano precisou se exilar na Espanha durante alguns anos.
E é nesse período que o escritor produz um documento que desenterra acontecimentos históricos do continente, desde a exploração desenfreada de metais preciosos nos territórios inca e maia, como a devastação de populações nativas por doenças trazidas pelos europeus. Galeano escorre sobre fatos e traumas que se fixaram nas entranhas da América Latina.
Para Ruben Castiglioni, professor de Literaturas de Língua Espanhola da Ufrgs, o texto da pesquisadora Ana Maria Vara esclarece a maneira como o livro se organiza. Ela menciona que As veias abertas... constituiu uma visão alternativa da histórica da América Latina, que se constrói em cima de sua estrutura narrativo-argumentativa reeditando, explicando e organizando um discurso verbal que já estava estabelecido no momento da publicação da obra. O texto quebra com o tradicional e inaugura uma visão antiimperiaalista e latinoamericanista que influenciou estudiosos, sociólogos e escritores que usariam seu livro como documento.
Para o professor de História Contemporânea da Ufrgs Enrique Padrós, o momento de efervescência política que o mundo vivia no momento da publicação da obra esclarece as inquietudes expressadas por Galeano. Além dos acontecimentos na América Latina, a Guerra Fria estava em seu clímax com a escalada de tensão entre Estados Unidos e União Soviética. Ecoavam pelo mundo processos de descolonização, a Guerra do Vietnã, a explosão do movimento negro dos Estados Unidos e o maio francês de 1968. Segundo Padrós, "a América Latina, de forma geral, estava marcada por uma série de aspectos históricos que, com certos matizes e raras exceções, eram comuns ao conjunto de países da região: uma exponencial desigualdade social, altos índices de concentração de riqueza, salários e condições precárias de trabalho, sistemas políticos pouco democráticos e significativa influência/interferência direta ou indireta dos Estados Unidos".
Esse contexto socioeconômico, aliado ao temperamento dos regimes ditatoriais, cuja essência é defender o capital e a propriedade, é a fagulha do incêndio que faz As veias abertas da América Latina virar uma combustão. Para Padrós, que também é professor do Programa de Pós-Graduação e pesquisador sobre as ditaduras do Cone Sul, a necessidade de explicar o presente no qual o continente se encontrava foi o fio da meada que levou o autor a mergulhar no processo histórico decadente das Américas. "O livro foi pensado por Galeano como um relato, sustentado em extensa pesquisa e consulta de fontes, que servisse de contraponto a uma versão formalista e acadêmica da história. Processo esse que silenciava sobre os mecanismos de exploração, os interesses existentes por detrás deles e as responsabilidades políticas, tanto no plano nacional quanto na dimensão maior do sistema capitalista internacional", afirma o professor.
Nas vésperas dos 50 anos de sua primeira publicação, a obra mais famosa de Galeano mantém o questionamento sobre a situação sócio-econômica dos países latino-americanos. Para Padrós, mesmo que a obra não tenha sido escrita como um panfleto ou manifesto político, seu conteúdo acabou servindo de argumento para uma crítica do processo histórico: "A onda neoliberal/extrema direita que tomou conta da maioria dos países a seguir recoloca a projeção da longa sombra dos Estados Unidos sobre a região. A possibilidade de certa autonomia no cenário internacional se esvaiu rapidamente".
Como exemplo desses aspectos, o pesquisador cita a concentração urbana e seus problemas derivados, a situação de genocídio contra os povos originários e a negação ao seu direito de existência, assim como a agressão ao meio ambiente e a privatização do Estado em si.
Novas mudanças ocorreram no período de 50 anos da publicação de As veias abertas da América Latina. Mesmo assim, o livro se mantém como uma referência para compreender os períodos históricos do continente assim como seus desdobramentos sociais no século XXI. Como indicado pelo professor de História, a obra pode servir como porta de entrada para a compreensão da América Latina: "Sejamos realistas, o livro incomoda, sim. Mas muito mais incomoda o lugar que ocupa o escritor na consciência, no afeto e na memória que lhe dedicam gerações de excluídos da região", indica o acadêmico.
Em celebração ao aniversário do autor, o Sarau Voador Virtual homenageia Eduardo Galeano hoje. Debora Finocchiaro e Roger Lerina recebem, a partir das 20h, em transmissão on-line pelo canal do YouTube do projeto, o escritor e cineasta Felipe Nepomuceno, que, em 2018, estreou o longa Eduardo Galeano Vagamundo, documentário sobre a vida do uruguaio.
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