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Cultura

- Publicada em 31 de Agosto de 2020 às 16:32

Roger Monteiro apresenta fragmentos da imaginação em novo livro

Em '99 quase contos', autor traz relances de histórias com personagens à margem da existência

Em '99 quase contos', autor traz relances de histórias com personagens à margem da existência


/MARCO FREITAS/DIVULGAÇÃO/JC
Igor Natusch
Por vezes, a literatura exige a própria presença. Em meio ao esforço cinzento dos dias ou do trabalho braçal em outras tarefas mais urgentes com a palavra, a mente do escritor se vê confrontada com a ponta de um novo novelo literário, ou mesmo com o fragmento de uma história provocando a imaginação.
Por vezes, a literatura exige a própria presença. Em meio ao esforço cinzento dos dias ou do trabalho braçal em outras tarefas mais urgentes com a palavra, a mente do escritor se vê confrontada com a ponta de um novo novelo literário, ou mesmo com o fragmento de uma história provocando a imaginação.
É dessas intromissões que surge 99 quase contos (HorrorVacuo, 208 págs., R$ 29,99), lançamento do porto-alegrense Roger Monteiro, à venda na Amazon e no Mercado Livre. Trechos indefinidos de enredos dos quais só se vê o relance são, ainda assim, histórias com começo, meio e fim - embora não necessariamente nessa ordem, e nunca todos ao mesmo tempo.
Nessa coleção de fragmentos, surgem personagens que existem em um mundo à margem, vivendo (ou sobrevivendo a) situações limítrofes. "Meu universo narrativo existe em uma zona entre certo e errado, social e misantrópico, adequado e inadequado. São personagens que oscilam muito, e que só fazem sentido em um contexto que oscile junto com eles", afirma o autor.
Monteiro conta que o livro acabou tomando forma "meio que por acidente", quase sem que percebesse: "Dentro de outras escritas em que eu estava trabalhando, às vezes surgiam pequenos trechos, que não se encaixavam naquilo que estava fazendo, mas que não deixavam de ser interessantes. Passei a guardar esses fragmentos, pensando no futuro", lembra.
Em paralelo, a concepção do escritor sobre o leitor contemporâneo foi sofrendo algumas modificações, o que também entrou no caldeirão imaginativo de 99 quase contos. "Temos que entender que o leitor tem a nos oferecer um tempo muito menor do que no passado. Ele está exposto a uma quantidade de estímulos absurda, o poder de concentração é muito menor do que era há algumas gerações. Temos duas escolhas: virar o louco gritando no deserto e esperar que leiam da mesma forma que nossos pais e avós liam, ou fazer com que o texto dialogue com essa realidade."
Diante desse dilema, Monteiro escolheu a segunda opção. E passou a trabalhar com mais cuidado essas histórias sucintas, carregadas de elementos visuais - e desapegadas da ortodoxia de uma obra literária que começa em um ponto e termina no outro.
"Os gêneros literários sofreram modificações (a partir da falta de tempo do leitor). Textos que eram considerados curtos, como um conto, talvez já pareçam longos se comparados com os que circulam em redes sociais. O famoso 'textão' de Facebook é algo mais curto do que um conto machadiano, por exemplo, e, mesmo assim, ainda é longo demais para muitos leitores", pondera.
Ao se expandirem além das fronteiras até certo ponto confortáveis da literatura, essas reflexões nos dizem algo sobre o próprio autor. Designer gráfico, artista plástico, fotógrafo e roteirista, ele se move entre diferentes universos criativos - o que já rendeu produções tão díspares quanto as exposições individuais Porn? No.Graphics (2014) e Mutabilis (2020) e o roteiro do curta Kassandra (2013), premiado nos festivais de Brasília e Gramado e que virou graphic novel no ano seguinte.
"O que há de semelhante entre escrever um roteiro e escrever literatura é que são dois processos solitários", diz. "Mas a escrita para o cinema tem a peculiaridade de não ser um fim, mas um instrumento. O roteiro não é uma obra acabada: é um guia, um manual, que só vai se concretizar por um esforço criativo coletivo. É um texto feito para ser dito e escutado, diferente de um para ser lido, que exige um grau de lapidação estética maior."
De fato, 99 quase contos traz uma série de histórias que se insinuam, que sugerem a si mesmas na mente de quem lê - histórias para serem lidas, mas também imaginadas, exigindo pausas entre uma página e outra. E que podem inclusive formar, umas com as outras, pedaços maiores de coisas insuspeitadas.
"São histórias de personagens, muito mais do que de situações. Às vezes, são personagens recorrentes, e é possível imaginar relações entre eles, é possível juntar alguns quase contos para montar narrativas maiores. E isso não significa que foram escritos para que isso aconteça, mas é da natureza deles que essa possibilidade esteja sempre em aberto", destaca.
Como pedaços surgidos em meio a outros textos, esses quase contos falam também das histórias que virão. A pandemia, para Monteiro, tem sido um período produtivo: já concluiu o roteiro de alguns curtas e um longa, e ensaia o mergulho em uma nova história - que ele próprio encontrou em meio às insinuações dos fragmentos.
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