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Cultura

- Publicada em 17 de Agosto de 2020 às 21:31

Honoré de Balzac e a escrita enquanto trabalho braçal

Falecido há 170 anos, o francês entregou sua vida à literatura - talvez até literalmente

Falecido há 170 anos, o francês entregou sua vida à literatura - talvez até literalmente


LOUIS BOULANGER/MUSÉE DES BEAUX-ARTS DE TOURS/DIVULGAÇÃO/JC
Igor Natusch
Se existe uma pessoa na história da arte que poderia dizer de si mesma que morreu de tanto trabalhar, essa pessoa seria Honoré de Balzac. Aliás, não se pode dizer que a morte do escritor francês - ocorrida há exatos 170 anos, no dia 18 de agosto de 1850 - tenha sido surpreendente ou mesmo inexplicável: o autor sofreu com problemas de saúde durante praticamente toda a vida, decorrência direta de um ritmo de trabalho enlouquecedor, para dizer o mínimo. Embora festejado já em vida, Balzac não conseguiu colher grandes frutos de sua trabalheira, passando seus dias em um esforço permanente para pagar as contas.
Se existe uma pessoa na história da arte que poderia dizer de si mesma que morreu de tanto trabalhar, essa pessoa seria Honoré de Balzac. Aliás, não se pode dizer que a morte do escritor francês - ocorrida há exatos 170 anos, no dia 18 de agosto de 1850 - tenha sido surpreendente ou mesmo inexplicável: o autor sofreu com problemas de saúde durante praticamente toda a vida, decorrência direta de um ritmo de trabalho enlouquecedor, para dizer o mínimo. Embora festejado já em vida, Balzac não conseguiu colher grandes frutos de sua trabalheira, passando seus dias em um esforço permanente para pagar as contas.
Ainda assim, a rotina extenuante rendeu frutos. Sua obra, além de festejada, é extensa: composta de quase 150 volumes, entre textos completos e narrativas inacabadas, A comédia humana é um dos painéis sociais mais colossais de se que tem notícia, e livros como A mulher de trinta anos (que deu origem ao termo 'balzaquiana'), O pai Goriot e Ilusões perdidas são até hoje influência para novos escritores.
Para Honoré Balzac, a literatura surgiu não apenas como expressão artística, mas como uma forma de ascensão à nobreza. A partícula 'de', aliás, foi incluída por conta própria, em 1829, logo após o falecimento de seu pai Bernard-François: na mente de Honoré, isso dava a seu nome uma sonoridade mais nobiliárquica. O problema é que, ao contrário de outros escritores notáveis de seu tempo, Balzac não teve grande suporte financeiro para desenvolver seus talentos. Após recusar a oportunidade de ser aprendiz de Direito em sua Tours natal, o então jovem aspirante às letras decidiu ir a Paris, em abril de 1819, com uma mesada familiar paupérrima que duraria apenas um ano.
Desde o início, Balzac teve que se virar. E isso, além de dar a ele uma visão profunda e multifacetada sobre a natureza humana, rendeu uma série de boas histórias para seus cronistas futuros. Na juventude, escreveu histórias escandalosas de consumo rápido, fazendo uso de pseudônimos, e envolveu-se em uma série de projetos ligados (ou não) à literatura; nenhum deles deu certo, e as dívidas acumuladas o perseguiriam por toda a vida. Embora bem quisto por seus contemporâneos, em especial os colegas de escrita, Balzac não era muito de frequentar a alta roda parisiense: mesmo que eventualmente estivesse disposto a deixar de lado a personalidade reservada, o fato é que ele não tinha muito tempo para socializar.
A puxada rotina de trabalho de Balzac tornou-se lendária. Diz-se que preferia fazer uma refeição leve ao fim do dia e deitar-se logo ao anoitecer, para sair da cama no começo da madrugada. Com o silêncio da noite como aliado, disparava a escrever de forma quase impulsiva. Após rabiscar até não aguentar mais, se dedicava a corrigir as provas do que tinha escrito no dia anterior, não raro fazendo longas correções que enlouqueciam seus editores. Em uma dessas jornadas noite adentro, escreveu a novela O ilustre Gaudissart em um único dia - o que, segundo cálculos de especialistas, dá uma média impressionante de mais de 33 palavras escritas por minuto. Em outros momentos, com as contas batendo à porta, adotava regimes ainda mais desgastantes: em uma nota que tornou-se célebre, lamentava ter sido forçado a trabalhar por longas 48 horas, sem dormir e quase sem pausas para respirar.
Para dar conta de semelhante ritmo produtivo, o escritor recorria ao café. Muito, muito café, e muito, muito forte: talvez desse até para usar a bebida como tinta, caso a pena de Balzac precisasse de um reforço nesse sentido. Em seu Tratado dos excitantes modernos, o autor fala sobre o poder estimulante de comer o pó do café puro, às colheradas, no máximo diluído em algumas poucas gotas de água - um método que ninguém haverá de duvidar ter sido experimentado pelo próprio Balzac em situações de maior desespero.
A nobreza literária veio, mas a duras penas. Seu primeiro sucesso, Eugénie Grandet, só viria em 1833, depois de mais de 30 obras publicadas, e nunca fez dinheiro suficiente para zerar as dívidas. Seu longo relacionamento com a nobre polonesa Evelina Hanska foi igualmente angustiante: ela era casada e, mesmo depois da viuvez, uma série de obstáculos atrasou o matrimônio com Balzac. Quando finalmente se casaram, em março de 1850, a saúde do escritor já estava deteriorada; cinco meses depois, destroçado pela gangrena e por problemas cardíacos, Balzac faleceu. Uma vida dedicada a seu trabalho, em uma intensidade que poucos artistas poderão (ou mesmo desejarão) igualar - mas que, ainda bem para nós, rende intermináveis horas de leitura, no melhor sentido possível.
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