O preço da verdade - Dark waters é uma das histórias mais fortes de 2019, que chega agora ao Brasil e que merecia ser retratada como uma produção audiovisual. O filme é protagonizado por Mark Ruffalo, contando com a direção de Todd Haynes.
Baseado no artigo O advogado que virou o pior pesadelo da DuPont (tradução livre de The lawyer who became DuPont's worst nightmare), de Nathaniel Rich e publicado pela revista do The New York Times, a história mostra o impacto que a empresa química DuPont causou em uma comunidade da Virgínia Ocidental com o despejo de produtos químicos em um rio, ameaçando a vida humana.
O longa é também produzido por Ruffalo, e talvez esse seja o principal motivo para ele protagonizar a obra como o advogado Robert Billot. É ótimo poder ver a força do ator em cena, algo que não é comum para alguém que é mais notabilizado pelos papéis coadjuvantes - que lhe renderam indicações ao Oscar pelas atuações em Minhas mães e meu pai (2011), Foxcatcher - Uma história que chocou o mundo (2015) e Spotlight - Segredos revelados (2016). Em O preço da verdade - Dark waters, Ruffalo internaliza muitos sentimentos e os expressa nas sutilezas do personagem, que dedica anos da vida e da carreira para encontrar a solução do caso, ficando comprometido mental e fisicamente.
A obra se constrói com elementos de um instigante thriller de denúncia, com aspecto sombrio e sem vida, também expressado e fortalecido pela escolha da música Country roads em certo momento do longa, além da coloração azulada, que passa uma percepção de que algo está morto. A trilha é outra técnica que potencializa tal ambientação, sendo utilizada de forma pontual e bem executada, ampliando a tensão e o drama.
A história é muito bem desenvolvida, mas tem um momento conflitante quando o advogado explica o caso para sua mulher; a montagem é bem realizada, mas a história fica muito expositiva nesse trecho em pouco espaço de tempo, tendo informações repetidas em um momento final da obra. O maior problema é quando Billot explica para personagens que já sabem sobre o que está falando do que se trata, algo de certa forma compreensível para a produção, que está apresentando ao público o tema, e pelo fato de o protagonista tentar passar a ideia de que tem conhecimento do caso para um dos culpados. O filme pode apresentar alguns temas complexos de serem compreendidos pelo público brasileiro, que não é tão familiarizado com a justiça norte-americana, mas isso é superado pela narrativa atrativa.
Quanto mais Billot entra no caso, mais sujeira vai se revelando. E é nesses momentos que a personagem de Anne Hathaway ganha importância, tendo três cenas muito fortes, fora outros momentos espalhados pelo filme, em que ela sai de seu papel de mãe e esposa, voltando a ser a advogada que era antes de se tornar dona de casa. Anne é um nome que poderia ter sido considerado para a temporada das premiações. Tanto ela quanto Tim Robbins têm falas marcantes, que só ressaltam a capacidade de atuação de ambos.
É interessante o destaque, em doses menores, do drama do fazendeiro Wilbur Tennant (Bill Camp), que se torna uma persona non grata em sua comunidade. O drama dele até poderia ser mais abordado, mostrando mais sobre o lado de sua família e como ela é afetada. Isso seria possível caso o longa tivesse mais tempo de tela do que as duas horas existentes, com uma história com potencial para uma minissérie. Outro problema a ser destacado é justamente sua duração, que acaba deixando a meia hora final mais acelerada do que a história pedia.
Trata-se de uma fórmula conhecida? Sim, mas O preço da verdade - Dark waters sabe fazer uso disso para envolver a audiência. Conta também com certas semelhanças estruturais ao filme britânico Segredos oficiais, um excelente longa lançado em 2019 no Brasil.
Esse é o tipo de história em que o cinema tem papel fundamental, por apresentar ao público uma situação verídica, que faz refletir até onde vai a ganância. Filmes que tratam da temática sobre obsessão são interessantes, mas, quando baseados em fatos reais, podem se tornar ainda mais assustadores.