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Cultura

- Publicada em 26 de Dezembro de 2018 às 21:37

'Isso aqui é a minha vida', diz diretor artístico da Ospa

Confirmado à frente da Ospa, maestro Evandro Matté destaca os avanços da orquestra

Confirmado à frente da Ospa, maestro Evandro Matté destaca os avanços da orquestra


MARILIA LIMA/DIVULGAÇÃO/JC
Caroline da Silva
Antes de ter sua continuação confirmada pela futura Secretária de Estado da Cultura, Beatriz Araújo, na direção artística da Orquestra Sinfônica de Porto Alegre (Ospa) para a próxima gestão – fato ocorrido em 21 de dezembro –, o maestro Evandro Matté concedeu entrevista ao Jornal do Comércio para um balanço dos últimos quatro anos.
Antes de ter sua continuação confirmada pela futura Secretária de Estado da Cultura, Beatriz Araújo, na direção artística da Orquestra Sinfônica de Porto Alegre (Ospa) para a próxima gestão – fato ocorrido em 21 de dezembro –, o maestro Evandro Matté concedeu entrevista ao Jornal do Comércio para um balanço dos últimos quatro anos.
Foi um período de diversas conquistas: a Casa da Música da Ospa, a nova sede da Escola de Música no Palacinho (localizado na esquina da Cristóvão Colombo com a Santo Antônio), a gravação do CD da orquestra (após um hiato de 20 anos sem discos, cujo lançamento deve ser no início de 2019), o resgate do piano Steinway na Justiça, a nomeação em 2017 de 27 novos instrumentistas, a concessão de naming rights da Sala Sinfônica para o Banrisul pelos próximos quatro anos e aumento no número de atividades da temporada (como a apresentação de óperas).
Matté tem no antebraço uma batuta tatuada há quase o mesmo tempo que é diretor artístico da Ospa, mas lembra que, antes de tudo, é músico concursado da orquestra, e seu cargo é de definição política, uma escolha do Secretário de Cultura ou do próprio governador. Naquele momento de indefinição, tinha grande expectativa para dar continuidade aos projetos encaminhados. Sobre a reunião na sexta-feira passada, contou que foi excelente e disse estar muito feliz por seguir na função durante o próximo governo. 
JC Panorama – Como ficam para a próxima gestão questões que já estavam alinhavadas para o espaço no Centro Administrativo Fernando Ferrari (CAFF), como o Memorial da Ospa e a reforma de acesso à Sala Sinfônica Banrisul?
Evandro Matté – Nesses quatro anos, conseguimos resolver demandas históricas da Ospa, que completou 68 anos em 23 de novembro. Nós não tínhamos casa, não tínhamos uma estrutura adequada para o trabalho.
Panorama – As soluções vieram com a inauguração em março deste ano da Casa da Música da Ospa no Centro Administrativo (Borges de Medeiros, 1.501)?
Matté – Sim. Esses processos são sempre muito complexos, burocráticos. E, principalmente, por nós vivermos um momento em que o Estado não tem capacidade de investimento, nós dependemos, durante toda esta gestão, da busca do recurso na iniciativa privada, ou através de lei de incentivo ou por doação direta. Nós alinhavamos todo um planejamento, em que o ideal era ter sido realizado tudo agora. Não foi possível, pois tivemos um momento difícil nos dois últimos anos com a economia. No sentido de que a captação foi muito mais dificultosa do que vinha sendo nos anos anteriores. Não conseguimos atingir todos os objetivos. De qualquer forma, entregamos a Sala, numa condição boa e adequada do ponto de vista técnico, acústico, de frequência de público. Existe hoje uma estrutura que contempla o que a Ospa precisa. Porém, o projeto é muito maior. Ainda não estão feitos os acabamentos internos, e a iluminação precisa ser ampliada.
Panorama – Mas a primeira etapa foi concluída?
Matté – Na verdade, a primeira fase foi quando fizemos a sala de ensaio aqui. A segunda foi transformá-la numa sala de concerto. Existe a terceira, que é o complexo todo da Casa da Música, envolvendo uma ampliação de 800 metros quadrados para a lateral. Nas salas laterais aqui do CAFF, nós vamos fazer salas de ensaio, de estudo, nova Sala para o Coro Sinfônico e para Ospa Jovem; mais uma sala de recitais para o público, banheiros novos, a implementação do café e do restaurante e uma estrutura de elevadores, tanto do estacionamento externo quanto interno, que hoje não está sendo utilizado. O complexo tem aqui embaixo tem 300 vagas de estacionamento coberto, mas precisa ter uma reforma no acesso. Esta terceira fase também contempla a vinda da administração da Ospa para cá, dentro desta nova área. Uma coisa absurda é que nossa musicoteca (as partituras) fica na administração, que hoje segue na sede na 24 de Outubro. Aqui, haveria um espaço especial para a musicoteca.
Panorama – Como viabilizar a terceira etapa?
Matté – Estendemos todos os nossos acordos de patrocínio para a próxima gestão; isso é uma novidade dentro da fundação. Tradicionalmente, é um problema do Brasil, os governos findam e o próximo começa do zero. Claro, como eu sou da casa, eu sou músico da Ospa, a minha relação com a Fundação é diferente. Isso aqui é a minha vida, me dá sempre o desejo de fazer sempre o máximo que eu puder pela orquestra pelo vínculo que eu tenho com ela. Trabalhamos independentemente de uma troca que pudesse haver.
Panorama – Por exemplo?
Matté – Fizemos a negociação do naming rights da Sala Sinfônica, que é Banrisul. Há um contrato para a frente. Tivemos recentemente uma LIC (Lei de Incentivo à Cultura RS) aprovada, em que as empresas que estão participando para a continuidade da obra da terceira fase já têm um comprometimento de aportes a partir de janeiro até maio de 2019.
Panorama – Está tudo bem encaminhado?
Matté – Inclusive, os patrocinadores da programação do ano que vem já estão encaminhados, diferentemente de quando eu comecei aqui em 2015. Não tinha acerto de patrocínio.
Panorama – Não poderias adiantar nada da programação?
Matté – Já temos uma base, alguns convites feitos mediante continuidade do processo. A programação seria de março a dezembro. Temos esperança de continuidade para concluir o projeto. Tem muita coisa a ser feita ainda.
Panorama – Terminando todos esses objetivos, a orquestra teria um local ideal para permanecer?
Matté – Isso já está posto, aqui é o local da orquestra. O espaço está cedido por 30 anos. O lugar aqui é maravilhoso, pela circulação, o acesso é fácil. O único risco que tínhamos era a acústica, que ficou ótima, porque o teto, o pé direito não é muito alto. Todos os regentes, internacionais ou não, que vieram aqui falaram, no mínimo, muito bem. A orquestra está adorando a acústica. Então, isso está resolvido.
Panorama – Como é a relação do público com este novo espaço?
Matté – Foi acima da nossa expectativa. Sempre que se vai para um lugar novo, diferente, as pessoas não conhecem. Ainda assim, precisamos fazer um trabalho forte de conhecimento do espaço. Tem muita gente que me conhece pelas orquestras com que eu trabalho, Ospa ou pela Unisinos, e me perguntam onde a Ospa está agora. Ainda não ficou bem claro. Claro que estamos em um processo de pagar as contas, de continuar a obra, não tivemos recurso de investimento para fazer um marketing do espaço. Acho que isso é necessário, precisamos mostrar mais esse espaço para a comunidade e trazê-la aqui para dentro.
Panorama – Mas a mídia apoiou bastante a iniciativa.
Matté – Isso, sim, mas são coisas pontuais. Temos um projeto para a frente que chama Ospa Minha primeira vez. As pessoas que nunca frequentaram a orquestra vão entrar no site e se inscrever. Para cada concerto, teremos um número X de vagas para pessoas serem recebidas duas horas antes da apresentação na futura sala de recitais. Lá, vão aprender sobre a obra a ser interpretada, sobre a orquestra, circular nos bastidores com os músicos, conhecer o palco antes e depois assistir ao concerto. É um programa que queremos fazer para quem ainda não teve contato. Outra ideia é fazer um trabalho através dos conselhos de música de câmara, da Ospa Jovem, do Coro Sinfônico, do Coro Jovem, da Escola da Ospa, de todas essas estruturas que temos, para ter fluxo de pessoas aqui dentro, não exclusivamente para os concertos da orquestra. Também já temos muita procura desse espaço para locação. Temos uma política que ela não pode interferir na programação da Ospa. Quando a Sala Sinfônica estiver livre, ela também poderá ser locada para outro tipo de eventos, empresariais ou não. Isso também vai fazer com que as pessoas conheçam o espaço e, por tabela, saberão que a Ospa está aqui.
Panorama – A casa própria era um sonho antigo. O que significou ele ser realizado em 2018?
Matté – Mudou tudo. É uma sensação muito superior àquela da pessoa que mora de aluguel e compra seu apartamento. É diferente, pois quando você mora de aluguel, pelo menos, você tem um lugar fixo. Sabe que não é teu e não faz investimento lá. Com a Ospa, era cada semana em um lugar.
Panorama – Era uma instabilidade muito grande?
Matté – Completa, com transporte de equipamentos, estragando todo o nosso material, fora a questão da acústica. Artisticamente falando, uma orquestra precisa se ouvir. São 100 músicos no palco. E você aprende desde criança que precisa estar ouvindo o que está acontecendo para se adaptar. Aí, você fazia o ensaio em um determinado lugar que tem uma acústica mais reverberante, e ia fazer o concerto em um local com a acústica seca. Muda tudo, a intensidade do som, a pressão do arco no instrumento, a quantidade de ar que precisa ser soprada. Nós passamos toda a vida – digo toda a vida porque, só para mim, são 27 anos de Ospa – ensaiando de um jeito e na hora do concerto é de outro. Isso é muito ruim, talvez tenha sido o ponto fundamental. Muita gente diz que de março para cá o crescimento artístico da Ospa é enorme. Por quê? Porque ela passa a se ouvir. Ela passa a ter um processo em que aquilo que foi ensaiado é aquilo que é executado. Também tem a questão da temperatura, os instrumentos são muito suscetíveis. Se está muito frio ou muito calor, a afinação muda completamente. Nós não tínhamos essa condição, chegamos a ensaiar em locais em que a temperatura interna era de 5° ou então 30°, insalubre.
Panorama – O que a orquestra precisa primordialmente?
Matté – Uma acústica boa e temperatura adequada. As outras coisas se ajustam. Ter a Casa da Música da Ospa não é só para a felicidade dos músicos, é também resultado no trabalho. Muda completamente, já mudou, e, a cada dia, a orquestra trabalha mais as dinâmicas. Agora, abrem-se novas possibilidades. Podemos criar a venda de temporadas, que em São Paulo chamam de assinaturas e antigamente se chamava “sócios da Ospa”. As pessoas vão poder comprar um pacote de concertos, pois temos certeza das datas e do local. Como íamos vender um pacote de fidelidade antes, sem a certeza de que poderíamos utilizar o espaço? Poderemos oferecer novos produtos. Queremos criar elementos que aconteçam antes e depois dos concertos, o espaço nos permite.
Panorama – O horário do sábado, às 17h, que vem sendo usado, também é favorável.
Matté – Também, para a pessoa não vir somente para a apresentação musical. Uma ideia: teremos um concerto cuja temática será França. Fora da Sala Sinfônica, no saguão, nas salas de recitais, você pode ter literatura francesa, exposição, projeção, gastronomia. O estacionamento coberto também pode ser cobrado. Com a Casa da Música, podemos criar situações de geração de receita, que é isso que a Fundação Cultural Pablo Komlós precisa, ela não pode ficar dependendo do Estado. Antes, tínhamos só geração de despesas...
Panorama – A mudança das aulas da Escola da Ospa para o Palácio do vice-governador, o Palacinho, em julho deste ano, igualmente representou muitos avanços?
Matté – Também foi uma conquista, temos que agradecer muito o governo atual, especialmente ao governador e à primeira-dama. É um paraíso. Na antiga casa, tínhamos sete salas de aula para atender 250 jovens. No Palacinho, são 2.400 metros quadrados. Você entra lá e parece que está no Conservatório de Paris. Sendo que lá, também, futuramente, teremos uma cafeteria pública, gerando receita.
Panorama – A Escola também permanecerá neste novo endereço, não viria ao CAFF?
Matté – O lugar lá é perfeito. Hoje, grande parte dos alunos são da Região Metropolitana, e as paradas de ônibus são próximas do Palacinho. E há uma vantagem: por ser uma edificação antiga, tem as paredes muito espessas. O pé-direito em todas as salas é alto, isso para uma sala de música é perfeito, com acústica boa e sem interferências. Dentro da casa, tinha um salão de baile que foi transformado em sala de recitais. Tem toda uma estrutura, o espaço também nos foi cedido por 30 anos. Qual é o sonho para a próxima gestão? O restauro completo, com as adaptações necessárias para a Escola, trabalhando com IPHAN e IPHAE e Lei Rouanet com linha de Patrimônio. Já fizemos uma boa reforma, e podemos pensar em ampliar para 400 alunos.
Panorama – Outro fato a ser destacado desses últimos tempos?
Matté – Outra conquista que tivemos foi o piano. Ficamos 22 anos esperando por ele, por causa de um processo antigo equivocado. Foi um problema que houve com taxas alfandegárias, em uma história longuíssima, que nos fez perder o piano. Quando entramos nesta gestão, procuramos um Procurador específico do Estado, explicamos o caso, começamos a trabalhar incessantemente e ganhamos uma ação que vinha correndo há muitos anos. Fizemos um acordo com a empresa que perdeu e conseguimos, então, no início deste ano, ter um Steinway, em excelentes condições.
Panorama – E o CD da orquestra, que foi gravado em 2018, quando será lançado?
Matté – Ele está em fase final de mixagem. O resultado dele está maravilhoso. O lançamento deve ser no início da temporada de 2019. É fundamental ter um disco, todas as grandes orquestras do mundo gravam. O processo de gravação não é somente para registrar uma obra importante e mostrar o nível do trabalho. Nenhuma orquestra sai de um processo de gravação pior do que entrou, o grupo evolui muito, pois a exigência da execução é alta. São semanas de trabalho intenso.
Panorama – Nesta gestão, houve entrada de quantos novos profissionais no expediente da orquestra?
Matté – Houve a nomeação de 25 instrumentistas e mais dois profissionais para trabalharem no Coro Sinfônico, uma técnica vocal e um pianista. A entrada dos 27 musicistas ocorreu em 2017.
Panorama – No balanço desses quatro anos, são somente coisas a comemorar?
Matté – Mais ou menos. No primeiro ano de gestão, recebi a informação que tínhamos que sair da Usina do Gasômetro e não tínhamos para onde ir. Já tínhamos ido para todos os lugares. Uma estrutura dessas não é simples. Eu sempre defendi este espaço no Centro Administrativo, há muitos anos, sempre achei que aqui poderíamos fazer um trabalho legal. 
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