O Itaú Cultural, em São Paulo, abriu, no último dia 27, a chamada 54ª "ocupação", homenageando Benjamin de Oliveira, considerado não apenas o primeiro palhaço negro do Brasil, quanto um artista que trouxe inúmeras contribuições ao espetáculo circense do País, aproximando-o do teatro e tornando o circo um espetáculo que alcançou sensibilizar as chamadas plateias "mais cultas" das primeiras décadas do século XX, no Rio de Janeiro. Benjamin de Oliveira nasceu numa família muito pobre, na região rural de Minas Gerais, localidade de Pará de Minas, em 11 de junho de 1840. Sua mãe, Leandra de Jesus, era uma escrava depois liberada, e seu pai era o capataz da fazenda, Malaquias Chaves. Podemos interpretar estes dados e avançar em sua biografia, imaginando que Benjamin foi fruto de um relacionamento desde logo problemático. Tanto isso é verdade que, desde tenros anos, desempenhou atividades as mais variadas, buscando ganhar algum dinheiro para o sustento dele e da família. Não se sabe se ele já nasceu livre ou se experimentou a condição de "negro de ganho", escravos que eram postos a trabalhar fora de casa mas deveriam entregar a renda auferida aos proprietários. Seja como for, aos 12 anos, Benjamin conheceu o Circo Sotero, que passou pela localidade. Benjamin ali trabalhou vendendo comida durante as sessões, e seja porque queria escapar aos maus tratos do pai, seja porque buscava sua independência, quando o circo deixou a localidade, levava um novo integrante, Benjamin. Até que, em 1889, repentinamente, trabalhando no Circo de Albano Pereira, foi chamado a substituir o palhaço Freitinhas, que se acidentara e não poderia desempenhar suas funções. No início foi difícil, Benjamin não estava preparado, era vaiado, mas aos poucos foi aprendendo. Descobrira o motivo de sua vida. Até sua aposentadoria, ele foi um palhaço negro de circo, reinventando o espetáculo circense, aproximando-o do teatral, propondo enredos de representações dramáticas mais refinadas, que o tornaram um sucesso e reconhecido inclusive pela crítica especializada em artes, do Rio de Janeiro.
Aposentado, ele voltou a passar dificuldades, até que um projeto do senador Nelson Carneiro foi aprovado e ele passou a ganhar um apoio maior do governo federal. Morreu em 3 de maio de 1954. O fato mobilizou a imprensa carioca, que lhe prestou homenagens e destacou suas conquistas. Entre 1907 e 1912, Benjamin ampliou seus horizontes. No ano de 1910, gravou quatro discos, dentre os quais Caipira mineiro e Baiano na roda, e escreveu roteiros e participou como ator de dois filmes, Os guaranis, a partir da obra de José de Alencar, com enorme sucesso (1908), e Inconfidência mineira (1948), inclusive com direção de Humberto Mauro e Carmen Santos! Sua cidade natal homenageou-o com uma estátua, no parque Bariri, mas em 2017 o monumento apareceu pichado com cruzes suásticas. Em 2020, a escola Acadêmicos do Salgueiro, do Rio de Janeiro, também o homenageou como tema do samba-enredo.
A "ocupação" do Itaú Cultural estará aberta à participação do público até 27 de fevereiro de 2022. Além da exposição presencial, com enorme quantidade de documentos, como cartazes e fotografias dos espetáculos que estreou, há uma série de links para vídeos e depoimentos em torno de sua figura. Embora respeitado no mundo do circo e bastante conhecido no teatro, Benjamin é praticamente desconhecido pelo grande público. O interessado em sua história encontrará, no site Itaú Cultural, links para artigos de jornais que focam sua atividade. E há o livro de Ermínia da Silva, Circo teatro: Benjamin de Oliveira e a teatralidade circense no Brasil (2008). Num momento fortemente preconceituoso em relação ao homem negro, é importantíssimo registrar e reconhecer a importância deste artista. Ele enfrentou o desafio de ser respeitado enquanto um palhaço de circo. Ele venceu o preconceito de tornar-se empresário, pioneiro no mundo do disco e participar de iniciativas cinematográficas. Ao contrário do norte-americano Al Jolson, cantor branco que se travestiu de negro para ser vitorioso na carreira, Benjamin de Oliveira foi um homem negro que afirmou-se e construiu uma história que, cada vez mais, é reconhecida e valorizada entre nós. Das várias marginalidades, ele construiu uma história que o torna personagem central de descobertas e conquistas do circo no Brasil.