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Teatro

- Publicada em 13 de Março de 2020 às 03:00

Olga Benário, militante, mãe e esposa

Antonio Hohlfeldt
Quando assisti à primeira versão da montagem de Olga, dramaturgia de Pedro Bertoldi e Edelweiss Ramos, que também interpreta a personagem de Olga Benário, tive uma sensação de deficiência quanto ao tratamento dramático da personagem, o que, evidentemente, acabava prejudicando todo o espetáculo.
Quando assisti à primeira versão da montagem de Olga, dramaturgia de Pedro Bertoldi e Edelweiss Ramos, que também interpreta a personagem de Olga Benário, tive uma sensação de deficiência quanto ao tratamento dramático da personagem, o que, evidentemente, acabava prejudicando todo o espetáculo.
Agora, na abertura da temporada teatral de 2020, Camila Bauer, a diretora, traz uma versão revisada deste trabalho, no espaço da Sala Carlos Carvalho, da Casa de Cultura Mario Quintana. O espetáculo está concentrado em cerca de 40 minutos e se centraliza nos últimos momentos de Olga Benário, esposa de Luiz Carlos Prestes, o líder do Partido Comunista do Brasil, e que foi entregue à Gestapo por parte da polícia do Estado Novo de Getúlio Vargas, embora grávida.
O cenário da peça é minimalista, pois Ronaldo de Almeida idealizou o reduzido âmbito de uma cela da prisioneira, no campo de concentração de Bernburg. De um lado, temos a perseverante militante, que não se afasta de seus princípios de formação ideológica e que antecedem a própria aproximação do Partido Comunista, em Moscou. De outro, a mulher, apaixonada por Luiz Carlos Prestes, que se encontra em prisão, como ela, e vivendo uma experiência absolutamente nova, que é a condição de maternidade. Efetivamente, sabe-se que Olga foi entregue à polícia política alemã pelos esbirros da polícia política brasileira mesmo tendo dado ciência de que se encontrava grávida de uma criança concebida em território brasileiro, o que, pelo Direito Internacional, do qual o Brasil, como nação, era signatário, seria proibido de ocorrer. Olga teve a criança na prisão, amamentando-a durante um tempo, quando a menina foi-lhe retirada. Uma campanha internacional impediu que a menina desaparecesse e ela acabou sendo entregue à mãe de Luiz Carlos, sobrevivendo à própria mãe Olga. Hoje em dia, Anita Leocádia, a filha, é professora universitária e continua militante em nosso país, onde reside.
Este drama sempre comovente, transformado em peça de teatro, traduz, evidentemente, uma paixão por parte da atriz e co-autora quanto à personagem, assim como é de se registrar que a diretora, Camila Bauer, tem escolhido ciosamente os textos que encena, definindo com clareza a posição que escolhe em relação a suas personagens. É de lembrar que, recentemente, Bauer assinou um trabalho contundente a respeito de Ulrike Meinhof, uma das principais líderes da guerrilha urbana alemã dos anos 1970, a Baader Meinhof, condenada à prisão perpétua, onde morreu, em 1976. São estas personagens femininas ativistas, e que enfrentam múltiplos desafios para as suas atividades, culminando na própria morte das mesmas, o que tem atraído a diretora, que é meticulosa no seu trabalho.
A nova versão de Olga me agradou mais. Não sei e nem me preocupa tanto comparar as duas versões. Mas tive a impressão de que a dramaturgia conseguiu melhorar o foco para o desenvolvimento do enredo, assim como se distanciou de certo melodramatismo que caracterizou a versão inicial, e que registrei em meu comentário anterior. Neste sentido, esta oscilação entre a militante e a mulher/esposa/mãe ganhou força e equilíbrio e consegue maior impacto junto ao público.
O figurino de Liane Venturella traduz, de certo modo, a humilhação a que a personagem está submetida; a iluminação de Ricardo Vivian marca bem as passagens de tempo e sugere com eficiência o clima opressivo daquele espaço prisional. A trilha sonora e música incidental, criada e escolhida por Álvaro RosaCosta, nem sempre me parece a mais apropriada, ainda que responda a uma evidente preocupação dos dramaturgos e da direção em aproximarem os acontecimentos do público brasileiro. Aqui, contudo, remanesce uma contradição, porque os nomes e sobrenomes, sobretudo aqueles já conhecidos e popularizados no Brasil, deveriam ser traduzidos, o que facilitaria a comunicabilidade do espetáculo. De qualquer modo, uma das passagens mais impactantes é o solo de piano de Simone Rasslan, já ao final do espetáculo, que nos remete a Eric Satie, e que traduz com enorme fidelidade, o sentimento de solidão da personagem.
Em síntese, para a semana do Dia Internacional da Mulher, nada mais oportuno que revisitar tais episódios e refletir sobre estas mulheres extraordinárias que marcam a história da humanidade mas que nem sempre são valorizadas e reconhecidas.
 
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