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Teatro

- Publicada em 19 de Outubro de 2018 às 01:00

Uma inesquecível noite com Fernanda Montenegro

Há duas semanas, Porto Alegre recebeu Fernanda Montenegro, às vésperas dos 90 anos. Veio fazer um espetáculo solo, Nelson Rodrigues por ele mesmo, idealizado por ela junto com a irmã do dramaturgo, Sônia Rodrigues. A iniciativa coube ao Instituto de Cultura da Pucrs e, sem dúvida, foi um grande momento. O instituto organizou uma homenagem especial da universidade à atriz, concedendo-lhe o primeiro título de Mérito Cultural da instituição. Foi momento de emoção e de consagração: o Salão de Atos da Pucrs absolutamente tomado por professores, alunos, público convidado e espectadores, que puseram-se de pé e ovacionaram Fernanda mal ela adentrou o palco. E não foi sem razão. Durante pouco mais de hora e meia ela deu vida a textos de Nelson Rodrigues, que se expressa fundamentalmente por silogismos, tomados como se mandamentos fossem (e talvez o sejam, para ele mesmo).
Há duas semanas, Porto Alegre recebeu Fernanda Montenegro, às vésperas dos 90 anos. Veio fazer um espetáculo solo, Nelson Rodrigues por ele mesmo, idealizado por ela junto com a irmã do dramaturgo, Sônia Rodrigues. A iniciativa coube ao Instituto de Cultura da Pucrs e, sem dúvida, foi um grande momento. O instituto organizou uma homenagem especial da universidade à atriz, concedendo-lhe o primeiro título de Mérito Cultural da instituição. Foi momento de emoção e de consagração: o Salão de Atos da Pucrs absolutamente tomado por professores, alunos, público convidado e espectadores, que puseram-se de pé e ovacionaram Fernanda mal ela adentrou o palco. E não foi sem razão. Durante pouco mais de hora e meia ela deu vida a textos de Nelson Rodrigues, que se expressa fundamentalmente por silogismos, tomados como se mandamentos fossem (e talvez o sejam, para ele mesmo).
O título do espetáculo é retirado de um dos volumes de sua autobiografia. O texto está organizado de modo cronológico, começando pelos anos de infância, depois de referências à vinda da mãe, com os filhos, desde o Recife, para o Rio de Janeiro. Fernanda Montenegro propõe uma leitura crítica: seus gestos, suas entonações, seus movimentos de sobrancelhas colocam um elemento de significação a mais sobre o texto que lê e, neste sentido, interpreta.
O público seguiu com atenção, eu diria, com reverência, a toda a leitura. Enfrentou com estoicismo alguns absurdos expressos pelo dramaturgo (em especial, sobre as mulheres), mas também descobriu alguns posicionamentos até certo ponto surpreendentes e que talvez devam ajudar a reformular alguns julgamentos sobre ele, como sua oposição radical à tortura, por exemplo, e seu posicionamento a favor da paz entre as nações.
Fernanda Montenegro considera Nelson Rodrigues o maior dramaturgo brasileiro. Conviveu com ele, encomendou e interpretou várias de suas obras. Para mim, o Brasil tem, de fato, apenas dois grandes dramaturgos: Nelson Rodrigues e Jorge Andrade, antípodas, mas talvez por isso mesmo, complementares. Acrescentemos o grupo do Teatro de Arena, com Vianinha, Guarnieri, Boal; à parte, Dias Gomes e, mais recentemente, Naum Alves de Sousa. Hoje em dia, podemos falar em talvez mais dois jovens valores que se colocam, Mário Bortolotto e Grace Passô.
O que é um dramaturgo? Não é apenas um sujeito que escreva textos dramáticos. Ele deve ter um conjunto significativo (quantitativo e qualitativo) de obras, uma visão de mundo e um conjunto de características (estilo, se quiser o leitor) que nos leve a reconhecê-lo, de imediato, antes mesmo de ler seu nome. Na verdade, em geral a literatura dramática de cada país conta com muitos poucos nomes. Veja-se os Estados Unidos: Bernard Shaw, o trio formado por Arthur Miller, Tenessee Williams e Eugene O'Neill e... o que mais? A Espanha teve seu núcleo no período do, por isso mesmo, chamado siglo de oro. Portugal tem sua melhor dramaturgia neste mesmo momento, com Gil Vicente. Na Inglaterra é o período shakespereano, que não é apenas William Shakespeare, e assim por diante. Um dramaturgo precisa ser capaz de expressar a alma de um povo, universalmente falando ou sob um determinado foco, histórico, por exemplo, mas capaz de sobreviver ao tempo. Estes dramaturgos mencionados foram/são assim.
Fernanda Montenegro passou, até aqui, 55 anos sobre um palco. Leu e interpretou boa parte destes dramaturgos. Ela pode, pois, avaliar e comentar. E se ela diz que Nelson Rodrigues é o maior dramaturgo brasileiro, temos de respeitá-la. Pessoalmente, como disse, concordo em parte com ela, pois acrescento, a esta indicação, a de Jorge Andrade. Mas não se trata de competição. Fernanda o reconhece como um cronista do País, e nisso estamos de acordo. Nelson Rodrigues foi capaz de surpreender a canalhice, a má fé e a falsidade que se encontram internalizadas no brasileiro, que se traduz nos preconceitos, nas expressões do tipo "você sabe com quem está falando?", como já indicou o antropólogo Roberto da Matta. Mas o que é importante é que Fernanda, ao ler Nelson, lê Nelson sob esta perspectiva. E assim, o texto de Nelson Rodrigues ganha uma outra dimensão e profundidade, concordemos ou não com ele.
Em resumo, foi uma noite absolutamente inesquecível, aquela vivenciada na Pucrs.
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