O gaúcho Ernesto Araújo, ministro das Relações Exteriores, foi escalado para atravessar o corredor polonês da mídia ao longo desta semana, mas a verdadeira crise envolve a forma desastrada com que se substituiu o ministro-general Eduardo Pazuello do Ministério da Saúde. Por todos os lados, a deselegância do governo e a birra da imprensa fizeram que finalmente os mandos e desmandos do governo chegassem aos quartéis. Os generais da ativa estão decepcionados.
Pilatos no credo
O chanceler entra nesse torvelinho como Pilatos no credo, pois embora tenha cumprido fielmente sua missão com a base ideológica do grupo que representa no governo, patrocinou provocações de seu parceiro e assessor do presidente da República, Filipe Martins (foto), tidas como desnecessárias. Postura ainda inexplicada (com que propósito?) às costas do presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM-MG), diante das câmeras. Saiu-se com um gesto obsceno, ofensivo à comunidade LGBT nacional e, pela posição dos dedos e da mão, evocando à supremacia branca norte-americana, provocando os movimentos negros no Brasil. Algo tão espalhafatoso que, no dia seguinte, falou-se mais dele que das gaguejadas e escorregões do ministro diante de um grupo de senadores implacáveis. E assim o general ficou submerso. Mas a questão está fervendo.
Guerra defensiva
No meio militar, a gestão de Pazuello é considerada eficiente, capaz de minimizar danos, de encaminhar uma organização suficiente para absorver a fase da guerra defensiva contra o vírus e de preparar a contraofensiva, quando chegassem as vacinas - realmente o único remédio de efeito maciço. O general passa o bastão para o médico no ritmo capaz de recuperar o tempo perdido. Só falta a vacina, mas o precioso líquido está vindo, tanto das grandes fábricas em vias de entrarem em operações, na Fiocruz e no Butantã, como de importações. Mas não acaba assim, pacificamente.
Saco de pancadas
O que irrita os militares é que ao servir de saco de pancadas para irascíveis analistas e comentaristas da tevê a cabo, as deficiências sistêmicas da máquina sucateada do Ministério da Saúde foram atribuídas à incompetência do Exército, uma das instituições com atuação mais eficiente de socorro a flagelos, desde secas no Nordeste a epidemias (como a cólera). Produto do desconhecimento dos jornalistas, dizia-se. Os generais não se conformam com o abandono do sistema de comunicação do governo. Nos primeiros dias de sua gestão, quando ainda interino, o general chegou a contratar uma equipe profissional, logo dispensada pelo Palácio do Planalto. Daí em diante, nunca mais saiu do pelourinho.
Batata quente para Bolsonaro
Não bastassem tantos dissabores, Pazuello está respondendo a um processo surrealista: ele foi culpado pela falta de oxigênio em hospitais de Manaus, num estado e numa cidade com governos funcionando. A ação, aceita pelo ministro da Suprema Corte Ricardo Lewandowski, foi a gota d'água. Algo que, como diria o senador Renan Calheiros (MDB-AL), seria desclassificado, rejeitado e engavetado por um juizinho de primeira instância, chega ao Supremo turbinado pela força dos holofotes. Efeito Big Brother, disse um comentarista. Batata quente para Jair Bolsonaro.