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Opinião Econômica

- Publicada em 26 de Novembro de 2021 às 03:00

Real digital tem mais desafios que stablecoins

Helio Beltrão
Engenheiro com especialização em finanças e MBA na Universidade Columbia, é presidente do Instituto Mises Brasil
Engenheiro com especialização em finanças e MBA na Universidade Columbia, é presidente do Instituto Mises Brasil
As fintechs e as big techs estão dedicando recursos multibilionários para desintermediar os bancos em meios de pagamento. Há demanda reprimida por uma forma imediata e segura para transferir dinheiro pelo WhatsApp, pelo Facebook e por outras redes, nacional ou internacionalmente, independentemente dos bancos.
Os desbancarizados, embora em declínio, ainda são numerosos. A tecnologia privada viabiliza a inclusão e barateia custos. No ano passado, por exemplo, uma criptomoeda foi usada como veículo de remessa para ajuda humanitária na Venezuela no auge da pandemia.
Muitos governos, no entanto, estão receosos em permitir soluções privadas em pagamentos e alegam uma mescla de motivos, alguns mais razoáveis que outros. Caso reajam mal -regulando em excesso ou mesmo proibindo, por medo ou desconhecimento-, a própria moeda oficial pode rá sofrer disrupção no futuro.
O Mercado Livre acaba de anunciar um aplicativo para pagamentos digitais dedicado a criptomoedas. Começando pelo Brasil, clientes poderão comprar, vender e custodiar "criptos" em suas carteiras digitais. O PayPal e a Venmo anunciaram iniciativas similares. O Facebook anunciou há um mês, na Money2020, em Las Vegas, o lançamento da carteira Novi, que utilizará como meio de pagamento o pax dollar, uma stablecoin.
Stablecoins são criptomoedas com lastro, em geral fixadas a uma moeda "fiat", como o dólar. O pax dollar não é um dólar verdadeiro, mas um "token digital" cuja companhia gestora se obriga a lastrear integralmente em dólares verdadeiros.
É a primeira vez que stablecoins estarão disponíveis em carteiras digitais prontas para consumo, fora do ecossistema paralelo de criptomoedas. O Mercado Livre tem cerca de 100 milhões de usuários, e o Facebook, quase 3 bilhões, ao redor do mundo. O próximo passo é que as criptomoedas e as stablecoins dos usuários sejam usadas em pagamento.
Quando as stablecoins (ou outras criptomoedas) passarem a ser usadas para pagamentos transfronteiriços, ocorrerá um salto de praticidade com menor burocracia e custos de transação, pois inexiste o fechamento de câmbio. Pela primeira vez, transações internacionais poderão ser realizadas quase sem atrito, instantaneamente, em um meio de pagamento de aceitação mundial.
As novidades nos últimos anos impeliram os bancos centrais a aprimorar seus próprios sistemas centralizados de pagamento e vislumbrar a versão digital de sua moeda oficial. Nada como a competição para melhorar serviços. No Brasil, o primeiro passo foi o Pix ("front end"), um êxito espetacular em termos de aceitação. O passo seguinte, o "back end", é o real digital, que circulará pari passu às cédulas de real.
O problema é que a implantação do real digital é incrivelmente desafiadora.
O real digital, se implementado como nas discussões preliminares de CBDCs (moedas digitais de bancos centrais) no resto do mundo, incentivará depositantes a sacar dos bancos para suas carteiras digitais. Afinal, uma moeda digital do BC é menos arriscada, mais barata e mais utilitária que um depósito em conta-corrente. A perda de depósitos causará uma redução imediata e forçada dos empréstimos dos bancos, causando um efeito transitório altamente recessivo.
Pode piorar. Em paper publicado na conferência da Mont Pelerin Society neste mês, o economista Fernando Ulrich argumenta que o real digital significará o "absolutismo monetário", permitindo data de validade para o seu dinheiro, bloqueios, taxas de juros negativas, fiscalização estatal de todas as transações e outras violações.
É possível que o processo democrático impeça o avanço do real digital estatal, mas a tecnologia de pagamentos privada não parará de evoluir. Se o BC tentar bloquear seu avanço pela coerção e não melhorar seus serviços de moeda e pagamentos, o real poderá ser "disruptado" por obsolescência.
Helio Beltrão
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