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Opinião Econômica

- Publicada em 03 de Março de 2019 às 21:49

A armadilha em que Bolsonaro se meteu

Colunista Site JC Samuel Pessoa

Colunista Site JC Samuel Pessoa


/Thiago Machado/Arte JC
Samuel Pessôa
Bolsonaro demonizou a política na campanha eleitoral. Avisou que, em seu governo, não haveria o toma lá, dá cá.
Bolsonaro demonizou a política na campanha eleitoral. Avisou que, em seu governo, não haveria o toma lá, dá cá.
O problema é que, ao fazê-lo, colocou no mesmo balaio ações bem diferentes. Apesar de diferentes, os dois tipos de ação são difíceis de serem distinguidos precisamente. Em todo sistema político multipartidário - seja parlamentarista, seja presidencialista -, o Executivo, para governar, constrói uma coalizão de partidos.
É por esse motivo que nosso presidencialismo se parece muito mais com os parlamentarismos da Europa continental do que com o presidencialismo bipartidário norte-americano.
A construção da coalizão envolve a negociação de um programa político e, consequentemente, de compartilhamento de poder entre os partidos da base de apoio ao governo. É assim em todo regime político multipartidário.
O ideal é que o Executivo construa uma coalizão que seja ideologicamente homogênea, cuja ideologia média seja próxima daquela do Congresso Nacional e na qual a distribuição de poder seja proporcional ao tamanho de cada partido na base.
Se o partido do presidente for sobrerrepresentado, certamente problemas aparecerão à frente. Boa parcela da distribuição de cargos e de espaços de poder tem essa lógica.
Adicionalmente, no sistema político brasileiro, existe outra moeda de troca. Trata-se da liberação de recursos para pagar as emendas parlamentares, em contrapartida ao voto favorável do parlamentar a um projeto de interesse do Executivo.
No Brasil (como em muitos países), o eleitor pune o Executivo nacional e seu partido se houver desorganização na macroeconomia. Inflação, baixo crescimento, desemprego e queda de renda real redundam em derrota eleitoral do partido do presidente.
Os deputados, por sua vez, têm suas próprias agendas no seu eleitorado. Assim, a liberação de recursos para emendas parlamentares é um instrumento poderoso.
A emenda atende à base eleitoral do parlamentar, e o voto do deputado ou senador ajuda na aprovação de projetos legislativos (os diversos tipos de lei e as emendas constitucionais) de interesse do Executivo.
Em geral, são projetos legislativos que garantem a estabilidade macroeconômica e, portanto, atendem ao interesse difuso (aquilo que é bom para todos, mas que não conta com grupos de pressão em sua defesa) do conjunto da sociedade.
Há evidências de que as emendas parlamentares contribuem efetivamente para o desenvolvimento local.
Tanto o compartilhamento de poder, fruto da construção de uma coalizão sustentada em um programa comum, quanto a liberação de emendas são instrumentos legítimos e legais. Trata-se de política.
Outra ação muito diferente é a corrupção. Muitas vezes, é difícil diferenciar. Há muito compartilhamento de poder que não tem por base um projeto comum e se trata simplesmente de abrir espaço para que grupos políticos desviem dinheiro público.
É aí que temos enorme problema. Apesar de ser difícil separar o joio do trigo, há joio e há trigo, e, sem trigo, a política não anda. Ao demonizar toda a ação política sem distinção, fica difícil construir um caminho para os parlamentares que desejam acompanhar o governo.
Há uma dura agenda de reformas. Os parlamentares, para apoiá-la, precisam de um caminho. Como atuar e como construir o seu futuro na política? Ao se negar a produzir esse mapa, o governo pode jogar muitos congressistas que desejam apoiar o governo para o campo da oposição às reformas.
Esse negócio de reinventar a roda, em geral, não funciona.
Pesquisador do Instituto Brasileiro de Economia (FGV) e sócio da consultoria Reliance. É doutor em economia pela USP
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