Provedora de plataforma de comércio digital de software como serviço (SaaS) para empresas e varejistas com mais de 2 mil clientes, a brasileira VTEX marcou posição como grande player global de e-commerce ao debutar na Bolsa de Valores de Nova Iorque (NYSE), no início de julho. Algo que já era planejado, como conta o cofundador e co-CEO da VTEX, Mariano Gomide, mas que nem por isso deixou de ser um momento de fortes emoções. O ponto alto, segundo o empreendedor, foi receber em New York, cidade na qual ele mora e onde aconteceu a Oferta Pública Inicial, alguns clientes e parceiros. “Foi muito tocante pensar que essas pessoas saíram das suas cidades para participar do nosso IPO”, relembra. No dia seguinte à cerimônia, ele acordou e, das 8 até às 16 horas, falou com mais de 70 clientes ao telefone. “Eu queria agradecer a eles, e chorei igual criança em cada ligação. Fizemos a VTEX sob esse valor, e vamos ir até onde houver mar com esse mesmo valor. Meu time está renovado depois de tudo isso que vivemos”, relata.
Mercado Digital – Como foi a experiência de fazer o IPO na NYSE?
Mariano Gomide – Estamos nos preparando para o IPO há cinco anos. A VTEX já tem mais da metade da sua receita vinda de fora do Brasil, tem atuação em 32 países e atende clientes como Eletrolux, Carrefour e Motorola. O passo natural para a nossa empresa era debutar na Bolsa de Valores e, por sermos uma empresa global, na Bolsa de Valores de Nova Iorque (NYSE). Optamos por esse passo e a demanda dos investidores foi surpreendente. Fizemos um booking de 20 vezes o tamanho da oferta. Foi bastante expressiva e atraímos fundos soberanos que geralmente não apostam muito na América Latina.
Mercado Digital – A que você atribui esse interesse dos investidores?
Gomide – Eles enxergaram a gente como um ícone global, que representa o Brasil e a América Latina como o maior ecossistema de digital commerce do mundo. A tese que fez o nosso papel estar em nível superior na abertura é a nossa visão de longo prazo e o fato de a América Latina crescer 36% ano a ano, fazendo da VTEX a plataforma de digital commerce mundial que mais cresce no mundo, segundo projeções da IDC. E sem falar que a região tem apenas 6% de penetração de digital commerce. Se chegarmos à média mundial de 35% a 40%, em cinco anos, chegaremos a uma penetração de 20% a 25% e, em dez anos, de 45% a 50%. O mercado que a gente atua vai crescer dez vezes em dez anos e a VTEX, como líder, vai ser catapultada.
Mercado Digital – Você acredita que mais empresas brasileiras seguirão esse caminho do IPO?
Gomide – Sim, acredito que esse nosso ato será como a ponta de um iceberg, e dezenas de outras empresas brasileiras virão, abrindo capital. A verdade é que o Brasil passa a ocupar espaço de referência em digital commerce mundial. Fazer o IPO foi um pequeno passo, já era planejado, mas um passo gigante para a região da América Latina. Somos a primeira empresa de produto de software com origem na região a se tornar líder global e estrear na Bolsa de Valores de Nova Iorque. Isso pode pavimentar a estrada para muitas outras empresas seguirem o mesmo caminho.
Mercado Digital – Qual o diferencial da VTEX que a fez chegar até aqui?
Gomide – A VTEX entrega algo único para as empresas. Antes da gente, ou as grandes corporações compravam software que era uma caixa com a qual elas faziam o que quisessem – e muitas vezes virava um Frankenstein – ou adquiriram um software empacotado, e não conseguiam customizar. Ao servir as grandes organizações, desde sempre optamos por uma solução com a qual pudessem criar as suas próprias tecnologias na nossa plataforma, oferecendo uma velocidade de go to market sem precedentes. Foi o caso da Whirlpool. Atendemos eles no Brasil e depois América Latina. Depois o CEO da empresa nos solicitou para servi-los globalmente. Uma história que eu lembro foi que eles queriam lançar o e-commerce na Rússia, um país complexo. O prazo que nos foi dado era de 12 a 18 meses. A VTEX colocou no ar em três meses. Fazemos tudo integrado, uma junção que traz equilíbrio entre a área de TI e a de negócios.
Mercado Digital – O que tem guiado esse crescimento tão acelerado?
Gomide – Esse crescimento é uma consequência de novos produtos, novos clientes e novas verticais de atuação. E também da expansão geográfica. Temos um centro de operação e mais três escritórios nos Estados Unidos, quatro na Europa e vamos expandir muito ainda nessas duas regiões. Aprendemos a fazer uma empresa que, de 0 a US$ 100 milhões, consumiu zero capital de investimentos. Não fizemos algo diferente porque quisemos, mas porque a gente precisava, e essa é a realidade de muitos empreendedores na América Latina. Isso nos tornou uma empresa com muita responsabilidade no uso do dinheiro. A gente cresce bastante, criamos uma metodologia própria e atuamos em cada País de acordo com a maturidade de cada um, traduzindo a mentalidade de startups nos países ‘discovery’ e chegando com a mentalidade de empresa grande quando tem potencial de escalar. Não temos mentalidade de escala em países nos quais somos pequenos.
Mercado Digital – Quando uma empresa atinge uma posição de tanto destaque, é natural olharmos para o segmento no qual ela está inserida. O que explica esse potencial todo do nosso e-commerce?
Gomide – A combinação entre um ambiente muito hostil ao varejo e às marcas – é muito complexo operar no varejo – e os 250 mil engenheiros que se formam todos os anos. Isso fez com que a América Latina se tornasse o ambiente perfeito para a formação de talentos digitais. O Brasil exportava soja, frango e, agora, está debutando no e-commerce do mundo.