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- Publicada em 18 de Outubro de 2018 às 22:20

Ensaios de ficção de Marcelino Freire

Diz o amansa-burros que ensaio é a apresentação de um assunto filosófico, científico, histórico ou de teoria literária, caracterizado pela visão de síntese e tratamento crítico e que ficção é ato ou efeito de fingir, simulação, coisas imaginárias. Enredos criados pela imaginação de autor. Pois Bagageiro (José Olympio, 156 páginas), nova obra do escritor premiado Marcelino Freire, embora intitulada ficção brasileira na ficha catalográfica, é considerada por Freire como "ensaios de ficção".
Diz o amansa-burros que ensaio é a apresentação de um assunto filosófico, científico, histórico ou de teoria literária, caracterizado pela visão de síntese e tratamento crítico e que ficção é ato ou efeito de fingir, simulação, coisas imaginárias. Enredos criados pela imaginação de autor. Pois Bagageiro (José Olympio, 156 páginas), nova obra do escritor premiado Marcelino Freire, embora intitulada ficção brasileira na ficha catalográfica, é considerada por Freire como "ensaios de ficção".
Os textos e frases circulam entre os gêneros conto, ladainha, improviso, aforismos, humor, drama e outros. Falam de vida, morte, literatura, escritores, vida literária, crítica, televisão, civilização, dinheiro, teatro, futuro e um dos ensaios aborda a merda. Diz Freire que não foi ele que escreveu a orelha ou o "pequeno ensaio sobre a orelha". Relata o autor que foi uma amiga escritora que escreveu, imitando sua fala e, para não ser chamada de orelhista, preferiu não se identificar.
"Ah, bagageiro no Recife, é onde a gente leva tudo, de carona, em cima da bicicleta. Botijão de gás, criança, bomba atômica. Eu queria juntar algumas histórias nesse bagageiro. E dar uns toques, entre um conto e outro, e às vezes até dentro do próprio conto, sobre a escrita, a reescrita, a crítica, o país, o mundo, a vida literária. E não literária. Sem compromisso, foi isso", conta o texto da orelha do livro, que dá toques sobre orelhas e orelhistas célebres como Jorge Amado, que redigia orelhas para quem pedisse e, assim, era cada vez mais amado.
Marcelino Freire nasceu em 1967 em Sertânia, Pernambuco, ministra oficinas literárias e lançou Contos negreiros (Editora Record, Prêmio Jabuti 2005); Rasif (Editora Record, 2008); e Nossos ossos (Record, Prêmio Machado de Assis e Biblioteca Nacional), entre outros. Em entrevista para Manoela Sawitzki e Omar Salomão, Freire diz ter horror a ser levado a sério, que foge da ideia de se levar em conta demais e pretendeu andar livremente de bicicleta, com os trastes no bagageiro e ser ele mesmo um traste. "A literatura é sempre essa viagem, de carona. É esse passeio público, sem saber para onde vamos, seguimos. Em cada parágrafo uma paisagem. Em cada ponto uma parada. A literatura é essa aventura constante. Em direção ao outro, muito além de você e de mim, este movimento sem fim", avisa ele no fim da entrevista.

Lançamentos

O derradeiro bandeirante (Alcance, 320 páginas), romance do professor, médico e escritor Pio Furtado, tem prefácio do professor-doutor José Édil de Lima Alves, que escreveu: "o autor utiliza sua cultura admirável para falar sobre a conquista e domínio do território sul-americano, desvelando o que lá realmente aconteceu". Dr. Pio Furtado assume sexta-feira, no Rio de Janeiro, cadeira na Academia Brasileira de Médicos Escritores.
Como ingressar numa universidade americana - E a diferença que isto fará na sua vida (Faro Editorial, 238 páginas), do engenheiro e professor da FGV-SP, é um ótimo guia para brasileiros e foi escrito durante o processo de admissão de seu filho, aceito em oito universidades americanas. Com a defasagem do Ensino Superior brasileiro, jovens e pais o sistema americano, onde estão algumas das melhores universidades do mundo.
Sílvia (EST Edições, 168 páginas), romance do advogado e escritor Delfino Baldasso, experiente autor de muitas obras de ficção, conta como Silvia foi sequestrada na praia de Cachoeiro do Bom Jesus e levada até Albina, no Suriname. Os sequestradores queriam levá-la para Roterdã, Holanda, para vendê-la a algum rufião. Os criminosos já tinham feito outros sequestros, mas...

Janelas indiscretas de Letícia Lampert

Lendo os textos em português e inglês e contemplando as fotos do belo e criativo livro Conhecidos de vista - Known by sight (Ideograf, Fumproarte), de Letícia Lampert, não há como não lembrar do celebrado filme Janela indiscreta, de Alfred Hitchcock, no qual um homem, imobilizado por causa de uma perna quebrada, espia o que julga ser um crime através da janela do vizinho. A obra é um culto aos desejos de viver através do olhar, uma ode ao tenso e libidinoso voyerismo.
Impossível também não relacionar o livro de Letícia com o clássico Cidades invisíveis, ficção do genial professor e escritor italiano Italo Calvino. Nele, a fantasia mescla-se com a história e o viajante Marco Polo fala de 55 cidades que têm nomes femininos. Olhares, janelas, cidades, mundos infinitos.
Lembrei também de uma janela de um prédio perto do meu que, de madrugada, tem frequentemente as luzes acesas. Não conheço o(a) insone, mas faz alguns anos que, olhando para lá, noto que tenho a companhia de um(a) desconhecido(a) íntimo(a) durante o silêncio da noite. Algum dia gostaria de saber quem é o notívago, mas não tenho pressa alguma. A noite é uma criança.
Letícia esteve em mais de 50 apartamentos situados em áreas centrais de Porto Alegre. Escolhas foram feitas ao acaso, sem hora marcada. Mas a autora estabeleceu que os apartamentos deveriam ser localizados em ruas estreitas, com prédios de ambos os lados. Porteiros e zeladores tornaram-se os principais curadores do projeto, auxiliando na escolha dos moradores e facilitando o trabalho da fotógrafa.
As fotos mostram janelas e sacadas quase sempre vazias, raras com pessoas. Em uma foto, operários num jaú suspenso trabalham. Em outra, um homem está sozinho na sacada e, em outra, uma faxineira limpa um vidro, cuidando-se para não cair lá das alturas. Boa parte das janelas está fechada, como se fossem olhos cerrados, adormecidos. Há fotos dos interiores dos apartamentos, sem os moradores e pequenos textos que contam suas histórias.
Solidão, silêncio, fotos realistas (ou hiper-realistas), cores suaves, apartamentos parecidos com colmeias ou pombais e visões das luzes e das sombras daquelas muitas janelas, salas, cidades e habitantes, que não estão nas fotos de certo para não roubarem a cena. É possível conhecê-los pelos detalhes das cortinas, dos móveis, das camas desarrumadas e dos velhos aparelhos de TV. Penso que as fotos da Letícia me fazem lembrar meu pintor norte-americano preferido, Edward Hopper, o pintor da "solidão americana". As telas de Hopper têm pouquíssimas pessoas, geralmente sozinhas e, em geral, apresentam cenários, paisagens e casarios sem seres humanos.
Não por acaso, ao que parece, Letícia escolheu áreas centrais e mais antigas da cidade, onde a pátina do tempo e o próprio tempo vão pousando lentamente, como acontecia há muitos anos atrás. Mas há vida dentro e fora das janelas, algum gato ou cachorro e, sim, sempre alguma mulher seminua sendo espiada e sempre alguns acontecimentos vão mostrar que o mundo não acabou.

A propósito...

As centenas de janelas, salas, cenários e os textos do livro mostram como existem muitas cidades dentro da nossa cidade. Muitas histórias contadas ou não. Mistérios e revelações. Moradores olham para as janelas dos vizinhos nas manhãs e ficam felizes quando a janela da velhinha que mora sozinha está aberta e aí eles não precisam se preocupar, vendo que a vida continua, que a vela não apagou, que os antigos elevadores sobem e descem, que os porteiros e zeladores seguem vigilantes, dando conta de tudo o que acontece ou que não acontece. Os olhos são as janelas da alma, disse Shakespeare, e as janelas são as molduras dos encontros ou das solidões. (Jaime Cimenti)