Corrigir texto

Se você encontrou algum erro nesta notícia, por favor preencha o formulário abaixo e clique em enviar. Este formulário destina-se somente à comunicação de erros.

Cinema

- Publicada em 29 de Outubro de 2021 às 03:00

Fantasias inúteis

Hélio Nascimento
Na terceira de suas Crônicas marcianas, Ray Bradbury, um dos mestres da ficção-científica em literatura, expõe com clareza e de forma impactante as figuras ocultas pelas convenções e as forças repressivas criadas pela civilização. Tudo parece uma volta a um mundo familiar superado pelo tempo e vivo apenas na memória, mas a ilusão é desfeita e aquilo que parecia um regresso a um universo feito de harmonia adquire uma forma que revela ações e personagens que haviam sido mantidos prisioneiros. Na mesma obra, um dos clássicos do gênero, o epílogo revela o que há de essencial no relato. As figuras refletidas nas águas de um canal formam a verdadeira família humana. O desfecho da obra coloca em evidência uma lição fundamental: não importa a época em que um relato de ficção se desenrole, pois o essencial e o indispensável é que ele pense sobre seu tempo; não importa se a fantasia coloque a ação num universo paralelo, pois o relevante é que o focalizado fale da época do autor. O maior filme de ficção-científica até hoje feito, 2001: uma odisseia no espaço, de Stanley Kubrick, um filme-ensaio que de certa maneira concretiza o que Serguei Eisenstein planejava ao pensar em transformar em filme O capital, de Karl Marx, não é um relato sobre uma viagem espacial e sim uma meditação sobre a relação sobre o homem e a máquina e o eterno recomeço. Numa época em que parte do cinema se infantiliza e exerce o papel de infantilizar os adultos, papel que não apenas certos filmes exercem, até parece um exagero falar na obra-prima do gênero. Porém, diante de um declínio evidente é importante falar de filmes que mesmo não ambicionando a mesma relevância se caracterizaram por oferecer ao público um produto no qual se mesclavam a fantasia e a realidade, o mundo imaginário e os obstáculos a serem enfrentados.
Na terceira de suas Crônicas marcianas, Ray Bradbury, um dos mestres da ficção-científica em literatura, expõe com clareza e de forma impactante as figuras ocultas pelas convenções e as forças repressivas criadas pela civilização. Tudo parece uma volta a um mundo familiar superado pelo tempo e vivo apenas na memória, mas a ilusão é desfeita e aquilo que parecia um regresso a um universo feito de harmonia adquire uma forma que revela ações e personagens que haviam sido mantidos prisioneiros. Na mesma obra, um dos clássicos do gênero, o epílogo revela o que há de essencial no relato. As figuras refletidas nas águas de um canal formam a verdadeira família humana. O desfecho da obra coloca em evidência uma lição fundamental: não importa a época em que um relato de ficção se desenrole, pois o essencial e o indispensável é que ele pense sobre seu tempo; não importa se a fantasia coloque a ação num universo paralelo, pois o relevante é que o focalizado fale da época do autor. O maior filme de ficção-científica até hoje feito, 2001: uma odisseia no espaço, de Stanley Kubrick, um filme-ensaio que de certa maneira concretiza o que Serguei Eisenstein planejava ao pensar em transformar em filme O capital, de Karl Marx, não é um relato sobre uma viagem espacial e sim uma meditação sobre a relação sobre o homem e a máquina e o eterno recomeço. Numa época em que parte do cinema se infantiliza e exerce o papel de infantilizar os adultos, papel que não apenas certos filmes exercem, até parece um exagero falar na obra-prima do gênero. Porém, diante de um declínio evidente é importante falar de filmes que mesmo não ambicionando a mesma relevância se caracterizaram por oferecer ao público um produto no qual se mesclavam a fantasia e a realidade, o mundo imaginário e os obstáculos a serem enfrentados.
A trilogia iniciada por George Lucas em 1977, com Guerra nas estrelas, é um bom exemplo. Tal trilogia, completada depois por O império contra-ataca, dirigido em 1980 por Irvin Kershner, e O retorno do Jedi, realizado por Richard Marquand em 1983, nem de longe pode ser comparada a um filme como 2001 e a uma obra como Gravidade, que Alfonso Cuarón realizou em 2013, mas é um painel que ao mesclar elementos de um cinema voltado para grandes plateias com observações pertinentes sobre imperialismo, relações familiares, luta pelo poder e forças repressivas, merece toda atenção. É verdade que a segunda trilogia planejada por Lucas (na verdade a primeira) dirigida por ele mesmo não tinha a mesma força e que o primeiro capítulo da última era quase um desastre, mas os três episódios centrais, realizados por diretores competentes, permanecem como filmes que mostraram que é possível falar ao grande público sem se afastar de temas relevantes. Basta citar que no filme dirigido por Kershner a figura do pai castrador inaugurava um novo tema do filme de aventura e mostrava as raízes de um mundo mais amplo. Vale mencionar que o nome paterno, Darth Vader, é semelhante a pai sombrio, também em outras línguas que não o inglês.
A época dos três primeiros filmes exibidos da série criada por Lucas era outra. A inteligência ainda reinava nos filmes de ação. Agora dominam os efeitos especiais, as correrias, as lutas prolongadas e encenadas de forma ridícula. Quanto aos temas, estes são desenvolvidos de maneira simplória e sem nenhum sinal de imaginação, distante de qualquer criatividade. Fritz Lang, que em Metropolis, filme realizado em 1926, utilizou a ficção-científica para falar na dominação dos seres humanos pela tecnologia, dizia que nunca se perde tempo no cinema, pois se o filme não agrada ou não tem valor pelo menos permite que o espectador imagine como o faria se fosse o diretor. A constatação é correta, mas carrega uma carga de subjetividade. Se o mestre falava como realizador e era paciente como espectador, para os que hoje contemplam certos filmes a paciência se esgotou, embora isso também seja subjetivo. Woody Allen, em um de seus filmes, diz que é possível dirigir mesmo desprovido de visão, pois basta ir ao cinema e contemplar o que alguns andam fazendo. É lamentável, também, ver realizadores de passado respeitável aderir a modismos e a concessões.
Conteúdo Publicitário
Leia também
Comentários CORRIGIR TEXTO