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Cinema

- Publicada em 06 de Agosto de 2021 às 03:00

Passado perdido

Hélio Nascimento
O cinema é aquela entre as artes que mais cuidados exige para que seu patrimônio seja preservado. Tal assertiva não necessita de comprovação, pois seguidamente uma triste realidade é exposta, sem que os desastres tenham até hoje, principalmente aqui, originado algum tipo de resposta das autoridades responsáveis. O incêndio da semana passada, que destruiu parte expressiva do acervo depositado na Cinemateca Brasileira, não foi o primeiro. Antes, entre os filmes perdidos, estava o documentário Torres, realizado, por José Picoral, em 1927. Este documentário foi visto por Paulo Emílio Salles Gomes, então curador da Cinemateca nas décadas de 50 e 60 do século passado, que constatou sua importância não apenas pelo registro do cotidiano vivido por veranistas, mas também por ser aquele filme um pioneiro. É que Picoral registrou pela primeira vez o trabalho de pescadores em alto mar. As enciclopédias e historiadores de cinema registram que o pioneiro em tal setor foi o britânico John Grierson, que realizou Drifters, filme do qual a Cinemateca Brasileira possui uma cópia, em 1929, dois anos após o trabalho de Picoral. A correção através de uma prova não pode ser feita, pois a cópia levada para São Paulo foi destruída num dos incêndios. Picoral trabalhou na embaixada brasileira em Berlim antes da Segunda Guerra Mundial e para lá levou o negativo de seu filme, perdido depois durante um bombardeio aliado que atingiu o arquivo onde estava depositado.
O cinema é aquela entre as artes que mais cuidados exige para que seu patrimônio seja preservado. Tal assertiva não necessita de comprovação, pois seguidamente uma triste realidade é exposta, sem que os desastres tenham até hoje, principalmente aqui, originado algum tipo de resposta das autoridades responsáveis. O incêndio da semana passada, que destruiu parte expressiva do acervo depositado na Cinemateca Brasileira, não foi o primeiro. Antes, entre os filmes perdidos, estava o documentário Torres, realizado, por José Picoral, em 1927. Este documentário foi visto por Paulo Emílio Salles Gomes, então curador da Cinemateca nas décadas de 50 e 60 do século passado, que constatou sua importância não apenas pelo registro do cotidiano vivido por veranistas, mas também por ser aquele filme um pioneiro. É que Picoral registrou pela primeira vez o trabalho de pescadores em alto mar. As enciclopédias e historiadores de cinema registram que o pioneiro em tal setor foi o britânico John Grierson, que realizou Drifters, filme do qual a Cinemateca Brasileira possui uma cópia, em 1929, dois anos após o trabalho de Picoral. A correção através de uma prova não pode ser feita, pois a cópia levada para São Paulo foi destruída num dos incêndios. Picoral trabalhou na embaixada brasileira em Berlim antes da Segunda Guerra Mundial e para lá levou o negativo de seu filme, perdido depois durante um bombardeio aliado que atingiu o arquivo onde estava depositado.
Também na Cinemateca Brasileira está depositado o negativo de Vento Norte, realizado em 1951, por Salomão Scliar. Tal filme, que mesclava ficção com documentário, pois também reconstituía o trabalho de pescadores, voltava ao cenário do trabalho de Picoral. Entre seus produtores, estava Jenor Jarros, fundador e diretor do Jornal do Comércio. Cópias do filme de Scliar circulam e são exibidos em salas culturais e também foi projetado no Festival de Gramado, em 1988. O incêndio num dos galpões da Cinemateca, que destruiu muitos documentos preciosos, cines-jornais de diversas épocas e cópias de filmes da distribuidora Pandora, provavelmente não atingiu o negativo de Vento Norte lá depositado. Em caso contrário dois filmes importantes produzidos no Rio Grande do Sul teriam sido vítimas de deficiências de seu aparato de proteção e da falta de comprometimento daqueles que não têm ideia da importância do cinema. No mês de novembro de 1974, o Correio da Unesco publicou uma edição dedicada ao problema da conservação de filmes, no qual destacava o seguinte: "Em todas as artes existem obras antigas e antiquíssimas, das quais só ficaram as lembranças. Para a música anterior à Idade Média e à notação musical, para a dança, esse desaparecimento era de qualquer modo fatal. Mas para o cinema, a derradeira arte a surgir e aquela cuja conservação é relativamente fácil, a mortandade não precisou de mais que alguns decênios."
Transformar a cultura em algo dependente de interesses ligados ao turismo é certamente uma forma de expressar desprezo por tal atividade. Mas é importante salientar que as salas dedicadas ao cinema do passado em Paris e as exibições de clássicos no BFI de Londres, para citar apenas dois exemplos, exercem papel importante para atrair aqueles turistas também interessados em cultura. Mas para isso é necessário que os museus do cinema não sejam fechados e as condições de preservação mereçam atenção. Mesmo nas piores condições, como na Segunda Guerra Mundial, a Inglaterra se preocupou em fornecer a Laurence Olivier as condições para que fosse realizada uma versão cinematográfica de Henrique V. Nos Estados Unidos o exército americano convocou John Ford, Frank Capra, George Stevens, Wiliam Wyler e John Huston para que realizassem documentários essenciais para que a causa aliada fosse compreendida. E até o Brasil em seu passado mostrou interesse pelo cinema, ao encarregar o major Luiz Thomas Reis, um de nossos primeiros documentaristas, para registrar a trajetória do então tenente-coronel Cândido Rondon. São exemplos que deveriam servir para chamar a atenção dos que pensam ser o cinema apenas uma diversão. Se mantê-lo vivo é fundamental, preservar seus registros amplia sua importância como insubstituível registro da história.
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