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Cinema

- Publicada em 25 de Junho de 2021 às 03:00

A viagem

Hélio Nascimento
A primeira e sempre indispensável indicação é fielmente seguida pelo diretor Lírio Ferreira em Acqua movie, aquela que aponta para a construção de personagens, cuja trajetória revela para eles e os espectadores sinais antes ocultos, dele próprios e do mundo no qual vivem. A lição é fielmente seguida e por vezes, sobretudo na relação entre mãe e filho ostenta momento apreciáveis. Mas tal mérito, inegável em um filme narrado com a necessária competência, tem em diversas passagens sua importância ameaçada por aquela tendência de se deixar abater pelo discurso e por uma narrativa oral que substitui a imagem. São aqueles momentos nos quais o narrador negligencia a força de acontecimentos reveladores utilizando apenas a palavra. É verdade que em tais trechos o cineasta não adota o tom e a veemência do discurso, mas seu filme teria mais impacto se não adotasse tal método. Um exemplo são os diálogos entre a protagonista e um amigo, prejudicados também por certa ingenuidade e pela superficialidade com que se aproxima de um dos mais complexos dilemas enfrentados pela civilização. O tema do petróleo, por exemplo, citado durante uma conversa, é abordado de forma a criar um mundo imaginário que seria melhor sem ele. Mas o petróleo não é apenas a força que move automóveis ao exercer papel decisivo na poluição que atormenta as cidades. Sem ele, não haveria o mundo moderno e quase todas as suas características e facilidades para os seres humanos. É compreensível a crítica, mas o processo criticado é abordado de forma simplista e mesmo ingênua, ao deixar de expor as contradições criadas pela engrenagem construtora da moderna civilização.
A primeira e sempre indispensável indicação é fielmente seguida pelo diretor Lírio Ferreira em Acqua movie, aquela que aponta para a construção de personagens, cuja trajetória revela para eles e os espectadores sinais antes ocultos, dele próprios e do mundo no qual vivem. A lição é fielmente seguida e por vezes, sobretudo na relação entre mãe e filho ostenta momento apreciáveis. Mas tal mérito, inegável em um filme narrado com a necessária competência, tem em diversas passagens sua importância ameaçada por aquela tendência de se deixar abater pelo discurso e por uma narrativa oral que substitui a imagem. São aqueles momentos nos quais o narrador negligencia a força de acontecimentos reveladores utilizando apenas a palavra. É verdade que em tais trechos o cineasta não adota o tom e a veemência do discurso, mas seu filme teria mais impacto se não adotasse tal método. Um exemplo são os diálogos entre a protagonista e um amigo, prejudicados também por certa ingenuidade e pela superficialidade com que se aproxima de um dos mais complexos dilemas enfrentados pela civilização. O tema do petróleo, por exemplo, citado durante uma conversa, é abordado de forma a criar um mundo imaginário que seria melhor sem ele. Mas o petróleo não é apenas a força que move automóveis ao exercer papel decisivo na poluição que atormenta as cidades. Sem ele, não haveria o mundo moderno e quase todas as suas características e facilidades para os seres humanos. É compreensível a crítica, mas o processo criticado é abordado de forma simplista e mesmo ingênua, ao deixar de expor as contradições criadas pela engrenagem construtora da moderna civilização.
Na sua mescla de drama familiar e documento social, o filme de Ferreira não é para ser negligenciado. É, no mínimo, um esforço a ser conhecido. A sua já mencionada primeira virtude o coloca em posição de destaque, mesmo que por vezes a caricatura predomine, como naquela personagem da servidora da família do jornalista morto e na figura do prefeito da pequena cidade substituta daquela agora morta no fundo das águas de um lago artificial. No segundo caso, no entanto, a caricatura não deixa de ser premonitória e antecipa - o filme foi realizado em 2019 - de certa forma o que hoje contemplamos. Outro mérito é a utilização de objetos reveladores. O caso do canivete é perfeito como expressão da agressividade transformada em elemento utilizado pelo poder para transformar aqueles por ele seduzidos em instrumentos de uma violência institucionalizada. Mesmo que o plano que revela a recusa por parte do filho de tal método seja previsível a visão do cineasta permite uma leitura que não admite outra interpretação e realça como é importante a utilização da imagem como o mais precioso dos recursos. Outro momento a ser destacado é aquele no qual o que resta de um rio agredido é exposto em um vigoroso movimento de câmara, o registro de um grande desastre.
No penoso relacionamento entre mãe e filho o filme se aproxima de outro dilema. Pouco se sabe do casamento praticamente desfeito, o filme se dedicando bem mais ao sofrimento do filho. As chamadas telefônicas -outro elemento que a direção utiliza de forma correta- fornecem indícios que não são inteiramente reveladores. Mas esta ligação entre família desfeita e um mundo em crise de valores é um tema que o filme não aprofunda e até permite algumas contradições não suficientemente expostas. O interesse pelas populações indígenas é perfeitamente justificável, mas ao colocá-lo como contraponto indesejável o cineasta, também o autor do roteiro, termina criando mais um conflito que o filme não explora com a profundidade exigida. E a frase final, carregada de empatia, é bastante superficial e até poderia ser suprimida, pois bastaria a imagem da estrada para sintetizar a busca de um novo caminho, agora enriquecida por experiências vividas pelos dois personagens principais. E em alguns trechos, como na cura do menino alvejado, uma certa confusão poderia ser evitada, até porque mãe e filho já haviam sofrido as dores causadas pelo autoritarismo e ausência de humanismo.
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