Corrigir texto

Se você encontrou algum erro nesta notícia, por favor preencha o formulário abaixo e clique em enviar. Este formulário destina-se somente à comunicação de erros.

Cinema

- Publicada em 01 de Abril de 2021 às 03:00

Dança interrompida

Hélio Nascimento
Assim como acontece em A comilança, de Marco Ferreri, realizado em 1973, também em Druk: mais uma rodada, o novo filme de Thomas Vinterberg, quatro amigos decidem expressar seu descontentamento com a vida participando de um ritual que certamente não é apropriado para interromper a angústia e corrigir deficiências no comportamento. No primeiro caso o objetivo é a morte alcançada por um ininterrupto banquete. Agora o desespero se mescla a uma tentativa de corrigir deficiências e assim atingir a harmonia com o mundo e a plena afirmação profissional. Trata-se de uma variação por vezes invadida por certa ironia e também pouco profunda do tema do conflito entre o ser humano e as grades que o aprisionam e determinam seu comportamento. Não é por acaso que o cineasta abre a narrativa, antes dos créditos principais, com uma festa de jovens, no qual a bebida representa ao mesmo tempo um desafio e um estímulo. A superficialidade, que mesmo evidente não chega a transformar o filme em algo menor, pode ser facilmente constatada na maneira com que o cineasta, também um dos autores do roteiro, aborda a crise enfrentada pelo mais destacado personagem do quarteto, vivendo os últimos momentos de um casamento e enfrentando dificuldades no relacionamento com seus alunos. No caso da crise familiar, certamente fica claro que Vinterberg não é um Bergman, que foi o cineasta que melhor soube ver num indivíduo e seu relacionamento com o real os sinais que se espalham e de certa forma unificam gestos de desespero e revolta.
Assim como acontece em A comilança, de Marco Ferreri, realizado em 1973, também em Druk: mais uma rodada, o novo filme de Thomas Vinterberg, quatro amigos decidem expressar seu descontentamento com a vida participando de um ritual que certamente não é apropriado para interromper a angústia e corrigir deficiências no comportamento. No primeiro caso o objetivo é a morte alcançada por um ininterrupto banquete. Agora o desespero se mescla a uma tentativa de corrigir deficiências e assim atingir a harmonia com o mundo e a plena afirmação profissional. Trata-se de uma variação por vezes invadida por certa ironia e também pouco profunda do tema do conflito entre o ser humano e as grades que o aprisionam e determinam seu comportamento. Não é por acaso que o cineasta abre a narrativa, antes dos créditos principais, com uma festa de jovens, no qual a bebida representa ao mesmo tempo um desafio e um estímulo. A superficialidade, que mesmo evidente não chega a transformar o filme em algo menor, pode ser facilmente constatada na maneira com que o cineasta, também um dos autores do roteiro, aborda a crise enfrentada pelo mais destacado personagem do quarteto, vivendo os últimos momentos de um casamento e enfrentando dificuldades no relacionamento com seus alunos. No caso da crise familiar, certamente fica claro que Vinterberg não é um Bergman, que foi o cineasta que melhor soube ver num indivíduo e seu relacionamento com o real os sinais que se espalham e de certa forma unificam gestos de desespero e revolta.
Além do citado filme de Ferreri, outra referência que certamente influenciou o diretor dinamarquês foi Farrapo humano, que Billy Wilder realizou em 1945 e no qual um escritor que perde a inspiração mergulha numa jornada sem volta em busca da salvação. Essencialmente, trata-se de uma referência ao brinde, muitas vezes encenado em óperas, uma delas, La traviata, de Verdi, escrita sobre um libreto de Francesco Maria Piave, citada por Wilder em seu clássico, quando entrando num teatro, o personagem de Ray Milland se depara com o "brindisi" daquela obra, no qual os protagonistas exaltam "o cálice da alegria". Vinterberg não chega a fazer algo semelhante, mas há um momento que merece ser destacado. É aquele no qual o personagem principal faz com que os alunos elejam Adolf Hitler em vez de Winston Churchill, partindo de dados superficiais do comportamento pessoal. O professor chega a dizer que mais tarde irá aprofundar a questão, mas o filme fica nos devendo uma abordagem sobre tema tão importante, no qual sobressai muitas vezes a figura de verdadeiros monstros acobertados por gestos e atitudes enganosas. Um dos planos mais impressionantes da História do Cinema é aquele no qual Nosferatu, no filme que Murnau realizou em 1922, emerge do porão do navio, como a configuração do reprimido em busca da vingança, uma ameaça assustadora. No filme de Vinterberg não se trata de uma vingança, mas da expressão de almas aprisionadas, algo que a cena final torna claro.
É neste epílogo, uma dança frenética executada pelo personagem vivido por Mads Mikkelsen, que Vinterberg parece se referir à observação de Kierkegaard de que mais importante do que acompanhar um bailarino no ar é vê-lo quando toca o solo. Este complemento do esforço, que encerra o movimento que coloca o indivíduo de volta à realidade, é o complemento de uma jornada. No caso filme, nem se trata de solo fixo, mas ao interromper o salto e tornar fixa a imagem o realizador interrompe o movimento e impede que o espectador contemple o instante em que o "salto se transforme em andamento normal". Se o diretor pretendeu exercer a crítica ao personagem, o filme se conclui de forma a ressaltar a inutilidade de todo aquele ritual. E certamente os movimentos do protagonista revelam mais desespero do que alegria. E como não o vemos de volta ao solo, caminhando normalmente, a imagem que termina se impondo é a da cerimônia fúnebre, que revela a inutilidade de toda aquela revolta etílica. O plano de encerramento parece expressar as dificuldades em escapar das grades, das imposições e das fraquezas.
 
Conteúdo Publicitário
Leia também
Comentários CORRIGIR TEXTO