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Cinema

- Publicada em 13 de Setembro de 2019 às 03:00

Prisioneiros

Há os que optam pelo panfleto e o maniqueísmo. É fácil dividir a humanidade entre bons e maus, entre heróis e vilões. Fica tudo menos complicado quando os elementos de um conjunto são artificialmente separados. Tudo se apresenta de forma clara quando as causas são ignoradas e só os efeitos nos chamam a atenção. Há também os que sabem falar o que determinadas plateias querem ouvir, e os que se afastam das complexidades e dos obstáculos criados diante dos seres humanos aprisionados por correntes construídas por um processo destinado a calar vozes discordantes. As palavras de ordem, as enfadonhas repetições de slogans e a exigência de padronizações são, essencialmente, manifestações de uma mediocridade aceita por uma engrenagem que por vezes finge uma indignação que faz parte de uma coreografia encenada de forma a congelar insatisfações e aprisionar qualquer gênero de revolta. No cinema, nos últimos tempos, muitos são os filmes simplificadores e comandados por discursos que nada mais fazem do que externar revoltas que apenas buscam o aplauso e o entusiasmo dos que já foram devidamente cooptados pelos adeptos das fórmulas simplistas e as normas disciplinadoras. Os verdadeiramente interessados em cinema saberão, certamente, distinguir filmes como Aquele que deve morrer, de Jules Dassin, e O preço de uma vida, de Edward Dmytryk, das, por vezes, constrangedoras propostas de algumas obras cinematográficas recentes, portadoras de um proselitismo desprovido de lucidez e portador de elementos empobrecedores. É uma época triste, dirão alguns, mas esta época, felizmente, não está completamente dominada pelos que procuram compensar a falta de talento com a demagogia e o reducionismo.
Há os que optam pelo panfleto e o maniqueísmo. É fácil dividir a humanidade entre bons e maus, entre heróis e vilões. Fica tudo menos complicado quando os elementos de um conjunto são artificialmente separados. Tudo se apresenta de forma clara quando as causas são ignoradas e só os efeitos nos chamam a atenção. Há também os que sabem falar o que determinadas plateias querem ouvir, e os que se afastam das complexidades e dos obstáculos criados diante dos seres humanos aprisionados por correntes construídas por um processo destinado a calar vozes discordantes. As palavras de ordem, as enfadonhas repetições de slogans e a exigência de padronizações são, essencialmente, manifestações de uma mediocridade aceita por uma engrenagem que por vezes finge uma indignação que faz parte de uma coreografia encenada de forma a congelar insatisfações e aprisionar qualquer gênero de revolta. No cinema, nos últimos tempos, muitos são os filmes simplificadores e comandados por discursos que nada mais fazem do que externar revoltas que apenas buscam o aplauso e o entusiasmo dos que já foram devidamente cooptados pelos adeptos das fórmulas simplistas e as normas disciplinadoras. Os verdadeiramente interessados em cinema saberão, certamente, distinguir filmes como Aquele que deve morrer, de Jules Dassin, e O preço de uma vida, de Edward Dmytryk, das, por vezes, constrangedoras propostas de algumas obras cinematográficas recentes, portadoras de um proselitismo desprovido de lucidez e portador de elementos empobrecedores. É uma época triste, dirão alguns, mas esta época, felizmente, não está completamente dominada pelos que procuram compensar a falta de talento com a demagogia e o reducionismo.
Para quem não viu a primeira experiência do ator Gael Garcia Bernal como diretor, este Chicuarotes é uma bela surpresa. Ambientado numa localidade da região metropolitana da Cidade do México, o relato em nenhum momento se deixa dominar pelo descontrole diante das deformações e as imperfeições geradas por um ritual no qual a voz humana não é ouvida e um processo impiedoso costuma gerar manifestações marcadas pela violência libertada por uma realidade opressora e afastada de necessidades humanas básicas. A materialidade impiedosa não gera anjos, mas demônios. A cena inicial, filmada em ônibus em movimento, é um prólogo e um resumo. Começa com uma manifestação artística, expressão civilizada, e termina, depois da indiferença da plateia, com uma atitude violenta. Parece uma simplificação, mas esta impressão logo é desfeita pela trama que virá a seguir. Trabalhando sobre um roteiro escrito por Augusto Mendonza, que utilizou lembranças do que viu no local onde passou a infância, Bernal mantém o interesse da plateia, sabendo dar destaque a um cenário que tudo parece explicar, verdadeiro símbolo de um fracasso estrutural. Em tal cenário vivem criaturas nas quais o comando é exercido pela agressividade, representada pela arma que termina mudando de dono. É o momento que gera uma resposta que dará continuidade a uma trama que só aumentará de intensidade e revelará que o protagonista está definitivamente contaminado pelo irracionalismo.
Bernal e Mendonza não são, no entanto, dominados por impulsos agressivos. A lucidez permanece e até permite a recriação de uma das mais famosas cenas de Romeu e Julieta. O momento em que o personagem principal desafia uma provável presença do pai da amada não é somente uma referência. Mostra como o ser humano é prisioneiro e apenas consegue a sobrevivência em situação que contraria a sua natureza. Nos créditos finais, elegendo aquela cena como a principal de seu filme, Bernal retoma o tema, enquanto são apresentadas ao público as informações finais. Antes, na imagem que encerra a narrativa, a jovem como que hesita entre o afastamento e o retorno. É um dilema, que afasta definitivamente a obra das facilidades. Ao mesmo tempo, torna clara as dificuldades de julgamento de erros cometidos dentro de uma realidade deformadora. O filme de Bernal procura encontrar causas, ao mesmo tempo que realça a tragédia da arte e do humanismo oprimidos por estruturas imperfeitas e opressivas.
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