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Cinema

- Publicada em 01 de Novembro de 2018 às 01:00

A testemunha

O cinema proposto pela diretora Vanessa Filho, a realizadora de Meu anjo, se caracteriza, no plano formal, pelo destaque conferido ao primeiro plano. O rosto humano é o que parece interessar mais a realizadora como elemento dramático e revelador. Pelo menos nas cenas iniciais e na maior parte da narrativa, tal elemento é o mais destacado e seu emprego também serve para transformar a personagem da menina Elli numa testemunha que contempla um universo marcado pela crise e pelos toques de decadência. O filme abre com uma festa de casamento, contemplado pelo olhar da filha da noiva, cujo pai é por ela desconhecido. A cena de abertura não deixa dúvida de que espécie de mundo o filme trata. Essa espécie de alegria que procura acobertar ausência de valores e esconder frustrações e sofrimentos não oculta aspectos reveladores. O que a criança e o espectador logo a seguir descobrem expõe um vazio e uma crise exposta pela imposição de um instinto reprimido e não controlado. Habilmente, a cineasta, também a autora do roteiro, não coloca em cena as consequências do ato que transforma a cerimônia em farsa e origem de conflito e ruptura. A ação prossegue e não será a primeira vez, durante o filme, em que certos acontecimentos são omitidos e apenas as consequências expostas.
O cinema proposto pela diretora Vanessa Filho, a realizadora de Meu anjo, se caracteriza, no plano formal, pelo destaque conferido ao primeiro plano. O rosto humano é o que parece interessar mais a realizadora como elemento dramático e revelador. Pelo menos nas cenas iniciais e na maior parte da narrativa, tal elemento é o mais destacado e seu emprego também serve para transformar a personagem da menina Elli numa testemunha que contempla um universo marcado pela crise e pelos toques de decadência. O filme abre com uma festa de casamento, contemplado pelo olhar da filha da noiva, cujo pai é por ela desconhecido. A cena de abertura não deixa dúvida de que espécie de mundo o filme trata. Essa espécie de alegria que procura acobertar ausência de valores e esconder frustrações e sofrimentos não oculta aspectos reveladores. O que a criança e o espectador logo a seguir descobrem expõe um vazio e uma crise exposta pela imposição de um instinto reprimido e não controlado. Habilmente, a cineasta, também a autora do roteiro, não coloca em cena as consequências do ato que transforma a cerimônia em farsa e origem de conflito e ruptura. A ação prossegue e não será a primeira vez, durante o filme, em que certos acontecimentos são omitidos e apenas as consequências expostas.
Exibido no Festival de Cannes, em uma das mostras paralelas, Meu anjo não chega a ser uma obra relevante no atual panorama cinematográfico mas parece indicar que a cineasta, agora dando seus primeiros passos - este filme é o seu segundo longa-metragem - poderá ocupar no futuro posição destacada. O que vemos na tela é um relato que se caracteriza por expor efeitos e não causas. A personagem da mãe, vivida por Marion Cotillard, em mais um verdadeiro recital marcado por um talento superior, é obviamente uma figura criticada, mas o que temos na tela é algo que revela apenas a consequência de fatos passados. Se foi a intenção da realizadora ver na criança a imagem do passado da mãe e assim explicar o comportamento de Marlène, tal proposta não é devidamente desenvolvida. Mas é inegável que o filme se beneficia também da atuação de Ayline Aksoi-Etaix, cujo olhar a diretora sabe explorar com notável habilidade. O tema da ausência paterna então se agiganta e se expande por todas as cenas, transformando o relato num ensaio sobre uma dolorosa experiência de solidão. Quando a filha procura se aproximar do pai substituto o filme se aproxima do ponto central, embora recorra a algumas obviedades e certas simplificações.
Também merece destaque o uso do tema do abismo. Numa cena a mãe se assusta com a atitude da filha na sacada. E, na sequência final, a queda procurada como gesto destinado a solucionar o conflito ressurge de forma definitiva. Filmes assim, focalizados em personagens que andam em busca de auxílio e padecem de solidão, figuras que perambulam por um mundo desprovido de harmonia e interesse pelo verdadeiramente humano, necessitam de um olhar mais profundo e que não seja apenas orientado pela dor e o sofrimento. Falta à obra de Vanessa Filho uma visão marcada por aquele olhar crítico para os impasses e as imperfeições de um universo onde as inquietações não encontram abrigo e as perguntas não obtém respostas. O trecho de encerramento tem uma poderosa carga dramática antes de ser concluído de forma um tanto ingênua. De qualquer maneira, o epílogo tem o mérito de sintetizar e tornar bem claro o sentido de toda a obra. Mas estamos longe de alguns filmes, entre os quais alguns nos quais a realizadora se inspira, onde tal temática é desenvolvida. O tema da ausência e da solidão é exposto, porém não desenvolvido de forma a originar um filme que se destaque por contribuição enriquecedora. É fácil criticar o comportamento da personagem materna, mas certamente foi difícil para Vanessa Filho expor as causas de gestos e atitudes assim tão despropositadas. Mas o filme se beneficia, sem dúvida, pela presença de uma atriz como poucas e de uma pequena intérprete que reafirma como crianças bem orientadas são capazes de criar personagens marcantes, como alguns cineastas já demonstraram em muitos filmes.
 
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