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Imprensa

- Publicada em 15 de Janeiro de 2019 às 01:00

Liberdade de imprensa comprometida?

Jornalistas do site The Intercept foram bloqueados pelo presidente Jair Bolsonaro no Twitter

Jornalistas do site The Intercept foram bloqueados pelo presidente Jair Bolsonaro no Twitter


/REPRODUÇÃO TWITTER/JC
Recentemente o presidente da República Jair Bolsonaro fez bloqueios a jornalistas na rede social Twitter. Os alvos foram os repórteres do portal de notícias The Intercept Br, como o editor executivo Leandro Demori. O bloqueio ocorreu após Demori questionar uma notícia apontada como fake news por Bolsonaro. No perfil, constantemente utilizado pelo presidente, ele declarou, após o bloqueio, que "tem gente chorando porque vem mentir e ofender e ninguém é obrigado a conviver com isso".
Recentemente o presidente da República Jair Bolsonaro fez bloqueios a jornalistas na rede social Twitter. Os alvos foram os repórteres do portal de notícias The Intercept Br, como o editor executivo Leandro Demori. O bloqueio ocorreu após Demori questionar uma notícia apontada como fake news por Bolsonaro. No perfil, constantemente utilizado pelo presidente, ele declarou, após o bloqueio, que "tem gente chorando porque vem mentir e ofender e ninguém é obrigado a conviver com isso".
O block no Twitter é uma ferramenta utilizada por usuários quando querem impedir que outro perfil tenha acesso às suas publicações. Dessa forma, toda a vez que um perfil tentar acessar uma página que o bloqueou, verá um recado da rede social avisando que seu acesso está impedido. Caso saia de seu perfil, poderá ver as publicações livremente - mas não poderá responder ou compartilhar as informações.
O Jornal da Lei conversou com Demori a respeito da questão. Para ele, "ninguém tem que ficar fazendo gambiarra para acessar o que é dever do poder público - facilitar a transparência e o acesso à informação". Atualmente, o setor jurídico do Intercept está definindo a melhor estratégia para buscar o desbloqueio dos repórteres.
"Antes de tudo, isso mostra que eles estão incomodados com a imprensa; isso é bom", afirma Demori. De acordo com Cristina Zahar, representante da Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji), na maioria das vezes, o trabalho do jornalista incomoda, pois ele joga luz em questões que as pessoas não querem que sejam iluminadas. "As autoridades e o presidente têm que compreender esse papel", destaca. Em nota, a associação repreendeu os bloqueios feitos pelo presidente, defendendo seus pilares e princípios fundamentas como a liberdade de imprensa e o acesso à informação.
Ainda de acordo com Cristina, o modus operandi nestes casos é deslegitimar a imprensa, de forma a manipular a opinião pública. "Muitas vezes, acham que eles não entendem o trabalho. Mas eles entendem, por isso agem dessa maneira", completa. Ela defende, porém, que os jornalistas insistam em seus trabalhos: "o papel da imprensa na democracia não é um papel de oposição, mas de vigilância".
Utilizado diariamente, o perfil Jair M. Bolsonaro tornou-se uma forma de comunicação direta do presidente com a população. Foi ali, por exemplo, que Bolsonaro divulgou em primeira mão quais seriam os ministros do seu governo. À época, declarou que os nomes seriam anunciados oficialmente em suas redes e "qualquer informação além é mera especulação maldosa e sem credibilidade". Neste contexto, questiona-se o limite do uso da rede - ela é pública ou privada?
De acordo com Taís Borja Gasparian, advogada que já foi vice-presidente da comissão de liberdade de imprensa da OAB-SP, a partir da posse do presidente, ele tem obrigação de dar publicidade dos seus atos. "A publicidade e impessoalidade são regras constitucionais de administração", destaca. A divulgação dos atos sem distinção é prevista no artigo 37 da Constituição. Ainda de acordo com Taís, Bolsonaro já usa sua conta no Twitter como uma conta pública. "Seria uma conta pessoal apenas se tratasse de fotos de filhos e fotos no mar", diz.
De acordo com Bolsonaro em seu Twitter, a imprensa livre e isenta é fundamental para a democracia. Para Taís Gasparin, porém, os atos do presidente são um desrespeito aos meios de comunicação e descumprem um princípio constitucional, podendo representar um risco para a liberdade de imprensa, na medida em que se seleciona quem terá acesso à informação.
Conforme o jornal O Estado de S. Paulo, em 4 de janeiro foi divulgado um decreto presidencial que trata da Secretaria Especial de Comunicação. Nele, se transferiu a administração das "contas pessoais das mídias do presidente da República" para a secretaria. Regras ainda mais rígidas acontecem quando se cede os perfis a administração pública. O comportamento do presidente nas redes, porém, não mudou.

Nos Estados Unidos, Justiça faz Donald Trump desbloquear 41 seguidores no Twitter

Um caso parecido envolvendo a mesma rede social e tendo como protagonista o presidente norte-americano, Donald Trump, resultou em julgamento de inconstitucionalidade. Em maio de 2018, o Knight First Amendment Institute, da Universidade de Columbia, entrou com uma ação em nome de sete usuários do Twitter que foram bloqueados pelo presidente após criticá-lo em seus perfis. O instituto tem como objetivo defender a liberdade de expressão e de imprensa na era digital.
A juíza Naomi Reice Buchwald decidiu que as redes do presidente eram utilizadas como um fórum público e, desta forma, deveriam ser acessadas por toda a população. Julgando inconstitucionalidade e violação dos direitos previstos na Primeira Emenda à Constituição norte-americana, o presidente foi obrigado a desbloquear os usuários envolvidos no processo.
Muitos usuários, porém, continuam bloqueados. Após a primeira onda de desbloqueios, o Instituto Knight enviou uma carta ao Departamento de Justiça dos Estados Unidos com mais nomes que seguiam bloqueados. Ao todo, 41 contas tiveram de ser desbloqueadas por @RealDonaldTrump. É possível que outros usuários que se sentirem lesados entrem em contato com o Departamento para conseguir o mesmo feito.
 

Sátira ou fake?

Em 5 de janeiro, o presidente deu retweet na conta "Trolha de São Paulo", perfil inspirado pela Folha de S. Paulo. No tweet, lê-se "após o governo de Jair Bolsonaro anunciar possível parceira com Israel para que acabe a seca do Nordeste, oposicionistas da esquerda estão se deslocando para a região e prometem, antes do governo, acabar com a seca com suas lágrimas de lamentações".
Essa não foi a única vez que o presidente divulgou declarações de contas satíricas, já tendo endossado comentários de contas como Falha de São Paulo e Estabão - paródia do Estadão. Em descrições das contas, se justifica que #SátiraNãoéFake. Bolsonaro também já indicou páginas para serem seguidas, como Olavo de Carvalho, Nando Moura e Ódio do Bem - uma página que expõe perfis de usuários da rede.
"Isso é mais uma parte da estratégia que foi usada na campanha, de confusão e desinformação para a opinião pública", observa Leandro Demori. Ele aponta que, em tempos de caos da informação, sobretudo em redes sociais rápidas como o Twitter, contas que mudam apenas algumas letras de nomes consagrados de veículos tradicionais espalham informação sobre o disfarce de sátira.
Não são só veículos que se tornaram sátiras. Jornalistas como Mônica Bergamo, da Folha, e Amanda Audi, do Intercept (uma das bloqueadas por Bolsonaro) têm suas imagens difundidas em contas falsas. Para Cristina Zahar, a melhor forma de lidar com estas situações é buscar as vias legais.