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Tributos

- Publicada em 29 de Setembro de 2020 às 15:40

Imposto sobre economia digital está na mira global

Debates buscam trazer segurança à aplicação de um tipo de tributo em escala mundial

Debates buscam trazer segurança à aplicação de um tipo de tributo em escala mundial


FREEPIK/DIVULGAÇÃO/JC
A ofensiva do governo brasileiro sobre a chamada economia digital, na tentativa de ampliar a tributação, vem despertando a atenção. Tanto que, tanto a equipe do governo federal quanto a do legislativo vêm apresentando propostas de taxação de operações digitais. Porém, os especialistas alertam para o risco atrelado a essas mudanças e questionam se este é o momento certo para se dedicar ao assunto.
A ofensiva do governo brasileiro sobre a chamada economia digital, na tentativa de ampliar a tributação, vem despertando a atenção. Tanto que, tanto a equipe do governo federal quanto a do legislativo vêm apresentando propostas de taxação de operações digitais. Porém, os especialistas alertam para o risco atrelado a essas mudanças e questionam se este é o momento certo para se dedicar ao assunto.
Recentemente, o ministro da Economia, Paulo Guedes, anunciou que pretende cobrar tributos nas operações de pagamento no País e falou na criação de "tributos alternativos" - eufemismo que a União usa para a criação de uma nova CPMF (Contribuição Provisória sobre Movimentações Financeiras) - como solução para garantir a desoneração da folha de pagamento, a partir da arrecadação de R$ 120 bilhões por ano.
"Queremos ajudar a buscar emprego, facilitar a criação de vagas. Então, vamos fazer um programa de substituição tributária", alegou Guedes. "Temos que desonerar folha, por isso precisamos de tributos alternativos para desonerar a folha e ajudar a criar empregos e renda a mesma coisa", argumentou, ao justificar que perceberam a importância do auxílio emergencial ajudou a manter o Brasil respirando e atravessando essa onda da crise. "Temos que também fazer uma aterrissagem suave do programa de auxílio emergencial", afirmou o ministro.
A desoneração da folha de pagamentos vem sendo foco de grande debate com o constante adiamento da votação do veto à prorrogação, até 2021, para empresas de 17 setores da economia (VET 26/2020). Apesar do veto da presidência da República, a prorrogação da desoneração de folha é uma vontade antiga dos empresários. Ela estava prevista para terminar no fim deste ano e, segundo especialistas, é praticamente certa a derrota do governo em relação a esse tema.
O diretor executivo da Confirp Consultoria Contábil, Richard Domingos, explica que o governo não tem muitas alternativas e salienta que, possivelmente, será colocado como moeda de troca um novo tributo. Segundo o especialista, o imposto digital é o mais cotado para financiar o buraco da desoneração da folha.
"A situação é complicada, o governo precisa de mais arrecadação, mas sem uma reforma ampla e irrestrita não há possibilidade de o governo não tirar a desoneração sem uma contrapartida, vai ter que criar um outro tributo", analisa Domingos. Mesmo assim, antes de qualquer medida, para ele, é preciso ter claro qual o buraco do déficit fiscal deste ano e qual a proposta do imposto digital para negociar.
Além dessa disponibilidade apontada pelo governo federal em se dedicar à criação de um imposto digital no Brasil, outros três projetos de lei também trazem à tona a tributação da economia digital e já tramitam no Congresso Nacional. Porém, o advogado tributário Rafael Mallmann, sócio do escritório TozziniFreire, pontua que, talvez, não seja o melhor para esse tipo de discussão no Brasil.
A Organização para o Desenvolvimento Econômico e Cooperação (OCDE) vem debatendo e trabalhando para a criação de um imposto digital global capaz de trazer segurança à aplicação desse tipo de tributo em escala mundial, evitando a chamada "bitributação" ou tributação dobrada em dois ou mais países e evitando a penalização das empresas. Além disso, Mallmann adverte que seria o momento de se dedicar à reforma tributária nacional, cujos projetos por si só já podem resolver distorções e atualizar o modelo adotado no Brasil.

Desenho de um imposto digital global pode dar segurança a cada país

As regras fiscais em vigor estão defasadas. Elas foram concebidas para serem aplicadas a negócios em que a presença física, que normalmente constituem a base para as administrações públicas exercerem suas competências fiscais. As novas tecnologias vêm impulsionando uma adaptação. Porém, em um mundo conectado criar um imposto unilateral sobre empresas globais pode ser um tiro no pé. 
O advogado tributário Rafael Mallmann, sócio do escritório TozziniFreire, diz que não só o sistema tributário brasileiro, mas o da maioria dos países está ficando para trás em relação às mudanças. "O que é absolutamente natural. A vida corre mais rápido do que as legislações", pontua. Mesmo assim, é importante seguir, mesmo que a reboque, se adaptando às novidades. E o mundo está refletindo sobre as melhores maneiras de acompanhar a nova economia digital.
A Organização para o Desenvolvimento Econômico e Cooperação (OCDE) já demonstrou diversas vezes sua preocupação com esse assunto e vem tentando encontrar saídas para que a economia global não saia prejudicada devido a essas mudanças. No início deste ano, durante o Fórum Econômico Mundial, em Davos, o secretário-geral da OCDE, Angel Gurria, disse que esperava lançar as bases para um imposto digital internacional sobre gigantes de tecnologia ainda em 2020.
Com a pandemia do novo coronavírus, como era de se esperar, o assunto ficou em segundo plano. A França, que havia saída na dianteira e anunciado que iria implementar seu imposto sobre os serviços digitais, conhecido como "Gafa" (pelas iniciais do Google, Apple, Facebook e Amazon), ainda este ano colocou o plano em modo de espera. O país europeu suspendeu até o final do ano parcelas de seu imposto sobre a renda das grandes empresas digitais, enquanto um acordo internacional para reescrever as regras da tributação transfronteiriça é negociado.
Outros países, como o Reino Unido, estudam a adoção de tributo semelhante. O Brasil é um deles. Enquanto diversos países discutem a melhor alocação da base tributável no contexto da chamada "economia digital", parlamentares brasileiros têm proposto iniciativas unilaterais do Brasil para tributar os serviços de tecnologia. De acordo com material da TozziniFreire, pode-se estabelecer relação entre os projetos.
Em comum, eles pretendem impor algum tipo de contribuição (Cofins especial, CIDE Digital ou CSSD) nos termos do artigo 149 ou 195 da Constituição Federal, conforme o caso.
No entanto, as medidas apresentadas não demonstram alinhamento com o debate mundial sobre a melhor forma de tributar a renda gerada com a economia digital. No âmbito da OCDE (Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico), são debatidas questões tecnicamente mais específicas, mas que abrangem um debate global. "Por exemplo, a questão da defasagem do critério da 'presença física' para caracterização de um estabelecimento permanente ou, ainda, a escolha de uma base uniforme para identificar receitas originadas de uma jurisdição onde não haja presença física da empresa de tecnologia", ressalta.
PLP 218/20
  • Tributo: CSSD - Contribuição Social sobre Serviços Digitais
  • Base de cálculo: Receita bruta decorrente de exibição de publicidade, disponibilização de plataforma digital e transmissão de dados a partir do Brasil (idêntico ao PL 2358/20)
  • Alíquota: 3%
  • Contribuinte: Empresa domiciliada no Brasil ou no Exterior, “que tenha auferido receita no Brasil” e que pertença a grupo econômico que tenha auferido receita bruta global superior a R$ 4,5 bilhões.
  • Destinação: A programas de renda básica na esfera federal
  • Status: Protocolada em 18/08/2020, aguarda despacho de recebimento do presidente da Câmara dos Deputados.
PLP 131/20
  • Tributo: Alteração na Cofins
  • Base de cálculo: “Receita bruta mensal auferida no Brasil”
  • Alíquota: 10,6%
  • Contribuinte: Empresa, “qualquer que seja o local de seu estabelecimento”, que aufira receita bruta mensal global superior a U$D 20 milhões e, no Brasil, superior a R$ 6,5 milhões
  • Destinação: Pelo contexto, seguirá a destinação da própria Cofins
  • Status: Apresentada em plenário em 22/05/2020 sem movimentação desde então.
PLP 131/20
  • Tributo: CIDE Digital
  • Base de cálculo: Receita bruta decorrente de exibição de publicidade, disponibilização de plataforma digital e transmissão de dados a partir do Brasil.
  • Alíquota: Progressiva - 1% / 3% / 5%
  • Contribuinte: Empresa domiciliada no Brasil ou no exterior, que tenha auferido, no ano-calendário anterior, receita bruta global superior ao equivalente a R$ 3 bilhões, e receita bruta, no Brasil, superior a R$ 100 milhões.
  • Destinação: Pelo contexto segue a destinação das demais CIDEs
  • Status: Proposto na Mesa da Câmara em 04/05/2020, sem movimentações desde então

Propostas nacionais têm termos imprecisos e precisam ser revistas

Mallmann diz que a adoção de um imposto unilateral  é muito perigosa

Mallmann diz que a adoção de um imposto unilateral é muito perigosa


/TOZZINIFREIRE ADVOGADOS/DIVULGAÇÃO/JC
As propostas brasileiras contêm alguns termos imprecisos segundo especialistas, como o alcance do termo receita bruta aplicado inclusive para identificação da receita global do grupo econômico. "Outros pontos, como a própria jurisdição para tributar não residentes, impondo também obrigação acessória de declaração de renda global para essas empresas, são questionáveis juridicamente, bem como de difícil implementação".
Ainda que a intenção de tributar gigantes globais de tecnologia independentemente de sua presença legal no País seja boa, é preciso tomar cuidado para não penalizar as empresas de tecnologia, principalmente as menores, e não correr o risco de se tornar um país isolado ou com obrigações complexas demais, ressalta Mallmann. "Os países não podem errar a mão ou correr o risco de tributar a mesma empresa duas vezes. Por isso, a criação de um imposto digital unilateral é tão perigosa", diz o advogado.
Para ele, talvez seja melhor esperar um posicionamento da OCDE e focar nas propostas de reforma tributária. Ainda que as propostas de emenda constitucional (PEC) 45 e 110, em tramitação no Congresso Nacional, não tratem especificamente de imposto digital, todas estipulam a consolidação de um imposto único, o que já deve ampliar a base de incidência.
Por outro lado, a proposta feita pelo governo federal de criação da Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS) traz o recorte da tributação sobre plataformas digitais. Se aprovada, deverá ser feito um cadastro das plataformas digitais e cobrado o imposto diretamente. "Por isso, antes de tudo, temos que definir como será a reforma tributária interna", salienta Mallmann.
Além disso, é uma falácia pensar que todas as gigantes de tecnologia não são tributadas de nenhuma maneira. A maioria das organizações que fornecem algum tipo de conteúdo ou dado no Brasil já operam por meio de uma subsidiária nacional (recolhendo os tributos federais, além do ICMS ou ISS, conforme o caso). "Nos pagamentos realizados via cartão de crédito ao Exterior, o IOF incidente é de 6,38%, alíquota superior a qualquer Digital Service Tax já proposto", completa o escritório TozziniFreire.